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quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Venezuela: “Se eles não produzem direito, que tomemos a produção”

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O jornal A Verdade teve a oportunidade de visitar algumas fábricas tomadas pelos trabalhadores na Venezuela. Na antiga fábrica da Brahma, localizada na cidade de Barquisimeto, no Estado de Lara, os trabalhadores tomaram a produção e a transformaram em uma fábrica chamada Proletários Unidos. Conversamos com o companheiro Hélio Lopes, trabalhador que assumiu o posto de administração no Conselho da fábrica.

Renato Campos e Denise Belo | Barquisimeto (Venezuela)


A Verdade – Como foi o processo da tomada do controle da produção na antiga fábrica da Brahma?

Hélio – Essa foi uma unidade da empresa transnacional Ambev, que produzia a cerveja Brahma na Venezuela desde 1994. Em 2013, ela cessou, de forma ilegal, a produção e demitiu de forma direta 345 trabalhadoras e trabalhadores e, de maneira indireta, mais 185 demitidos. No mesmo ano, denunciamos ao Ministério do Trabalho o caso das demissões e a empresa alegou que as vendas caíram em 0,9%, o que contestamos, pois se produzia na empresa cerveja e malta¹, cuja linha de produção se ocupava de 95%, considerando sala de máquina, cozimento, entre outros. A verdade é que nos anos de 2011 e 2012 a empresa estava desmantelando as equipes, aumentando a exploração, dificultando as condições de produção e comprando, de forma desnecessária, maquinários mais caros do interior, a fim de justificar o alto custo de produção e sua futura saída do país. Dessa forma, durante três meses, exigimos do Ministério do Trabalho o cumprimento do artigo 149 da Lei Orgânica do Trabalho da Venezuela. Esse artigo trata de que uma junta de trabalhadores pode tomar a direção da empresa em caso de incompetência da gestão patronal. A empresa relutou em ceder, alegando que não havia matéria-prima para a produção, portanto, não haveria como produzir. Mas a verdade é que havia 7.620 toneladas de cereais para a produção. A direção da empresa fugiu e, em 2016, assumimos o controle completo da produção. Desta forma, constituímos uma empresa de propriedade social, uma comuna socialista chamada José Pio Tamayo de Barquisimeto e, recentemente, denominamos a empresa de Comuna Socialista Proletários Unidos.

Como acontece a produção na fábrica dirigida pelos trabalhadores?

Exercemos um modelo de gestão em que fazemos produção e distribuição de comidas e bebidas. Produzimos isso com nosso próprio maquinário e com a classe trabalhadora, porque na classe trabalhadora temos tudo: eletricistas, pedreiros, mecânicos e é a classe que resolveu todos os problemas de instalação da planta da fábrica. Agora, produzimos alimentos para animais, principalmente para galinhas, porcos e leitões. Nós compramos matéria-prima, soja e milho na cidade de La Guaira e utilizamos na produção. No entanto, sofremos uma sabotagem porque fizemos um acordo com os produtores de cabras, galinhas e porcos aqui do Estado de Lara, onde fornecíamos alimentos para seus animais, enquanto eles forneciam 20% da carne que produziam e distribuímos esta carne para a nossa comuna, pois nossa comuna socialista José Pio Tamayo possui 16 conselhos comunais. De forma que todo o alimento que entrava através dessa negociação era vendido por um preço solidário para nossa comunidade. Quando sofremos a sabotagem, deixamos de conseguir a matéria-prima e foi no mesmo momento que começou a pandemia do coronavírus, o que dificultou bastante as coisas. Decidimos, então, comprar uma granja. Compramos nossos animais, fazemos o processo de crescimento e engorda, e também fizemos uma estufa de 7.200 pés de pimentão e vendemos ao nosso povo para conseguirmos autogerir a fábrica. Fazemos isso há seis meses, e agora estamos terminando uma outra estufa com 3.500 pés de tomate. Esta estufa já está praticamente pronta, envernizada, e vamos seguir avançando nesse processo.

Quantos trabalhadores estão na fábrica Proletários Unidos hoje? E quais são as condições de trabalho?

Hoje somos 48 trabalhadores que estamos em resistência. Trabalhamos em um turno de oito horas. No último 11 de março, cumprimos 11 anos de resistência juntamente com a Comuna, com a Federação Socialista Bolivariana do Campo e da Pesca, dentre outros companheiros e camaradas. Aqui estamos unidos, pois, nas empresas que fecham, os trabalhadores devem assumir seu controle e dirigir a produção. Nós temos uma folha de pagamento no Banco do Tesouro da Venezuela. Pagamos o trabalhador semanalmente e também cuidamos de todos os equipamentos, como uniformes, botas e demais materiais necessários para o trabalho. Com o recurso, conseguimos caminhões-pipa, em que levamos água para a comunidade. São 38.000 litros que vão a várias partes da cidade de Barquisimetro. Abastecemos restaurantes, cemitérios, aeroporto, base aérea, tudo de maneira gratuita. Para isso, a cada dois meses, utilizamos nossos 44 caminhões para abastecer as comunidades.

Como funciona a administração da fábrica?

Aqui trabalhamos por setores. Temos o pessoal da segurança, da limpeza, da elétrica, da microbiologia e uma junta diretiva administrativa de 12 pessoas, e nos regimos pela lei do sistema comunal. Assim, temos quatro unidades: administração, produção, contabilidade e formação. Aqui queremos os trabalhadores com formação política e ideológica, pois não podemos cair no que fala a direita aqui na Venezuela e os meios fascistas de informação, pois querem nos dividir e queremos nos unir.

Deixe uma mensagem para os trabalhadores do Brasil.

A mensagem que deixo daqui da Venezuela é que devemos tomar os meios de produção. Nós, a classe trabalhadora organizada. Não devemos deixar com os patrões. Se eles querem fechar as fábricas, se eles não produzem direito, que tomemos a produção! Esta fábrica é o exemplo disso. Esta fábrica anteriormente explorava os trabalhadores. Trabalhávamos em turnos ilegais de 12 horas, chegando até 24 horas, com péssimos salários e aqui existia uma ditadura, pois, se os trabalhadores reclamavam, eram demitidos. Nós derrotamos tudo isso, pois nós tomamos a produção. Agora, estamos com o controle operário.

¹ A malta é uma bebida não alcoólica tradicional na Venezuela e na Colômbia, sua base é de água, lúpulo e cevada.

Matéria publicada na edição nº 294 do jornal A Verdade

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