Em dezembro de 2022, o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) organizou a já tradicional campanha Natal Sem Fome, denunciando a propaganda consumista, que ignora a dura realidade vivida pela maioria do povo brasileiro, que vive sob insegurança alimentar. Devido à manifestação realizada pelo MLB em Fortaleza (CE), Catarina Matos, do Movimento de Mulheres Olga Benario, e Serley Leal, da Unidade Popular (UP), estão sendo perseguidos injustamente por terem participado e apoiado a luta das famílias pobres do MLB. As ameaças ferem o direito constitucional de Catarina e Serley de participarem de manifestações políticas e mostra que a criminalização das lutas sociais é mais um traço do fascismo e dos ricos contra os que lutam por justiça social.
Redação CE
A Verdade – Quais os motivos da perseguição política do qual estão sendo vítimas?
Catarina – Quem nos ataca se utiliza de discursos levianos, dos mais baixos. Falam todo tipo de mentiras para reduzir as denúncias que fazemos contra a situação de fome e a pobreza que o nosso povo está sofrendo, que é de abandono, fome, desemprego e miséria de milhões de irmãos brasileiros. Alegam que não somos “necessitados” e ignoram que vivemos diante de uma grave crise econômica e social, em que somente os ricos podem usufruir das riquezas produzidas pela classe trabalhadora, enquanto o povo pobre não tem o direito sequer de comer ou ter uma vida digna. Mas nós sabemos muito bem que vergonhoso é não lutar e ter ilusões de classe.
Então ter uma casa onde morar, um emprego e salário no final do mês faz um trabalhador indigno de lutar? Qualquer um que olhe com atenção para as nossas vidas percebe que vivemos uma militância genuína e nos dedicamos a ela porque acreditamos na transformação dessa sociedade injusta e desigual, mas ela só se dará com a união e a organização da classe trabalhadora, que é a nossa classe.
A repressão de lideranças sociais no Brasil aumentou nos últimos anos. Como explicar essa situação?
O avanço da extrema-direita trouxe consigo essa situação, pois uma de suas táticas ideológicas é a desmoralização da luta popular organizada. Eles querem deixar a classe trabalhadora descrente do poder que tem para submetê-la ainda mais à exploração e à opressão. O desgoverno fascista de Bolsonaro ampliou a perseguição aos lutadores e lideranças sociais. Ainda no processo de campanha eleitoral, em 2018, Jair Bolsonaro discursava sem nenhum pudor que ia acabar com a esquerda, caçar comunistas, e não podemos esquecer que, naquele ano, Marielle Franco e seu motorista Anderson foram covardemente assassinados. Então a escalada de ódio e perseguição só aumentou.
Que medidas estão sendo tomadas para garantir os direitos constitucionais dos que lutam pelos direitos e contra as mazelas do capitalismo?
Serley – A primeira medida é a ampliação das lutas e da organização dos movimentos sociais e populares. Quanto mais fortes, maiores, mais combativos e organizados forem os movimentos sociais, os sindicatos, as entidades estudantis, as organizações femininas, mais proteção e mais segurança serão garantidos para os lutadores sociais. Quanto mais enraizados forem esses movimentos em nossa classe, mais segurança será garantida àqueles que dirigem e lideram essas lutas.
A segunda medida é realizar uma expressiva luta contra o fascismo, mobilizar amplamente os setores da sociedade, das organizações políticas e parte do poder do Estado para defender as conquistas democráticas que nós conseguimos nos últimos 40 anos.
E, em terceiro lugar, sensibilizar os organismos de proteção, a Defensoria Pública, as comissões de proteção aos direitos humanos, nas assembleias e câmaras de vereadores, assim como a da Ordem dos Advogados do Brasil. Fortalecer os Comitês de Memória, Verdade e Justiça para sempre nos lembrarmos daquelas lideranças populares que foram assassinadas pelo fascismo da ditadura de 1964 no Brasil.
Setores da extrema-direita estão insistindo na realização da CPI do MST, que afetará todos os movimentos sociais no Brasil. Como enfrentar essa possibilidade de criminalização da luta?
Esta é mais uma medida da extrema-direita para tentar criminalizar os movimentos que lutam por um Brasil melhor para o povo. Essa CPI tem um caráter puramente propagandista de perseguição e visa intimidar a mobilização popular contra os governos e os patrões que atacam os nossos direitos fundamentais. Essa CPI está sendo proposta por deputados corruptos, ligados ao agronegócio e às milícias, para desviar as investigações dos criminosos atos fascistas e golpistas de 08 de janeiro e das denúncias contra Bolsonaro e seus milicianos, que surgem a cada semana. Eles estão cada vez mais perto da prisão e tentam se esconder por trás dessa CPI. Ela é, portanto, uma espécie de contraofensiva.
É uma tentativa de barrar qualquer possiblidade de ação do MST e de todos os movimentos na cidade e no campo, com o objetivo de impedir que se lute contra a exploração. Portanto, é preciso denunciar essa medida da extrema-direita, essa tentativa de criminalizar as lutas e os lutadores.
Precisamos que os parlamentares democráticos encarem essa luta antifascista de forma mais firme e intensiva nos espaços institucionais. Porém, sabemos que somente com grandes e combativas mobilizações de rua podemos garantir nossos direitos.
Lutar é crime?
Catarina – Lutar não é crime! Crime é usar o aparelho do Estado para manter o povo sob a sua rédea. Lutar é crime para os governos geridos pela burguesia, que sabe que o povo organizado pode salvar a si mesmo da exploração à qual ela nos submete. Para nós, lutar nunca será crime, pois essa é a única “arma” que temos enquanto classe para nos libertarmos da desumanização, da barbárie que esse sistema capitalista podre nos impõe.
Qual mensagem fica desse processo?
Que precisamos continuar e que a luta nunca pode estar apartada da teoria revolucionária. Lidar com os ataques misóginos e fascistas pode ser muito difícil se não tivermos compreensão do porquê lutamos e para onde queremos ir. Além disso, é fundamental estarmos de fato organizados. É na organização que nos fortalecemos e aprendemos a encarar os enfrentamentos de forma mais acertada, segura e consequente. As palavras de ordem “Só a luta muda a vida” e “Só o povo salva o povo” precisam ecoar cada dia mais fortes e vibrantes em nossos corações e mentes para que tenhamos força e continuar até a vitória.