Projeto de Lei permitirá que força policial seja usado contra movimentos de luta por terra no campo para garantir lucros dos latifundiários.
Redação SP
BRASIL – Novo Projeto de Lei que autoriza a violência policial contra ocupações rurais, sem necessidade de ordem judicial, está em votação com caráter de urgência na Câmara dos Deputados. O projeto, se aprovado, marcará um profundo retrocesso na luta do campo, beneficiando apenas os latifundiários e escalando a violência contra os movimentos dos agricultores sem terra, como o MST.
O PL 8262/2017 é de autoria de André Amaral, um empresário e ex-deputado natural de João Pessoa. O projeto em seu artigo primeiro institui que “[…] proprietários possam solicitar força policial para retirada de invasores, independentemente de ordem judicial”, algo que é inconstitucional, ferindo, por exemplo, o princípio do contraditório e da ampla defesa previsto no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal: o direito de manifestar-se e responder às acusações ou alegações feitas contra si.
Essa proposta legislativa, no entanto, não surgiu de forma aleatória. Ela se insere em um contexto mais amplo de desmonte das garantias dos trabalhadores do campo e camponeses promovido pelos bilionários do agronegócio.
Exemplo disso é a diminuição sistemática do orçamento concedido ao Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), organismo tecnicamente responsável pela garantia do direito à terra, que em 2023 representava menos de 5% dos R$ 4,8 bilhões disponíveis em 2010, paralisando de forma profunda a criação de novos assentamentos e mantendo milhares de famílias trabalhadoras fora do direito à terra.
O poder dos latifundiários no Brasil
O poder do “agro” no Brasil se estende pelos âmbitos econômico, político e institucional. Além de concentrar milhares de hectares (como no caso de Daniel Dantas, latifundiário que em 2020 controlava cerca de 500 mil hectares, mais do que todo o estado de Sergipe) os grandes empresários do campo são muito bem servidos em questão de representantes: a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), mais conhecida como bancada do Agro, reúne 303 deputados e 50 senadores participantes, representando mais da metade da Câmara e do Senado. Aliás, a FPA atua transversalmente em todos os partidos, inclusive os ditos “de centro” ou “progressistas”.
Mas a burguesia agropecuária não se contenta só com o Congresso Nacional. No exemplo de ministérios, o governo fascista de Bolsonaro colocou Ricardo Salles, notoriamente ligado aos ruralistas do país, no Ministério do Meio Ambiente – e não por acidente, mas sim para “passar a boiada”, como o próprio já disse em uma reunião ministerial em 2020. No atual governo, o Ministério da Agricultura e Pecuária está sob controle de Carlos Fávaro (PSD), ex-senador do Centrão e que tem patrocinado centenas de bilhões de reais em subsídios e isenções fiscais ao agronegócio.
Até os cargos de governador são tomados, como no caso do estado do Paraná, governado por Ratinho Jr., onde o político, ligado ao setor agropecuário e alvo de pedido de impeachment, promove o Fundo Agro Paraná, um fundo público estadual criado para financiar o setor agropecuário do estado, oferecendo crédito com juros baixos para produtores rurais.
Toda essa influência gera fartos benefícios para a burguesia do Agro. Com o Plano Safra deste ano, R$ 447 bilhões serão destinados ao grande agronegócio, que irá reverter esses valores principalmente para a exportação de commodities em dólar. Enquanto isso, apenas R$ 69 bilhões irão para os produtores médios e pequenos, verdadeiros responsáveis pelos alimentos que chegam às mesas dos brasileiros.
Violência no campo é culpa do agronegócio
Uma mentira amplamente difundida por grandes ruralistas e seus políticos é a de que movimentos sociais geram violência. Isso é falso em diversos aspectos.
Indiretamente, o agronegócio contribui para a fome no Brasil ao priorizar o lucro. Em 2024, por exemplo, a soja — uma commodity voltada majoritariamente para exportação — ocupava quase metade de toda a área plantada com grãos no país. Já em 2023, produtores de leite chegaram a descartar milhares de litros de leite cru, alegando que o valor pago pela indústria era inferior ao custo de produção. Enquanto isso, a insegurança alimentar aumentava no país.
Diretamente, a falácia desmorona frente aos dados. Em 2022, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) registrou 1.724 conflitos no campo no Brasil. Dos 1.724 conflitos por terra, em 1.588 houve violência, tendo entre os principais causadores fazendeiros (31,2%), seguidos por empresários (19,7%), governo federal (11,2%), grileiros (9%) e governos estaduais (8,3%).
Mas essa violência é estrutural e histórica — com episódios de terror que permanecem gravados na memória coletiva. Por exemplo, o Massacre de Eldorado dos Carajás, em que, dos 21 corpos — nenhum deles sendo das forças policiais —, pelo menos dez vítimas foram executadas à queima-roupa. Sete lavradores foram mortos por instrumentos cortantes como foices e facões. Tudo isso com óbvia intenção de mandar uma mensagem: quem tem o poder é a burguesia e o Estado vai fazer de tudo para manter isso.
A luta é a saída
Não podemos deixar que essas práticas terroristas da burguesia nos impeçam de avançar a construção dos movimentos de luta no campo e contra a fome. O que está em jogo é a alimentação de todos os trabalhadores, rurais e urbanos – uma necessidade que a burguesia claramente não tem interesse em atender – e portanto deve ser uma só a luta dos camponeses e operários, dos pequenos agricultores e dos trabalhadores de todas as categorias nas empresas, dos trabalhadores assalariados do campo e dos autônomos nas cidades.
A união da nossa classe é mais urgente do que nunca, e se faz presente nas manifestações, greves e ocupações feitas em todo país e que não serão intimidadas pela covardia institucional que esse novo projeto de lei apenas vem ilustrar.