Violência doméstica mata 15 mulheres por dia no Brasil

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violência mulherO estudo Violência contra mulher: feminicídios no Brasil, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado recentemente, concluiu que a Lei Maria da Penha não alterou substancialmente a quantidade de assassinatos de mulheres em decorrência da violência de gênero, o chamado feminicídio.

Feminicídios são os crimes “geralmente perpetrados por homens, principalmente parceiros ou ex-parceiros, e decorrem de situações de abusos no domicílio, ameaças ou intimidação, violência sexual, ou situações nas quais a mulher tem menos poder ou menos recursos do que o homem”.

Assim, o estudo esclarece que os principais assassinos de mulheres são seus parceiros íntimos, maridos, namorados, etc., chegando a 40% do total de crimes contra a mulher os assassinatos cometidos por esses parceiros.

Tal situação ocorre principalmente devido ao machismo existente em nossa sociedade e à relação de poder existente nela, na qual o mais forte oprime o mais fraco por meio da violência, e isso se transporta para a esfera das relações íntimas, sofrendo as mulheres todo tipo de subjugação e violência, como a física, moral, patrimonial, sexual e psicológica.

 A expressão máxima da violência contra a mulher é a morte, daí a necessidade da análise do efeito da Lei Maria da Penha nessa questão. Essa lei foi promulgada com o intuito de coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, mas, após sete anos de vigência, os dados demonstram que esse objetivo está longe de ser alcançado.

O Ipea constatou que, entre 2001 e 2006 – portanto antes da promulgação da lei – as taxas de mortalidade foram de 5,28 por 100 mil mulheres e, de 2007 a 2011, após a vigência da lei, esse índice foi de 5,22, tendo um sutil decréscimo apenas no ano de 2007, logo após a promulgação da lei, depois voltando a crescer. Esta taxa ficou em 5,82 mortes por 100 mil mulheres de 2009 a 2011. Assim, as taxas de homicídios de mulheres praticamente permaneceram estáveis, antes e depois da promulgação da lei.

O estudo mostrou ainda que, a cada ano, ocorreram 5.664 mortes de mulheres por causas violentas: 472 a cada mês, 15,52 a cada dia, ou uma a cada hora e meia.

Quanto à ocorrência de mortes, por cada região do País, Nordeste (6,90), Centro-Oeste (6,86) e Norte (6,42) apresentaram as taxas mais elevadas de mortes de mulheres por cada grupo de 100 mil. Não por acaso, são também essas regiões as mais pobres da Nação e as que mais problemas têm em termos de estrutura, falta de saneamento básico, saúde, educação, etc.

Outro dado demonstra que as mulheres jovens foram as principais vítimas da violência fatal. Mais da metade dos óbitos (54%) foram de mulheres entre 20 e 39 anos.

Outro dado alarmante mostra que 61% das mulheres assassinadas eram negras, as principais vítimas em todas as regiões, exceto no Sul. No Nordeste essa taxa foi de 87%, no Norte, 83% e no Centro-Oeste, 68%.

Foi verificado também que a maior parte das vítimas tinha baixa escolaridade: 48% das mulheres tinham até oito anos de estudo.

A Lei Maria da Penha foi e é um importante instrumento no combate à violência contra a mulher, fruto da luta histórica de milhares de mulheres, e tem que ser incentivada, divulgada e devidamente aplicada, pois visa, além da punição do agente, a formas de prevenir a ocorrência da violência. Está provado, porém, que a aprovação de uma lei não é capaz de acabar com as mazelas de que sofre nosso povo, tampouco com a violência que, infelizmente, a cada dia mais, toma conta da rotina das mulheres, em especial das mulheres pobres e trabalhadoras.

É necessário que as políticas públicas estejam voltadas para a concretização do que está previsto na lei e que as delegacias, o Ministério Público, juízes, defensores públicos e advogados estejam efetivamente preparados para atuar nessas demandas, e possibilitem o acesso à Justiça das mulheres que sofrem violência. É necessário que o sistema as proteja e não as trate como as criminosas, como não raramente observamos na atuação diária.

É preciso também que existam casas-abrigos, que as delegacias da mulher funcionem durante as 24 horas do dia, pois a violência não tem hora marcada para acontecer. Também que tais delegacias invistam em um tratamento humanizado. Necessitamos de mecanismos que garantam a integridade e a segurança física da mulher quando o juiz decreta alguma medida protetiva, como afastamento do agressor do lar, determinação para que o agressor não frequente determinados lugares ou se mantenha à distância da vítima – enfim, que os mecanismos previstos na legislação tenham como ser efetivados na prática.

Mas é imprescindível também que as mulheres tenham acesso à educação, saúde, emprego digno, creches para os filhos e a todas as condições exigidas para que possam se afastar das situações de risco.

Contudo, para a efetiva erradicação da violência contra a mulher, é preciso que a luta seja mais profunda, que se ataquem as raízes da violência, que coincidem com as próprias raízes da opressão da humanidade. Apenas uma sociedade na qual não exista nenhum tipo de exploração, e em que não haja a exploração do homem pelo homem, é capaz de garantir as condições de uma vida de plena igualdade entre homens e mulheres e, assim, acabar com a violência de gênero que ainda perdura no Brasil e no mundo.

Raquel Brito, São Paulo