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sábado, 27 de abril de 2024

O fracasso da política imperialista de “guerra às drogas”

“A droga chega de avião ou pelo porto e cais, não conheço pobre dono de aeroporto e mais, fico triste de saber e ver, que quem morre no dia a dia é igual a eu e você…”  (Racionais MC’s. Periferia é periferia)

Leonardo Péricles | Presidente da UP


Além das ações espetaculares que se tornaram filmes e séries de sucesso, a denominada “Guerra às Drogas”, criada e impulsionada pelos Estados Unidos há mais de quatro décadas, não acabou nem diminuiu o tráfico de drogas no mundo.  Pelo contrário. Após bilhões de dólares gastos, os traficantes aumentaram seu poder com a formação de poderosos cartéis e o consumo de drogas disparou. No Brasil, a única vítima dessa política é o povo das periferias das grandes cidades, em particular, os pretos e os pobres, que sofrem na pele a repressão, o encarceramento em massa e as “balas perdidas” da militarização do Estado. Apenas nos últimos dois anos, mais de 12 mil pessoas foram mortas pelas polícias nos bairros pobres e favelas, resultando na absurda média de 18 civis assassinados por dia.

Encarceramento em massa e os tipos de crimes

Após a implantação da Lei 11.343, em 2006, conhecida como Lei de Drogas, e o aumento da pena mínima por tráfico de 5 a 15 anos, o país saltou de 308.304 presos, em 2004, para 755.274, em 2019, um aumento percentual de mais de 140% (dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública). Mais alarmante ainda é que 40% desta população prisional é de presos provisórios, isto é, não foram julgados pela Justiça, mas estão presos porque a Lei, na prática, é uma para o rico e outra para o pobre. 

É importante ressaltar quais são os crimes cometidos pela maior parte das pessoas que estão presas: crimes de fundo patrimonial (furto, roubo sem morte, estelionato) ou econômico (como o tráfico de drogas, que percentualmente é o que mais encarcera no Brasil). Ora, o tráfico de drogas nada mais é do que comércio de mercadorias proibidas, que, quando envolve uma pessoa da classe rica, a ela é permitido pagar fiança e ficar em liberdade; sendo pobre, vai direto para o presídio.  

É verdade que não podemos esperar nenhuma bondade de um sistema que nasceu a partir da escravidão negra e indígena e que é racista e violento por essência. No entanto, não devemos nos calar diante dessas arbitrariedades contra a população da periferia. Temos que denunciar a farsa da política de “Guerra às Drogas” e defender que o sistema prisional, em lugar de impor castigos e torturas, transforme-se numa instituição de políticas concretas de reabilitação e ressocialização. 

Qual o alvo da “Guerra às Drogas”?

Na realidade, a política de “Guerra às Drogas”, de um lado, mata e prende bastante gente humilde, de outro, provoca o aumento do tráfico e do consumo de drogas. Logo, o alvo desta guerra não é eliminar o tráfico ou reduzir o uso de drogas, mas reprimir a população mais vulnerável e pobre. Com efeito, se o combate fosse realmente ao tráfico, em vez de realizar operações especiais de guerra nas favelas, o sistema financeiro seria enfrentado, pois é ele que faz a lavagem e a segurança das enormes fortunas dos cartéis do tráfico. Sem dúvida, a indústria de drogas “ilícitas” movimenta US$ 900 bilhões por ano, o que representa 1,5% do PIB mundial. No Brasil, são mais de R$ 20 bilhões por ano.

Como os cartéis de drogas mantém, guardam e movimentam essa gigantesca quantidade de dinheiro? De acordo com o médico Drauzio Varella, autor do livro Carandiru, “são os cidadãos respeitados os que comandam as instituições financeiras nas quais serão depositados os bilhões arrecadados com o tráfico. Ou você, leitor, acredita que esse volume de dinheiro vivo fica escondido, em espécie, numa casa de favela?”. (drauziovarella.uol.com.br)

Também não há portos, aeroportos e aviões na periferia e a droga não é plantada, colhida ou produzida nas favelas. Mesmo quando pequenos “laboratórios” são localizados, é preciso observar que as substâncias ali utilizadas antes foram transportadas por conceituadas empresas aéreas e marítimas. 

Portanto, uma política séria de combate ao narcotráfico tem que atacar as cadeias de suprimento da droga, bloquear onde está o dinheiro que financia esse negócio, fiscalizar e quebrar o sigilo das famílias dos ricos banqueiros, comerciantes e políticos burgueses, dos que lucram com a circulação e a venda de drogas no país. Afinal, a produção e o comércio de drogas são uma grande “indústria” do capitalismo que movimenta, de forma “licita” ou “ilícita”, bilhões de dólares.

 

As drogas e suas consequências

“… agora não oferece mais perigo, viciado doente fudido, inofensivo…” 

Capitulo 4, versículo 3 – Racionais MC’s

Embora existam pessoas que experimentam algum tipo de droga, mas esse uso ocasional não os torna dependentes crônicos, há uma grande parte de seres humanos que, ao consumirem uma droga lícita ou ilícita, não conseguem mais viver sem ela e tornam-se verdadeiros escravos dessas substâncias e dos que as vendem.  

Não basta, portanto, tomar por base uma experiência individual e esquecer o número crescente de pessoas internadas por dependência do uso de drogas e que ficam incapacitadas para a vida social. O uso de drogas (álcool, cocaína, etc.) em pessoas que têm depressão, por exemplo, agrava a doença e traz consequências que podem levar à morte. Segundo o Ministério da Saúde, existem cerca de 11 milhões de pessoas com quadro depressivo e, muitas delas, têm entre as causas o uso dessas drogas.

Mas, enquanto os setores médios e ricos têm rápido e fácil acesso às clínicas particulares de recuperação, a psiquiatras e a remédios caríssimos, a maioria dos pobres ficam sem assistência médica e sucumbe diante de crises de abstinência ou de conflitos sociais e familiares. Por isso, uma das principais bandeiras que devemos levantar é a garantia de acesso digno a clínicas de tratamento garantidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), que deve ter maior investimento e estruturação.

Além disso, as drogas são um importante instrumento de desagregação social. É bem conhecido o caso do Partido Panteras Negras nos EUA, na década de 1970. No momento em que mais crescia, o FBI e a CIA conseguiram disseminar a circulação de drogas nas regiões e bairros periféricos onde o Partido tinha força. Alguns anos depois, os traficantes infiltrados e financiados pelo FBI e pela CIA assumiram o controle nesses bairros e os Panteras Negras perderam grande parte de sua base social.

Que fazer?

A Unidade Popular (UP), como um partido da classe trabalhadora e do povo pobre, posiciona-se no sentido de não incentivar o uso recreativo de drogas, mas sim atuar com o objetivo de conscientizar sua militância e o conjunto do povo, com campanhas de prevenção sobre os efeitos e riscos que as drogas apresentam à saúde, defender práticas recreativas como esportes, clubes de leitura, cineclubes, festas, festivais, shows, teatro, música, dança, dentre outras.

Nas periferias, como sabemos, há inúmeros bares, mas há ausência de equipamentos de educação (creches, escolas, cursos profissionalizantes, universidades) de esporte e de cultura.

Nossa luta deve ser, portanto, para implementar experiências de promoção e incentivo da cultura popular e esporte em todos os lugares onde nosso partido atue, em especial nas periferias. Ao mesmo tempo, devemos defender o fim da política de criminalização aos usuários e a adoção de uma política repressiva aos bilionários que comandam o tráfico e o sistema financeiro, estes que lucram, financiam e movimentam os bilhões dos cartéis de drogas.

Matéria publicada na edição nº 282 do Jornal A Verdade

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