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segunda-feira, 7 de abril de 2025

“O povo palestino tem um profundo amor pela vida e não teme a morte”

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“Temos uma grande luta pela frente, e ela começa aqui no Brasil. Precisamos construir uma frente unida, com objetivos claros e ambiciosos: a libertação da Palestina, do rio ao mar; o retorno de todos os refugiados palestinos às suas terras; e a libertação de todos os prisioneiros palestinos”, afirmou Rawa Alsagheer, coordenadora da Rede Samidoun de Solidariedade aos Prisioneiros Palestinos, em entrevista ao jornal A Verdade.

Redação SP


Rawa Alsagheer é coordenadora da Rede Samidoun de Solidariedade aos Prisioneiros Palestinos, membro do Masar Badil, o “Caminho Revolucionário Alternativo Palestino”, e esteve presente na celebração dos 25 anos do jornal A Verdade, em São Paulo, em dezembro passado, para falar sobre a resistência palestina. Conversamos com Rawa sobre a atual situação de luta na Palestina e sobre a solidariedade internacional.

A Verdade – Qual o sentimento em ver os palestinos deslocados pela guerra voltando para suas casas em Gaza?

Rawa – A conquista do acordo de troca de prisioneiros, que garantiu a libertação de importantes lutadores condenados à prisão perpétua, além da liberdade de todas as mulheres e crianças palestinas encarceradas, representa uma vitória histórica para a resistência palestina.

Após um ano e meio de genocídio contra o povo palestino, fica evidente a força e a resiliência de sua luta. Eles têm demonstrado ao mundo que são os verdadeiros donos daquela terra. Somente aqueles que são donos da terra caminham com tanto orgulho sobre ela, e é exatamente isso que os combatentes da resistência vêm fazendo desde o primeiro dia do cessar-fogo.

Apesar das inúmeras tentativas da ocupação israelense de destruir o povo palestino, a resistência jamais foi abalada. O povo permanece vivo, tem um profundo amor pela vida e não teme a morte. E, quando não se tem medo da morte, não há medo de nada.

Mas é muito importante destacar que, no mesmo dia em que ocorreu a troca de prisioneiros, enquanto libertavam aqueles que estavam na lista acordada, mais de 200 palestinos foram presos. Essas detenções foram o que chamam “prisões de administrativas”, uma prática que não envolve acusações formais ou julgamento em tribunais e que pode ser renovada a cada seis meses.

Desde o início do acordo até agora, mais de 2 mil palestinos foram detidos, enquanto pouco mais de 800 foram libertados. Conhecemos os nomes daqueles que recuperaram sua liberdade, mas é alarmante o número de novas prisões, especialmente na Jordânia, durante esse breve período desde o cessar-fogo.

Como tem sido para você defender os direitos do seu povo aqui no Brasil?  

Eu coordeno a Samidoun (Rede de Solidariedade aos Prisioneiros Palestinos) desde 2020. Ao longo desse período, enfrentei muitas dificuldades, mas após o início do genocídio na Faixa de Gaza, a situação se tornou ainda mais difícil.

Trabalhava como analista de comunicação no Museu da Imigração do Estado de São Paulo. Dia 07 de outubro de 2023 foi um sábado (o Sábado Sagrado). A partir do dia 10 de outubro, o museu passou a receber e-mails me acusando de terrorismo e antissemitismo, questionando a instituição por empregar uma ativista palestina.

Quando fui informada sobre os e-mails, solicitei cópias para registrar um Boletim de Ocorrência. Mas, em vez de fornecerem as cópias, fui questionada sobre a rede Samidoun e meu ativismo, além de ser pressionada para não formalizar a queixa. O e-mail que me enviaram estava incompleto, sem anexos ou cópias. Só consegui acesso às mensagens graças a uma colega de trabalho que me enviou prints, já que ela estava em cópia na lista de e-mail.

Ao longo do mês, fui alvo de uma série de perseguições. Uma campanha foi organizada nas redes sociais, me acusando de terrorismo e antissemitismo, expondo minha identidade e mencionando o museu em todas as publicações.

No dia 7 de novembro de 2023, fui demitida sem justificativa, em clara violação da lei trabalhista. Eu havia sofrido um acidente de trabalho e estava com atestado médico válido por sete dias. No oitavo dia, recebi a notícia da minha demissão.

Essa perseguição deixa claro o quanto o sionismo é forte no Brasil, mas também revela sua fragilidade ao mirar uma única ativista política. Eles têm influência até mesmo dentro do governo brasileiro.

E você chegou a denunciar essa perseguição virtual?  

Sobre as postagens, abri um inquérito na Polícia Civil, que foi encaminhado à Polícia Federal. Recentemente, tive uma audiência com um delegado que considero racista e xenofóbico. Ele me tratou como criminosa, não como vítima, durante o depoimento. Ele questionou minha opinião política, perguntando se eu apoiava o extermínio do Estado de Israel, algo totalmente alheio ao inquérito. A postagem que denunciei falsamente me acusava de apoiar tal extermínio, usando a palavra “pessoa” entre aspas, não me considerando como pessoa, mas o delegado ignorou isso.

Ele também não tinha noção da diferença entre sionismo e comunidade judaica ao descrever uma página chamada “Antisemita Exposure”, que usa a estrela de Davi. O sionismo frequentemente se apropria de símbolos judaicos para encobrir crimes, mas o delegado não reconheceu isso. Minha foto foi carimbada com a frase “Antisemita Exposure”, e ele não viu problema nisso, nem na página questionar meu trabalho no Museu da Migração. Fui exposta publicamente como antissemita, mas ele não deu atenção à calúnia. Além disso, o processo foi lento e desgastante, e o delegado agiu com ignorância, repetindo perguntas já respondidas na petição. Ele ainda dificultou a presença da minha advogada, deixando-a esperando.

Essa experiência reflete a perseguição que enfrento, desde ataques online até a interferência em minha vida profissional e pessoal, com conivência de setores do governo.

Enquanto o mundo assiste, em tempo real, ao genocídio televisionado do povo palestino, os sionistas se dedicam a perseguir aqueles que lutam pela Palestina em todo o mundo.

Que papel o apoio internacional cumpre na defesa do povo palestino e como os brasileiros podem apoiar mais essa resistência?  

A luta palestina é uma das mais importantes em escala internacional, pois a libertação da Palestina representa a libertação de todos os povos do mundo. É uma luta contra o colonialismo, o imperialismo, o capitalismo e o sionismo fascista.

Atualmente, existe um movimento global forte e crescente em apoio à libertação da Palestina. No entanto, o lobby sionista, com seu poder político e econômico, ainda é uma força grande e opressora.

No Brasil, por exemplo, há mais de 90 empresas de segurança israelenses atuando no país. Além disso, existem acordos entre a Sabesp e a Mekorot, empresa israelense de saneamento, vigentes desde 2009. Há também parcerias militares, incluindo acordos de armamento e treinamento militar entre Israel e Brasil. O povo palestino é usado como cobaia para testar tecnologias militares desenvolvidas nesses acordos. As mesmas armas utilizadas pela Polícia Militar para matar jovens brasileiros são testadas contra palestinos.

Temos uma grande luta pela frente, e ela começa aqui no Brasil. Precisamos construir uma frente unida, com objetivos claros e ambiciosos: a libertação da Palestina, do rio ao mar; o retorno de todos os refugiados palestinos às suas terras; e a libertação de todos os prisioneiros palestinos.

Matéria publicada na edição impressa nº 309 do jornal A Verdade

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