O movimento camponês das mulheres quebradeiras de coco babaçu, assim como todas as outras resistências populares, atua pela necessidade constante de confronto pela própria existência. O Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB) vem, desde 1991, organizando a luta dessas mulheres frente aos contínuos ataques.
Alessandra Veras | São Luís (MA)
MULHERES – No Estado do Maranhão, a Lei nº 12.037/2023, que prevê o “incentivo à produção e ao consumo de babaçu e seus derivados” e o Projeto de Lei nº 614/2023, que altera a Lei de Terras (nº 5.315/1991) impactam diretamente vários setores da sociedade. A primeira favorece a indústria, ao invés das atividades extrativistas tradicionais e ambientalmente responsáveis das quebradeiras de coco babaçu. Já a segunda, provoca profundas mudanças da atual Lei de Terras estadual, privatizando terras públicas a preços irrisórios em favor do agronegócio e da grilagem do campo, inclusive com uso da força contra comunidades tradicionais, povos originários e trabalhadoras e trabalhadores rurais.
Para as mulheres que têm a quebra do coco um modo de fazer, de criar e de viver, as leis citadas se mostram um claro ataque à sua existência. A delimitação das áreas de extração do babaçu (sob o pretexto de “impulsionar a comercialização e o consumo”), no fundo, avança sobre o direito à terra, antes já surrupiado pelo agronegócio e pelos fazendeiros.
Maria Natividade Moraes Santos, coordenadora de base do MIQCB e moradora do Quilombo São Miguel Cajari na Baixada, relata: “Por onde nós vamos, é arame no campo, cerca elétrica, queimadas e derrubadas das palmeiras, isso por causa dos fazendeiros. Hoje nós não podemos sair para juntar um coco, porque, como já aconteceu, a gente passa embaixo de arame e leva choque. Não podemos mais trabalhar e viver”.
Para garantir a sustentação do seu modo de vida, as mulheres quebradeiras têm enfrentado violências diversas, que vão para além da negação do direito ao livre acesso aos recursos naturais. Maria Raimunda Costa, da comunidade Encruza Nova de Pedro do Rosário, aponta: “A realidade vivida em nossas comunidades é de luta pela preservação dos babaçuais, onde nós tentamos deixar em pé nossas palmeiras, que são nossas mães. O capitalismo chega em nossos territórios e deixa tudo devastado. Faz plantações de capim para criação de gado e devasta as nossas florestas de babaçu, as nossas mães palmeiras, de onde tiramos o sustento para nós e para nossos filhos”.
Este exemplo evidencia como o sistema capitalista desmonta os modos de vida tradicionais das comunidades do campo. Em nível municipal, algumas comunidades conquistaram a lei do “Babaçu Livre”, que impõe importantes restrições à derrubada das palmeiras e garante às quebradeiras de coco e suas famílias o direito de livre acesso e uso comunitário dos babaçuais, mesmo os situados em propriedades privadas.
Mas isso não esgota a luta. Apenas mediante a destruição desse sistema baseado na propriedade privada dos meios de produção, somente transformando radicalmente a base econômica e mudando concepções, práticas e culturas, será possível acabar com a opressão sobre as mulheres e os povos do campo.
Matéria publicada na edição nº290 do Jornal A Verdade.