A banca de livros usados do Olivar, na Rua da Carioca, Centro do Rio de Janeiro, vende, em média, 500 livros por dia, ao preço de R$ 2,00. Dez mil livros por mês. Uma clientela diversificada dedilha as folhas dos exemplares em diferentes línguas e gêneros literários.
O livreiro Francisco Olivar de Sousa, nasceu em Camocim, interior do Ceará e desde pequeno, gostava de ler revistas em quadrinhos. Em 1975, com 16 anos, foi morar no Rio de Janeiro para terminar os estudos. Concluído o ensino médio, estudou ciências médicas na Faculdade Gama Filho. Diante da impossibilidade de continuar pagando as mensalidades, começou a trabalhar na livraria Entrelivros, no Largo do Machado, que, na década de 1980, era considerada a mais importante do Rio de Janeiro.
Lá conheceu importantes escritores nacionais e estrangeiros, intelectuais e artistas que frequentavam esse universo. Encantado com o livre acesso à leitura de matizes diferentes largou os estudos para ser gerente da livraria. Após anos nessa rota de trabalho, resolveu participar da Feira do Livro, que circulava nos bairros cariocas. Essa atividade se expandiu para o interior de São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo, em regiões que não possuíam livrarias. Percebendo as dificuldades econômicas dos moradores que apreciavam uma boa leitura e não tinham como obtê-la, passou a vender livros a preços populares. Por mais de 20 anos, vendeu a R$ 1,00 os mais diversos títulos.
Em 1998, Olivar lançou o livro Risadinha, o menino que não ganhava presente. O sucesso foi tão grande que o texto foi adaptado para o teatro. “Essa história de que brasileiro não gosta de ler é lorota. São esses pseudointelectuais que propagam essa mentira. Realizei diversas feiras no interior do Brasil, em que o relógio batia 23h, e as pessoas permaneciam em cima dos livros”, afirma o livreiro.
Essa dedicação permanente à leitura foi reconhecida com os merecidos assentos na Academia Brasileira de Literatura de Cordel, na Academia Cearense de Letras e na Academia de Artes do Rio de Janeiro.
“Meu patrimônio são os meus clientes”
Estudioso e colecionador da obra de Monteiro Lobato, Olivar mantém uma relação genuína com seus clientes. “Às vezes, acontece de a pessoa não ter o dinheiro, ser humilde ou eu não conhecer, mas leva e paga quando puder. Depois elas passam, pagam e nem lembro qual foi o livro vendido. Também acontece de levar dias para encontrar um livro solicitado, mas faço pela pura satisfação da entrega. Gosto muito de quem gosta de livro. O meu patrimônio não são os livros, são meus clientes”, conta.
Clientes privilegiados? Olivar explica que com ele não há tratamento diferenciado: “O tratamento é igual, do porteiro ao presidente do BNDES. O importante é gostar de ler”. Nesse momento, se emociona e consente com a cabeça que um transeunte leve um livro para pagar depois, sem anotar o nome do comprador, nem o livro vendido.
Para manter a qualidade e a quantidade que a banca exige é necessário um esforço diário do nosso livreiro para percorrer prédios e casas na procura e na seleção desse material. A ajuda de outro livreiro, Almir Alves da Silva, há 50 anos no ramo, é fundamental. Sobre o preço pelo qual vende seus livros, Olivar explica os motivos de vender tão barato: “Vender livros a R$ 2,00 populariza o livro e incentiva a leitura. A banca fica sempre cheia de jovens, adultos, dia e noite comprando, apreciando os livros que normalmente custariam R$ 50 ou mais em outros lugares”.
“Você pode modificar sua vida com o livro”
Apesar do amor aos livros, Olivar fala com tristeza da extinção de boas livrarias no Brasil. “Livreiro que conheça o autor, que saiba indicar um livro com uma boa história está acabando porque as livrarias, na sua maioria, viraram butiques”.
Após a entrevista, Francisco Olivar, que havia lido um exemplar de A Verdade antes do nosso encontro, quis saber mais sobre o jornal. Gostou tanto que pediu que deixássemos 30 jornais na sua banca, para vender.
Nessa conversa observamos o carinho e a dedicação que Olivar tem com os clientes. Sempre atento para oferecer uma boa leitura ou um autor do interesse do comprador. Sua crença na literatura mantém a chama que se alimenta diariamente em sua alma na certeza do papel transformador que o livro propicia na vida das pessoas. “Sempre há tempo para ler, não tem idade. Você pode modificar sua vida com o livro”.
Denise Maia, Rio de Janeiro