Desemprego e a desindustrialização no Brasil

783
Segundo IBGE, 25 milhões de pessoas trabalham por conta própria, reflexo da desindustrialização do país e aumento do desemprego. Foto: Willian Vieira Martins

O Jornal A Verdade entrevistou Nilton de Oliveira, operário do grande ABC Paulista, que vivenciou todo esse processo de desindustrialização e precarização do trabalho. Nilton trabalhou como metalúrgico, sendo ferramenteiro na Ford 30 anos atrás, e é autônomo desde então.

Reinilson Câmara


SÃO PAULO – Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontaram que nesse 1º trimestre de 2022, 12 milhões de pessoas estão desempregadas, além de mais de 5 milhões de pessoas consideradas desalentadas, isto é, desistiram de procurar emprego. Das que estão ocupadas, 38 milhões são trabalhadores informais e 25 milhões trabalham por conta própria.

Enquanto nos últimos dois anos quase 600 mil empresas fecharam as portas, dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), cresce o número de pessoas no Uber, Ifood, e outras tantas pessoas abrem diariamente uma MEI (micro empreendedor individual) se transformando em prestadores de serviço, perdendo seus direitos trabalhistas. 

O conjunto de reformas liberais como a reforma trabalhista, reforma da previdência, lei do teto de gastos e a reforma administrativa, precarizam cada vez mais o trabalho, acarretando em uma redução da renda familiar e, consequentemente, uma redução na demanda. Desta forma, os capitalistas migram seus investimentos para o mercado financeiro, para especulação financeira e continuam lucrando sem produzir nada. 

Vale destacar que a desindustrialização do Brasil é consequência de uma escolha política do Governo Bolsonaro. A participação da indústria no PIB brasileiro hoje é de 11,30%, o menor patamar desde 1947. Os cortes em investimento na ciência e tecnologia também nunca foram tão baixos, submetendo o país ainda mais a dominação das grandes potências imperialistas.

O jornal A Verdade falou com Nilton de Oliveira, operário do grande ABC, que vivenciou todo esse processo de desindustrialização e precarização do trabalho. Nilton trabalhou como metalúrgico, sendo ferramenteiro na Ford 30 anos atrás, e é autônomo desde então.

Nilton trabalhou como metalúrgico em várias indústrias e hoje é autônomo. Foto: Jornal A Verdade

Jornal A Verdade: Como era o seu trabalho a 30 anos atrás? 

Nilton: O trabalho era bom. Nos anos 1980/90 tinham muito mais indústrias e fábricas abertas. Falando como ferramenteiro, a mobilidade dentro do setor metalúrgico era boa. Era possível sair de uma empresa e entrar em outra rapidamente. As grandes montadoras tinham milhares de pessoas trabalhando e tínhamos bons direitos trabalhistas em relação a hoje. A movimentação sindical era muito mais forte e quando o sindicato vinha e decidia a paralisação, todos paravam. As condições de trabalho eram piores, principalmente em relação aos equipamentos de proteção.

Jornal A Verdade: Como foi seu processo de saída da Ford?

Nilton: Minha saída se deu por problemas familiares. Naquele período eu estava me separando de minha antiga esposa. Na época não existia celular, então era comum que esposas e parentes ligassem no telefone da sessão de trabalho para alguma emergência. O problema foi que algumas vezes essas ligações não eram para emergência e foi esse o caso. Minha ex esposa começou a ligar na sessão frequentemente, o que começou a incomodar os encarregados e me incomodar. Então decidi sair e ir para outra empresa. 

A falta de equipamentos de proteção na empresa (Ford) fez com que eu perdesse boa parte da audição de um dos meus ouvidos e isso impediu que eu entrasse em outras empresas do setor no exame médico.

Jornal A Verdade: Como é o seu trabalho atualmente de autônomo?  Você consegue comparar seu trabalho atual com a época da indústria?

Nilton: Depois de não conseguir retornar ao setor metalúrgico eu comecei a trabalhar com obras e reformas. Já fazia alguns bicos em casa de parentes e aprendi pintura com meu pai e alvenaria com meu sogro e outros colegas. Mas não existem direitos trabalhistas como autônomo, se eu me machucar fico sem essa renda e sem nenhuma seguridade. 

O trabalho de pedreiro é um trabalho pesado, mas me deu uma autonomia que não tinha trabalhando na indústria. Em contrapartida, não tenho direitos trabalhistas, 13°, férias e minha renda é bem menor e depende exclusivamente do meu trabalho e do combinado com o cliente.

Jornal A Verdade: Como você ver o trabalho hoje e quais são suas perspectivas para o futuro?

Nilton: Antigamente tinham milhares de pessoas na metalúrgica. Todo dia víamos uma multidão de pessoas, sempre diferentes, indo trabalhar e entrando em suas respectivas sessões. De cada 100 trabalhadores não ficaram 10. Hoje ninguém quer mais trabalhar com mão de obra, hoje tudo é computadorizado e automatizado. Vejo também o desemprego muito maior, muitos jovens hoje vivem dependentes dos pais, mães, avós e avôs aposentados, mas esses jovens não vão se aposentar depois das reformas (trabalhista e previdência), poucos trabalham com carteira (assinada), daqui a dez anos vamos ver como isso vai ficar. Vai ser pior pra humanidade. Está na cara que vai piorar, a não ser que inventemos uma outra saída, vai ser um futuro muito arriscado.

Relatos como esse do Nilton podem ser encontrados em cada esquina das grandes cidades do país. Demostrando que para os trabalhadores está cada vez mais claro o projeto de retirada de direitos e que a única alternativa é a organização popular para mudar essa realidade.