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segunda-feira, 4 de novembro de 2024

Hortas comunitárias e o trabalho coletivo nos bairros

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O trabalho construído pelo MLB nos bairros populares é uma das melhores escolas de como o povo tem tudo a nos ensinar, e a construção de uma horta comunitária é um exemplo didático disso.

João Paulo TIZ | Florianópolis (SC)


LUTA POPULAR – O Alto-Pantanal é um dos locais de anos de atuação do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), em Florianópolis, capital de Santa Catarina. Um morro tão íngreme que dificilmente automóveis conseguem subi-lo, construído majoritariamente de ocupações em área de risco por quem não tinha outra opção de moradia, cuja pavimentação das ruas, iluminação, e o pouco que há de saneamento básico – reivindicações históricas do bairro – foram feitos pelos próprios moradores que muito lutam em seu dia-a-dia. Um exemplo é o de dona Maria, que teve sua casa, na qual vivia desde criança, destruída por um deslizamento durante fortes chuvas em fevereiro deste ano. O MLB auxiliou no processo de mudança de dona Maria para uma casa ainda mais em cima no morro, cedida por outro morador da comunidade.

O bairro depende dessas mesmas chuvas para poder manter seu abastecimento de água nos encanamentos, que é racionado entre os moradores que precisam minimizar seu uso para não faltar antes que a próxima chuva encha as caixas d’água novamente. Com todas essas dificuldades, os moradores ainda precisam pagar altíssimos alugueis, potencializados pela especulação imobiliária nas regiões ao redor, chegando a R$1500 por mês. Assim, boa parte dos salários dos moradores se esvai já no início do mês e não sobra o suficiente para uma alimentação de qualidade.

Nessa realidade é que coube tomar como tarefa do núcleo do MLB do bairro a construção de uma horta comunitária no Alto-Pantanal, um trabalho que não seria possível sem a atuação dos moradores, ou seja, das massas. E de que forma essa atuação foi necessária? Quando começamos a pensar sobre a construção de uma horta, à primeira vista parece tão simples quanto cavar alguns buracos na terra e esperar que a natureza faça seu trabalho magicamente, mas à medida que passamos a planejar de forma material vemos que o buraco é mais embaixo. Os coordenadores nunca haviam feito o plantio de uma horta e em alguns momentos essa inexperiência nos imobilizou. Começamos pelas perguntas básicas: onde será construída? Com que sementes, materiais e ferramentas? Como se deve realizar o plantio? Quais os cuidados? E com que dinheiro?

Recorremos aos moradores do bairro. Já a primeira pergunta foi respondida quando um deles disponibilizou para o MLB parte de seu terreno com o objetivo de destinar à horta. Para as ferramentas, alguns moradores as emprestaram. Com isso, os primeiros mutirões de limpeza do local puderam ser realizados, contando com militantes do MLB, da Unidade Popular, da UJR e os próprios moradores do Alto-Pantanal. Ao longo desse período, o núcleo de Luta do MLB e apoiadores deram as direções sobre como preparar os canteiros e que materiais utilizar para melhorar a qualidade do solo.

Foi assim que no dia 9 de março foi inaugurada a Horta Comunitária do MLB no Alto-Pantanal, na qual foi realizada uma celebração com o plantio das primeiras mudas. Desde então, outras atividades têm sido planejadas no bairro e, para todas, os moradores dão as direções do que é possível fazer, desde o trabalho com madeira para construções, cuidados com o solo, cultivo de plantações, ferramentas, e mais. É através das brigadas, das panfletagens e das reuniões do núcleo de base que temos a oportunidade de conversar com o povo e que ele pode nos ensinar o vasto conhecimento que nos falta. Isso não significa que o trabalho na horta tenha sido resolvido e que não haja dificuldades, porém, graças a esse trabalho coletivo temos confiança para superá-las e construir uma grande luta contra a fome pelo bairro. Como já bem explicou Luiz Falcão: para realizar nosso trabalho com as massas é necessário estar no meio delas e pulsar no seu ritmo.

Essa é uma experiência simples, mas que faz lembrar de “Gonçalão”, personagem da trilogia Subterrâneos da Liberdade (Jorge Amado) que, situado no campo e sentindo falta de se reunir com seu partido para saber como construir a luta com os camponeses, conversa com eles e, a partir das reflexões que eles fazem, percebe que estava, na verdade, o tempo todo com seu partido: as massas camponesas e o próprio Gonçalão, que apenas precisava confiar e dirigir os camponeses.

É possível acabar com a fome

Se ainda nos for permitido sonhar, então sonhemos com um Brasil em que a fome não seja um problema. Adquirir alimento para toda uma família seria simples, já que não prevaleceria o individualismo nos dizendo que é errado começar a trabalhar em uma terra improdutiva só porque ela “tem dono”, ou que distribuir comida é “ruim para a economia”. Em vez disso, haveria a convicção de que toda comida que produzimos deve ser destinada ao povo através de, por exemplo, restaurantes populares, abastecidos com alimentos produzidos nas mais diversas hortas espalhadas pelos bairros e mantidas por seus próprios moradores.

Enquanto para muitos que veem o Brasil de agora isso parece uma utopia, nós, comunistas, sonhamos com os pés no chão e sabemos que essa sociedade é possível. Não à toa, é precisamente essa a descrição que a vietnamita Nguyen Luna, conhecida pelo seu canal “Luna Oi”, dá sobre seu país: há hortas comunitárias em todo lugar, e que “se há terra vazia em uma vila ou estrada, as pessoas apenas vão lá, plantam seus vegetais e os compartilham juntos”.

Então, como bem disse Che, façamos mais Vietnãs, traçando a luta contra a fome como uma tarefa coletiva e tendo como exemplo esse processo que deu origem à Horta Comunitária do MLB do Alto-Pantanal, replicando-o incessantemente através do aprendizado com o espírito prático de nosso povo.

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