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segunda-feira, 4 de novembro de 2024

Em 30 anos, Plano Real aumentou dependência do país ao capital financeiro

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Comemorado pelos neoliberais ao completar 30 anos em 2024, Plano Real “enfrentou a inflação” ampliando nossa dependência e submissão ao capital financeiro. Só uma reorientação verdadeiramente popular da economia poderá enfrentar papel subalterno do Brasil no mundo

Heron Barroso | Redação


Durante a Ditadura Militar (1964-1985), a política econômica dos generais transformou o Brasil num dos países mais desiguais do mundo. A concentração de renda ampliou o abismo entre ricos e pobres, a miséria cresceu, enquanto os salários dos trabalhadores foram achatados e perderam 50% do seu poder de compra; as portas da economia brasileira foram abertas ao grande capital estrangeiro e o tão falado “milagre econômico” produziu 41 milhões de famintos.

Para impedir que o país entrasse em recessão, a ditadura contraiu dívidas no exterior e entregou o controle da economia para o famigerado Fundo Monetário Internacional (FMI). A dívida externa, que era de 3,1 bilhões de dólares, em 1964, passou para 95,8 bilhões, em 1985, um aumento de mais de 3.000%!

Os militares levaram o Brasil à falência. Anos após a redemocratização, o país ainda não tinha conseguido se recuperar e sofria com uma inflação que passava dos 1.700% ao ano. Era comum ver as pessoas correndo aos supermercados antes que os preços dos alimentos fossem reajustados, coisa que ocorria diariamente.

Para enfrentar essa situação, foram propostos vários planos econômicos, a exemplo dos planos Cruzado (1986), Bresser (1987), Verão (1989) e Collor (1990). Porém, como nenhum deles mexeu nos privilégios do capital financeiro, a situação só se agravava.

A partir dos anos 1990, com a consolidação da chamada “nova ordem mundial” e do neoliberalismo, o Brasil passa a ser plataforma para a acumulação do capital financeiro, através do endividamento público, das privatizações e da submissão à cartilha do FMI.

Dependência e subordinação

Foi nesse contexto que surgiu, em 1993-94, o Plano Real, que em julho completou 30 anos. Louvado por economistas e pelos grandes meios de comunicação da burguesia como marco da estabilização econômica do país e do fim da hiperinflação, o plano criado e implementado por Fernando Henrique Cardoso (FHC) trouxe, na verdade, sérias consequências para a soberania nacional e o desenvolvimento da economia brasileira.

O tripé macroeconômico – metas de inflação, superávit primário e câmbio flutuante –, base da política econômica imposta ao país, enfraqueceu a indústria nacional. Empresas públicas estratégicas foram vendidas ou tiveram seu capital aberto, a exemplo da Telebras, da Companhia Vale do Rio Doce, da Ligth, das ferrovias federais, da Petrobras e de dezenas de bancos estaduais. Vastos setores da economia passaram a ser controlados por grandes monopólios estrangeiros. A desindustrialização diminuiu o papel da indústria no PIB, transformou o Brasil em mero exportador de matérias-primas, as chamadas commodities, e totalmente dependente da importação de produtos industrializados de alta tecnologia.

A vinculação do valor da nova moeda ao dólar alimentou a especulação e fortaleceu o setor financeiro. Os impactos do Real na vida dos trabalhadores foram profundos. Segundo o IBGE, o desemprego aumentou mais de 50% entre 1994 e 1998. As condições de trabalho se precarizaram, direitos foram retirados e um forte arrocho salarial foi imposto.

Mesmo o controle da inflação, defendido como grande legado da nova moeda, foi alcançado à custa da desaceleração da atividade produtiva e de um escandaloso endividamento público. Como disse o mestre Celso Furtado, os economistas burgueses não sentiram nenhuma vergonha por trocar inflação por dívida externa e comprometimento do crescimento econômico do país.

De fato, ainda hoje, sob o argumento de controlar a inflação, o Banco Central aplica uma política monetária baseada na adoção de juros elevados e na redução do volume de moeda em circulação para conter o consumo da população. Acontece que os juros altos não controlam a inflação, ao contrário, apenas provocam o crescimento da dívida pública, impedem o financiamento de atividades produtivas e comprometem o orçamento nacional.

Isso porque, no Brasil, a inflação é resultado, principalmente, do excessivo encarecimento dos chamados “preços administrados” (energia, telefonia, combustível, transporte, tarifas bancárias, etc.), dos preços dos alimentos, hoje controlados pelos monopólios do agronegócio, e da dependência da estrutura produtiva brasileira ao capital internacional. Assim, as medidas adotadas pelo Banco Central (juros altos, etc.), na prática, são ineficientes para o controle desse tipo de inflação; funcionam apenas para concentrar renda e transferir mais recursos públicos para os credores da dívida.

Quem ganhou com o Real?

A verdade é que o Plano Real consolidou o papel subalterno do Brasil na economia mundial, transformando-o num paraíso para o grande capital e a especulação financeira, que hoje drenam nossas riquezas, controlam as contas públicas, ditam os rumos da economia, concentram a riqueza e mantêm o país entre os mais desiguais do planeta. São eles – os bancos e monopólios capitalistas – os grandes beneficiários desse estado de coisas.

O plano real deu tão certo quanto o “milagre” da ditadura. Ambos reorganizaram a economia brasileira para torná-la funcional à valorização do capital, mantendo a concentração de renda e o subdesenvolvimento.

Infelizmente, ao assumir o governo em 2003, o PT endossou a ideia de que essa política de dependência e subordinação é a única possível. O atual ministro da Fazenda Fernando Haddad, por exemplo, não mede esforços em agradar ao mercado, mesmo que isso signifique apertar o cinto da maioria da população.

Se tivéssemos no Brasil um governo verdadeiramente popular, o que se estaria discutindo agora seria um novo plano, com o povo no centro das atenções; um plano que discutisse como usar todas as riquezas produzidas pela brava gente brasileira para acabar de uma vez por todas com a dependência, a fome, o desemprego e as desigualdades sociais. Essa é uma tarefa que apenas a classe trabalhadora será capaz de cumprir.

Matéria publicada na edição n° 296 do jornal A Verdade

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