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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Comissão Especial Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos realiza audiência pública no Recife

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Uma série de atividades marcaram a retomada da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) entre os dias 11 e 14 de fevereiro, no Recife. Ligada ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, a Comissão retomou suas atividades públicas, após ter sido extinta pelo governo Bolsonaro em 2022.

Clóvis Maia | Redação Pernambuco


Uma das últimas ações tomadas pelo governo do fascista Jair Bolsonaro foi extinguir a Comissão Especial Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), criada em 1995. Recriada em julho de 2024, depois de muita pressão da Coalizão Nacional Brasil por Memória, Verdade, Justiça, Reparação e Democracia, dos Comitês de luta por memória, verdade e justiça, e da Comissão Nacional de Familiares de Mortos e Desaparecidos Politicos, a Comissão realizou no Recife entre os dias 11 e 14 de fevereiro uma concorrida sessão pública.

Entre as atividades da Comissão, tivemos uma diligência em três cemitérios do Recife (Cemitério da Várzea, de Santo Amaro e Parque as Flores) com o objetivo de levantar dados sobre os desaparecidos políticos enterrados de forma clandestina nesses locais. Na ocasião, acompanharam a diligência Amparo Araújo do Comitê Memória, Verdade, Justiça, reparação e Democracia de Pernambuco e Marcelo Santa Cruz, representando a Secretaria de Direitos Humanos do Recife, ambos militantes históricos pelo direito à memória, à verdade e à justiça no estado de Pernambuco.

A CEMDP também fez uma visita à sede do Memorial da Democracia em Pernambuco, no bairro de Casa Amarela, onde se encontra o acervo da Comissão da Verdade Dom Helder Câmara de Pernambuco, além da audiência pública sobre memória, Verdade, Justiça e Reparação, no auditório Fernando Santa Cruz, na sede da OAB-PE, dia 13/02. No final da sessão, Eugênia Gonzaga, presidenta da CEMDP, convidou a todos e todas para o ato inaugural do busto de Soledade Barret Vieram, ao lado do Monumento Tortura Nunca Mais, na rua da Aurora, em homenagem à militante comunista paraguaia, assassinada pela ditadura militar fascista, em janeiro de 1973.

Audiência pública resgata a necessidade da construção da justiça de transição em nosso país

O mais importante momento da agenda da Comissão em Pernambuco foi a audiência pública realizada no auditório da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PE). Falando sobre a importância da escolha de Recife para a retomada das atividades públicas da Comissão, Eugênia Gonzaga, presidenta da comissão afirmou que “Em agosto do ano passado, a comissão praticamente não tinha verbas para sair a campo. Todas as resoluções, todas as portarias que embasavam nossas diligências, elas tinham sido revogadas pelo governo Bolsonaro. Então foi um período burocrático de tentar reerguer aquilo que foi reconstituído. E por que Pernambuco? Porque nós sabemos que o número de desaparecidos e mortos, proporcionalmente ao tamanho do Estado, é o maior do país.”

“Nós temos documentado 51 pessoas de algum modo relacionadas a Pernambuco, que nasceram aqui e desapareceram, morreram em outro estado, ou que nasceram em outro estado e morreram ou desapareceram aqui. Além disso, nós temos esses relatos desses cemitérios que tiveram suas valas comuns. E Recife tem uma militância forte, aqui as pessoas são muito bem organizadas e tem muitos espaços de memória, então nós fizemos questão de iniciar por Recife, por essa importância do tema que é dado aqui, tanto pela população, pela sociedade civil e pelas autoridades”, complementa.

Ao facultar a palavra para o público presente, a presidenta do Comitê Estadual da Verdade do Rio Grande do Norte (CEV-RN), Jana Sá, cujo o pai, foi guerilheiro no Araguaia e morto, no Rio Grande do Norte, em 1990, sob circunstâncias ainda não esclarecidas pela justiça, protocolou uma petição para que o caso de seu pai seja também investigado pela Comissão.

Falando ao jornal A Verdade, sua filha, Ana Beatriz de Sá, que é integrante do CEV-RN, representante do movimento de Filhos e Netos de ex-presos políticos e militante da UJR, declarou que “a audiência foi muito importante não só para os familiares dos mortos e desaparecidos políticos da ditadura militar fascista, mas também representou um avanço importante para toda a sociedade brasileira. Nesta conjuntura atual, é muito importante erguer a bandeira da luta por memória, verdade e justiça e pela prisão dr Bolsonaro e os generais golpistas de 1964 e de 2023. A gente precisa, na verdade, relembrar a memória dos nossos lutadores, que a gente precisa reativar a memória popular do que foi a ditadura militar no nosso país, do que foi a exploração do nosso povo durante esse período, que o nosso povo tem memória, e além disso que é preciso a gente dizer que a saída para a gente poder, de fato, ter uma sociedade sem exploração, para a gente ter uma sociedade em que lutar não seja crime, a gente precisa construir o socialismo como alternativa”.

Garantir o debate sobre memória, verdade, justiça e reparação

Para o Jornal A Verdade, Amparo Araújo, do Comitê Memória, Verdade e Justiça de Pernambuco, falou dos desafios que a Comissão vai ter nos próximos momentos. Para ela, “a principal tarefa da Comissão é continuar a busca pela verdade, pela justiça e pela garantia da democracia. E para quem sabe um dia esse país possa vir a ser uma nação. É como eu sempre digo, a luta pelos direitos humanos é feita de pequenas vitórias e grandes retrocessos. Houve um compromisso de campanha de que ela seria reinstalada logo em seguida da posse do governo Lula. Entretanto, houve muitas pressões por parte dos militares e a gente só conseguiu reinstalar após muita pressão dos movimentos sociais e por uma sentença do Superior Tribunal Federal, quando ela foi reinstalada em agosto de 2024. Desde então a comissão estava funcionando, mas de forma muito precária, porque não tinha nem estrutura. Essa reunião aqui em Pernambuco, com esse novo levantamento que está sendo feito a partir dos livros de registro dos cemitérios é um avanço que vai servir, inclusive, para ajudar na retificação dos atestados de óbito, mas, sobretudo, para que possa se corrigir os procedimentos que hoje estão sendo utilizados pelas administrações de cemitérios, tanto públicos quanto privados, para que não se perca os registros dessas pessoas que deixaram de existir, mas que existiram e tiveram sua importância ou histórica ou afetiva. Isso não pode se perder no tempo. É um desrespeito jogar as ossadas fora com dois anos e um dia, caso a família não tenha tido condições de identificar ou de pagar pelo procedimento para uma guarda definitiva”.

Entre as reivindicações da sociedade civil organizada e dos movimentos sociais estão a mudança de nomes de praças públicas com nomes de ditadores, renomeação de escolas públicas e investigações de outras pessoas que foram atingidas pelo regime e que até hoje ainda não tiveram seus casos, julgados. Ainda há muito que se fazer quando se trata da justiça de transição em nosso país.

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