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quarta-feira, 26 de junho de 2024

Enchentes no Rio Grande do Sul causam mortes e destruição, mas poderiam ser evitadas

O povo do Rio Grande do Sul enfrenta a maior enchente das últimas décadas. A tragédia atinge 467 municípios gaúchos e de acordo com a Defesa Civil, 161 pessoas morreram, 85 estão desaparecidas e mais de 800 feridas.

Redação RS


O povo do Rio Grande do Sul enfrenta a maior enchente das últimas décadas. A tragédia atinge 467 municípios gaúchos. Porto Alegre e cidades da Região Metropolitana, como Eldorado e Canoas, estão entre as mais atingidas e continuam ainda submersas. De acordo com a Defesa Civil, 161 pessoas morreram, 85 estão desaparecidas e mais de 800 feridas, muitas em estado grave. No total, 1,5 milhão de pessoas foram afetadas diretamente pelas inundações e 581 mil estão fora de casa; muitas delas viram suas casas serem arrastadas pelas águas.

“Em novembro passado, saí com minha mãe de madrugada, carregando-a nas costas. Agora foi com minha irmã e meu cunhado. Moramos no Bairro Sarandi, um dos mais afetados, porque já foi área de plantação de arroz, depois passou por aterramentos para se transformar em área urbana, mas é uma região de expansão dos rios quando chove. Antes, era a cada dois anos, agora, foi com seis meses de diferença pra última enchente”, relata Luciano Schafer, da Coordenação do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) e um dos milhares de atingidos. Luciano e outros militantes do MLB estão abrigados no prédio da Ocupação Sepé Tiaraju, organizada pelo Movimento. “Estou esperando o momento para ver o que sobrou dos móveis, mas acredito que ropeiro, sofá e cama não temos mais”, completa.

O Aeroporto de Porto Alegre fica na região entre os bairros Sarandi e Umaitá e foi tomado pelas águas. A rodoviária estadual também está debaixo d’água, além de rodovias interditadas, dificultando ainda mais o deslocamento de pessoas e a chegada das doações. Enquanto isso, populações inteiras tiveram que ser evacuadas, como no caso do Município de Eldorado do Sul, onde mais de 40 mil tiveram que abandonar tudo que tinham para buscar abrigos e casas de familiares e amigos.

O Município de Canoas também foi muito castigado. “Minha cidade está 60% inundada, em 24 horas de chuvas. Um valão (canal) no meu bairro se rompeu em apenas duas horas e inundou todas as casas. Tive que sair às pressas, não tive tempo de levar muitas coisas, somente uma mochila com poucas roupas. Eu e minha família perdemos nossa casa, pois está totalmente debaixo d’água”, conta Bernardo Stadtlober, 23 anos, desempregado.

Já Caxias do Sul, apesar de estar situado a mais de 800 metros acima do nível do mar, não foi poupado pelos alagamentos. A população permaneceu em alerta máximo com o risco iminente de rompimento das barragens de duas represas – Samuara e Dal Bó –, o que poderia levar a um desastre ainda maior e obrigou os moradores da vizinhança a buscarem refúgio em abrigos improvisados.

Histórico de enchentes

No entanto, esta não é a primeira vez que uma tragédia dessa magnitude ocorre no extremo sul do Brasil. Antes da atual inundação, a pior enchente registrada em Porto Alegre ocorreu em 1941. A cidade recebeu 24 dias consecutivos de chuvas torrenciais, elevando os níveis dos rios Caí, Gravataí, Jacuí e Sinos, que deságuam no lago Guaíba, inundando vários bairros da Capital.

Essa calamidade era até então a pior inundação já registrada na história da cidade. O nível do lago atingiu a marca de 4,76 metros, afetando severamente toda a área central. Após a devastação causada pela inundação de 1941 na capital gaúcha, surgiu a discussão sobre a urgência de construir uma barreira para proteger a cidade contra futuras enchentes. Um pouco mais de 30 anos depois, em 1974, foi concluída a construção do Muro da Mauá, que tem a estrutura, com três metros de altura e extensão de 2,6 km, está localizado entre o cais Mauá e a Av. Mauá, no coração do Centro Histórico de Porto Alegre. Porém, até os dias de hoje, o muro não teve nenhum reparo para futuras enchentes, o que fez com que o muro não conseguisse segurar as águas do Guaíba.

Quem são os culpados?

A situação é grave, mas é, de fato, uma tragédia anunciada. Há pelo menos dez anos, um amplo estudo da Presidência da República já apontava chuvas acentuadas no Sul do Brasil em decorrência das mudanças climáticas. O projeto “Brasil 2040: cenários e alternativas de adaptação à mudança do clima”, encomendado em 2014, composto por vários relatórios, apresentava resultados dramáticos. Elevação do nível do mar, mortes por onda de calor, falta d’água no Sudeste, piora das secas no Nordeste e o aumento das chuvas no Sul. Além disso, chama atenção para a necessidade de sistemas de alerta e de planos de contingência.

Mesmo assim, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), não investiu um centavo sequer na preservação de enchentes em 2023, mesmo após a cidade sofrer com as enchentes duas vezes no segundo semestre e com um caixa de R$ 428 milhões no Departamento Municipal de Águas e Esgotos.

Outro que sabia dessa informação foi o governador Eduardo Leite (PSDB), que negligenciou todas as recomendações dos técnicos, cientistas e da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan). Em 2020, o mesmo governador e sua maioria de parlamentares na Assembleia Legislativa aprovaram a Lei 15.434, flexibilizando 500 artigos do Código Estadual de Meio Ambiente a respeito da proteção dos biomas Pampa e Mata Atlântica.

Os governos de Eduardo Leite e de Sebastião Melo são os principais culpados pela destruição que eles chamam de “desastre natural”. Eles têm reforçado diariamente seu compromisso com os grandes empresários para garantir as privatizações em prol do agronegócio, e quem paga por toda essa tragédia social é o povo gaúcho, que sofre a cada enchente, perde o pouco que tem e se vê abandonado pelo Estado.

Mas a responsabilidade não é apenas dos governos estaduais e federal, mas também do Congresso Nacional. “A maioria conservadora tem aprovado diversos projetos considerados nocivos ao meio ambiente. Nunca tivemos um Congresso tão dedicado a desmontar a legislação, afirma Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, rede de entidades que monitora a questão climática no Brasil.

É importante lembrar que as tragédias ambientais são mais uma expressão das crises do capitalismo. A burguesia, movida pela ganância e o desejo de lucro, busca produzir sempre mais, sem se importar com a emissão desenfreada de gases poluentes, usando de forma inconsequente os recursos hídricos, derrubando e queimando florestas para expandir seus latifúndios para cultivar soja ou criar gado.

Se os verdadeiros culpados por esse desastre são os irresponsáveis governantes e a classe rica que só pensa no lucro e vive destruindo a natureza, os mais afetados são os pobres, a maioria da população. Afinal, burguesia sai do estado nos seus helicópteros e jatos particulares, e, se perdem algo, sacam o dinheiro e compram tudo novo. Já o trabalhador nem sabe se terá emprego e como será seu futuro.

“O povo está indignado com os prefeitos e o governador, que demoraram a se pronunciar e a agir, além de não terem feito nada para prevenir. O MLB defende a suspenção do pagamento da dívida pública do Estado do Rio Grande do Sul e a extensão dos prazos para a contratação dos projetos do Minha Casa, Minha Vida, incluindo a requalificação do prédio da Ocupação Sepé Tiaraju, que está contemplada”, aponta Luciano Schafer.

Brigadas de solidariedade

Diante de tamanha devastação em todo o estado, milhares de pessoas se voluntariaram para ajudar em abrigos, salvamentos, distribuição de água e de comida pelas cidades. A Unidade Popular (UP) organizou as brigadas de solidariedade em atuação em mais de dez bairros de Porto Alegre, além das cidades de Canoas, Novo Hamburgo, São Leopoldo, Caxias do Sul e Passo Fundo. Atuando em abrigos, comunidades isoladas e construindo novos abrigos. A UP também enviou militantes das cidades de Rio de Janeiro, Curitiba e Belo Horizonte para ajudar no salvamento. 

Um abrigo foi montado pelo Movimento de Mulheres Olga Benario, na Zona Leste da Capital, para o acolhimento de mulheres e crianças vítimas de violência. “Como chegaram várias denúncias de ocorrência de estupros em abrigos públicos, era necessário um abrigo especial para as desabrigadas”, afirmou Nana Sanchez, coordenadora do Movimento. O Diretório Central dos Estudantes da UFRGS e o Movimento Correnteza organizaram uma cozinha solidária que entregou mais de oito mil marmitas e dois caminhões lotados de alimentos não perecíveis e água para as cidades de Canoas e São Leopoldo.

Nesse momento, em que a incompetência e a irresponsabilidade dos governantes estão escancaradas, encontramos milhares de voluntários prontos em ajudar qualquer pessoa, mostrando, na prática, a força do coletivo, da solidariedade e a necessidade de construirmos o poder popular em nosso país. Com essa tragédia, aprendemos, mais uma vez, que só povo salva o povo!

Faça uma doação para as famílias atingidas através do MLB: [email protected]

Matéria publicada na edição nº 292 do Jornal A Verdade

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