Javier Milei, atual presidente da Argentina, venceu as eleições com um discurso de que acabaria com os privilégios da “casta política”, que, segundo ele, seria a responsável pelos problemas do país. O presidente afirma que passará a “motosserra” nos gastos públicos e deixará a cargo das empresas privadas a realização de todos os serviços necessários à população.
Samara Oliveira | Buenos Aires, Argentina
INTERNACIONAL – Em dezembro do ano passado, o ministro da Economia Luis Caputo anunciou que o governo não iria mais licitar nenhuma obra pública e que cancelaria todas as licitações até então aprovadas, cuja execução ainda não havia começado. A alegação é de que não há dinheiro público para tais obras e que estas deverão ser realizadas pelo setor privado.
Desde que tomou posse, em 10 de dezembro de 2023, o fascista Milei já foi responsável pela demissão de 24.000 trabalhadores de diversas áreas, e aproximadamente mais 50.000 trabalhadores estão na iminência de serem despedidos. Isso implica em um impacto direto na vida dos trabalhadores demitidos e na prestação de serviços à população.
As pessoas não são avisadas que serão demitidas. Numa medida tomada de um dia para o outro (inclusive, um feriado), as pessoas foram demitidas e impedidas de entrar nos seus antigos locais de trabalho até mesmo para pegar seus artigos pessoais.
Estes servidores são contratados em regimes temporários. Ao todo, o Governo Federal da Argentina tem 341.477 pessoas em regime temporário, que eram renovados uma vez por ano. Em vez de realizar concursos públicos, governos anteriores optavam por contratações temporárias, o que precarizava o trabalho nos órgãos públicos, proporcionando maior liberdade para demissões e o pagamento de salários baixos. Agora, o atual governo, para piorar, firma contratos de três a seis meses.
Um exemplo das consequências dessas demissões para a população é a agência pública de notícias da Argentina, a Telam, que teve suas atividades paralisadas desde a posse do atual presidente, impactando na ausência de uma campanha de prevenção à dengue. Atualmente, o país enfrenta o pior surto de dengue da sua história, com 150.000 casos e 106 mortos.
Outra agência diretamente afetada pelas demissões foi a Administração Nacional de Assistência Social (Anses), que teve o funcionamento suspenso nas regiões das províncias (equivalente aos estados no Brasil), em razão da demissão de mais de 300 funcionários. O serviço agora está sendo completamente digitalizado. Na prática, milhares de idosos ou pessoas que não possuem acesso à internet ficaram sem acesso aos serviços de assistência social, a exemplo da concessão e pagamento das aposentadorias e do seguro desemprego, entre outras políticas públicas destinadas a pessoas em situação de vulnerabilidade social.
A busca do governo para desmantelar políticas sociais é evidente, como ilustrado pelo caso do Ministério de Capital Humano. Este órgão, responsável por desenvolver medidas de proteção e fortalecimento para a sociedade, especialmente para populações vulneráveis, como crianças, adolescentes e famílias, foi o mais afetado pelas demissões em massa. Apesar de ter o menor orçamento, registrou o maior número de demissões, com mais de 1.500 servidores dispensados.
A área de transportes também foi diretamente afetada. Na Administração de Infraestruturas Ferroviárias Sociedade de Estado (Adif), responsável pela gestão das ferrovias de todo o país, de um dia para outro, foram despedidas 150 pessoas. Segundo Natália García, uma das demitidas, foram dispensados operários de obras necessárias para a manutenção do funcionamento dos trens: “É importante entender que isso resulta em uma precarização do funcionamento dos trens, e são eles que trazem as pessoas para trabalhar todos os dias no país de forma mais barata”, explica.
Como demonstrado, todas estas demissões representam um grande prejuízo para a população carente, que necessita de serviços públicos para resolver suas necessidades mais básicas. Apesar da demagogia característica do fascismo, que propagandeia que as demissões são para acabar com privilégios, estas medidas, pelo contrário, servem para aumentar os privilégios dos grandes empresários. Se a população não conseguir acesso aos serviços públicos gratuitos, terá que se submeter a serviços particulares com altos custos financeiros, aumentando os lucros dos amigos empresários do presidente.
Se o governo desejasse acabar verdadeiramente com os privilégios, deveria socializar os monopólios e meios de produção dos setores estratégicos da economia e nacionalizar os bancos. Setores estes que concentram as famílias mais ricas e privilegiadas da sociedade. Junto com isso, a anulação dos impostos extorsivos cobrados ao povo e a implementação de imposto progressivo sobre grandes fortunas.
Matéria publicada na edição nº290 do Jornal A Verdade.