Em 2022, foram 47 assassinatos, 206 ameaças de morte e 123 tentativas de assassinato.
Claudiane Lopes | Redação
BRASIL – Os conflitos de terra no território brasileiro são marcados por sangue, saques, grilagens, estupros, degradação ambiental, injustiça e impunidade durante vários séculos. Os assassinatos de Chico Mendes, Doroty Stang, do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, os massacres de Eldorado dos Carajás, Corumbiara, entre outros, demonstram que a luta dos povos originários, comunidades tradicionais, pequenos agricultores, além da defesa da Amazônia, é fruto de uma intensa luta de classes no país.
É o que demonstra o relatório sobre violência no campo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), de 2022, em que foram registradas 2.018 ocorrências de conflitos no campo no Brasil, envolvendo 909.450 pessoas e 80.165.751 hectares em disputa. Na Amazônia Legal, a CPT registrou 1.107 ocorrências, representando 54,86% de todos os conflitos registrados no país. O documento ainda ressalta que aconteceram 47 assassinatos (206 ameaças de morte e 123 tentativas de assassinato), um crescimento de 30,55% em relação a 2021 (36). Dos 47 assassinatos, seis eram mulheres, uma criança de nove anos, e seis indígenas em luta contra o agronegócio e contra os órgãos policiais e judiciários.
Somente entre 2019 e 2022 – os quatro anos de Governo Bolsonaro – foram registradas 1.185 invasões; 37% dessas ocorrências se deram em terras indígenas. A grilagem teve um crescimento relevante de 50,30% de todas as ocorrências e a pistolagem teve 505 ocorrências, o que representa 36,62% das ocorrências dos últimos dez anos. Houve também um aumento exponencial de violências por agrotóxicos. No ano passado, o número subiu para 193 casos, o que representa 6.831 famílias contaminadas. Esses números demonstram que o agronegócio, com o uso abusivo de agrotóxico, está causando uma epidemia de câncer, Alzheimer e doenças respiratórias.
Mas a sanha por mais lucros não acaba por aqui. Ainda foram registrados 207 casos de trabalho análogo à escravidão no meio rural, com 2.218 pessoas resgatadas, o maior número dos últimos dez anos. “A gente foi em busca de um sonho, de conquistar nosso próprio salário e ajudar no sustento da família, mas, quando chegou lá, era um pesadelo”, relatou um trabalhador que foi resgatado de uma vinícola em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul. Ele faz parte do grupo de 207 homens que saíram da Bahia para colher uvas, com a promessa de receber alojamento, comida e até R$ 4 mil de salário, mas acabou em situação análoga à escravidão. A promessa foi feita pela empresa Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde LTDA, que prestava serviços para as vinícolas Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton.
O levantamento revela que o Estado de Minas Gerais concentrou o maior número desse tipo de violência (62 casos, com 984 pessoas resgatadas), seguido por Goiás (17 casos, com 258 pessoas resgatadas); Piauí (23 casos, com 180 pessoas resgatadas); Rio Grande do Sul (10 casos, com 148 pessoas resgatadas); Mato Grosso do Sul (10 casos, com 116 pessoas resgatadas) e São Paulo (10 casos, com 87 pessoas resgatadas). Esses números se referem exclusivamente às pessoas resgatadas no meio rural, que representam 88% do total de casos.
Mas, embora essa seja a realidade do campo em nosso país, os nobres deputados federais que representam o agronegócio não querem investigar nem pôr fim a esses assassinatos e à injusta estrutura agrária. Recentemente, fizeram carga para instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar não os autores de tantas violências, mas as vítimas, os camponeses pobres, em particular, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, o MST.
Na verdade, os conflitos de terra, os assassinatos e o aumento da exploração continuarão enquanto existir uma estrutura fundiária baseada na grande propriedade rural, ou seja, com a reprodução das relações capitalistas no campo. Este é o principal fator para o aumento da violência e da exploração da classe trabalhadora rural, bem como para a tentativa de extermínio da população indígena e quilombola no Brasil.
Com efeito, a concentração de terras que teve início ainda no período colonial, com a atribuição de extensos lotes a poucas pessoas, ainda continua sendo atual, pois 45% da área rural está concentrada em menos de 1% das propriedades.
Não dá mais para viver com uma realidade de assassinatos, extermínios, massacres e outras graves violações de direitos humanos no campo. A luta por uma reforma agrária profunda em nosso país deve estar em nossos horizontes na luta pelo socialismo.
Matéria publicada na edição nº272 do Jornal A Verdade.