UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

domingo, 22 de dezembro de 2024

Em 30 anos, Plano Real aumentou dependência do país ao capital financeiro

Outros Artigos

Comemorado pelos neoliberais ao completar 30 anos em 2024, Plano Real “enfrentou a inflação” ampliando nossa dependência e submissão ao capital financeiro. Só uma reorientação verdadeiramente popular da economia poderá enfrentar papel subalterno do Brasil no mundo

Heron Barroso | Redação


Durante a Ditadura Militar (1964-1985), a política econômica dos generais transformou o Brasil num dos países mais desiguais do mundo. A concentração de renda ampliou o abismo entre ricos e pobres, a miséria cresceu, enquanto os salários dos trabalhadores foram achatados e perderam 50% do seu poder de compra; as portas da economia brasileira foram abertas ao grande capital estrangeiro e o tão falado “milagre econômico” produziu 41 milhões de famintos.

Para impedir que o país entrasse em recessão, a ditadura contraiu dívidas no exterior e entregou o controle da economia para o famigerado Fundo Monetário Internacional (FMI). A dívida externa, que era de 3,1 bilhões de dólares, em 1964, passou para 95,8 bilhões, em 1985, um aumento de mais de 3.000%!

Os militares levaram o Brasil à falência. Anos após a redemocratização, o país ainda não tinha conseguido se recuperar e sofria com uma inflação que passava dos 1.700% ao ano. Era comum ver as pessoas correndo aos supermercados antes que os preços dos alimentos fossem reajustados, coisa que ocorria diariamente.

Para enfrentar essa situação, foram propostos vários planos econômicos, a exemplo dos planos Cruzado (1986), Bresser (1987), Verão (1989) e Collor (1990). Porém, como nenhum deles mexeu nos privilégios do capital financeiro, a situação só se agravava.

A partir dos anos 1990, com a consolidação da chamada “nova ordem mundial” e do neoliberalismo, o Brasil passa a ser plataforma para a acumulação do capital financeiro, através do endividamento público, das privatizações e da submissão à cartilha do FMI.

Dependência e subordinação

Foi nesse contexto que surgiu, em 1993-94, o Plano Real, que em julho completou 30 anos. Louvado por economistas e pelos grandes meios de comunicação da burguesia como marco da estabilização econômica do país e do fim da hiperinflação, o plano criado e implementado por Fernando Henrique Cardoso (FHC) trouxe, na verdade, sérias consequências para a soberania nacional e o desenvolvimento da economia brasileira.

O tripé macroeconômico – metas de inflação, superávit primário e câmbio flutuante –, base da política econômica imposta ao país, enfraqueceu a indústria nacional. Empresas públicas estratégicas foram vendidas ou tiveram seu capital aberto, a exemplo da Telebras, da Companhia Vale do Rio Doce, da Ligth, das ferrovias federais, da Petrobras e de dezenas de bancos estaduais. Vastos setores da economia passaram a ser controlados por grandes monopólios estrangeiros. A desindustrialização diminuiu o papel da indústria no PIB, transformou o Brasil em mero exportador de matérias-primas, as chamadas commodities, e totalmente dependente da importação de produtos industrializados de alta tecnologia.

A vinculação do valor da nova moeda ao dólar alimentou a especulação e fortaleceu o setor financeiro. Os impactos do Real na vida dos trabalhadores foram profundos. Segundo o IBGE, o desemprego aumentou mais de 50% entre 1994 e 1998. As condições de trabalho se precarizaram, direitos foram retirados e um forte arrocho salarial foi imposto.

Mesmo o controle da inflação, defendido como grande legado da nova moeda, foi alcançado à custa da desaceleração da atividade produtiva e de um escandaloso endividamento público. Como disse o mestre Celso Furtado, os economistas burgueses não sentiram nenhuma vergonha por trocar inflação por dívida externa e comprometimento do crescimento econômico do país.

De fato, ainda hoje, sob o argumento de controlar a inflação, o Banco Central aplica uma política monetária baseada na adoção de juros elevados e na redução do volume de moeda em circulação para conter o consumo da população. Acontece que os juros altos não controlam a inflação, ao contrário, apenas provocam o crescimento da dívida pública, impedem o financiamento de atividades produtivas e comprometem o orçamento nacional.

Isso porque, no Brasil, a inflação é resultado, principalmente, do excessivo encarecimento dos chamados “preços administrados” (energia, telefonia, combustível, transporte, tarifas bancárias, etc.), dos preços dos alimentos, hoje controlados pelos monopólios do agronegócio, e da dependência da estrutura produtiva brasileira ao capital internacional. Assim, as medidas adotadas pelo Banco Central (juros altos, etc.), na prática, são ineficientes para o controle desse tipo de inflação; funcionam apenas para concentrar renda e transferir mais recursos públicos para os credores da dívida.

Quem ganhou com o Real?

A verdade é que o Plano Real consolidou o papel subalterno do Brasil na economia mundial, transformando-o num paraíso para o grande capital e a especulação financeira, que hoje drenam nossas riquezas, controlam as contas públicas, ditam os rumos da economia, concentram a riqueza e mantêm o país entre os mais desiguais do planeta. São eles – os bancos e monopólios capitalistas – os grandes beneficiários desse estado de coisas.

O plano real deu tão certo quanto o “milagre” da ditadura. Ambos reorganizaram a economia brasileira para torná-la funcional à valorização do capital, mantendo a concentração de renda e o subdesenvolvimento.

Infelizmente, ao assumir o governo em 2003, o PT endossou a ideia de que essa política de dependência e subordinação é a única possível. O atual ministro da Fazenda Fernando Haddad, por exemplo, não mede esforços em agradar ao mercado, mesmo que isso signifique apertar o cinto da maioria da população.

Se tivéssemos no Brasil um governo verdadeiramente popular, o que se estaria discutindo agora seria um novo plano, com o povo no centro das atenções; um plano que discutisse como usar todas as riquezas produzidas pela brava gente brasileira para acabar de uma vez por todas com a dependência, a fome, o desemprego e as desigualdades sociais. Essa é uma tarefa que apenas a classe trabalhadora será capaz de cumprir.

Matéria publicada na edição n° 296 do jornal A Verdade

Conheça os livros das edições Manoel Lisboa

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Matérias recentes