Monocultura do dendê no Pará destrói terras cultiváveis e encarece alimentos

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poluicaoquimica-750O Brasil, historicamente, investiu grandes recursos, humanos e financeiros, em atividades agrícolas e minerais voltados para exportação e atendimento das demandas das potências europeias e estadunidense. No Brasil Colônia foi a cana-de-açúcar e o ouro. No Império e na República Velha, o café. Atualmente, a soja e o dendê ocupam um lugar de destaque como produto primário agrícola direcionado a gerar divisas ao Brasil. Contudo, o preço pago pela população e pelo meio ambiente é alto, pois, enquanto o governo federal isenta as grandes empresas mineradoras e agrícolas, tem jogado nas costas do povo a devastação ambiental, promovendo a disparada no valor de alimentos essenciais, como feijão e mandioca. A principal utilização do dendê consiste na extração do óleo para tornar-se, após um processo químico denominado transesterificação, biodiesel e glicerina.

Desde 2002, quando foi lançado o programa PROBIODIESEL (Programa Brasileiro de Desenvolvimento Tecnológico do Biodiesel), pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, a utilização de fontes de energia da biomassa para produção de combustíveis alternativos tem obtido grandes investimentos, sob a justificativa de economia de divisas e equilíbrio na balança comercial. Nesse quadro, o estado do Pará, gradualmente, foi se tornando o maior produtor nacional do dendê, com uma estimativa de 700 mil toneladas produzidas por ano, representando 85% da produção nacional, apesar dos investimentos iniciais terem se direcionado à região sudeste da Bahia.

A produção do dendê teve um crescimento exponencial em diversos países (principalmente Malásia, Indonésia e Brasil) a partir de 2008, quando a União Europeia estabeleceu uma diretiva agrícola com a meta de mistura obrigatória de 10% de biocombustível nos combustíveis, até 2020. Seu valor atrelado à cotação do barril do petróleo tem impulsionado grandes investimentos na área, contudo seus efeitos colaterais também geram um debate complexo sobre as limitações de viabilidade sustentável que, a priori, estabeleceram uma rica discussão sobre os biocombustíveis como alternativas de reduzido impacto ambiental quando comparado com os combustíveis fósseis, entretanto essa almejada “redução de impacto” tem sido rediscutida.

Nesses quase 15 anos do estabelecimento do dendê como uma das principais monoculturas do Brasil, o que temos visto é, na verdade, grandes impactos ambientais e desequilíbrio alimentar que são ignorados pelos órgãos reguladores e pelos grandes meios de comunicação. A despeito da importância da substituição dos combustíveis fósseis a médio e longo prazo, faz-se necessário um estudo e medidas de combate aos efeitos colaterais do plantio do dendê. Duas grandes empresas agrícolas, a Biopalma e a Agropalma, se instalaram no Pará e monopolizam a produção dessa commodity na região, contando com total apoio da EMATER e do Governo do Pará.

Enquanto isso, a pequena produção agrícola, em especial do feijão, da mandioca, de frutas e verduras, tem sido drasticamente afetada. O valor do quilograma do feijão ultrapassou os R$ 10,00, enquanto que o tradicional quilo da farinha de mandioca dificilmente é encontrado por menos de R$ 5,00. Essa é uma realidade não só do Pará, mas de qualquer estado ou país em que se prioriza a monocultura, que precisa de áreas gigantescas para plantar, em detrimento dos produtos agrícolas cujo mercado interno é o maior consumidor, isto é, o apoio é dado aos produtos que vão ser exportados, enquanto que o povo, verdadeiro dono da terra de onde saem essas riquezas, é penalizado e tem que arcar com as consequências de uma política agrícola que atende o interesse do grande capital.

Diante desse quadro, a reforma agrária e o apoio ao pequeno agricultor são medidas fundamentais para combater a inflação sobre os gêneros alimentícios, além de permitir um cuidado maior sobre a utilização da terra. O investimento em biocombustíveis é necessário, porém deve ser feito baseado em estudos e medidas preventivas que reduzam a patamares mínimos os efeitos colaterais sobre o meio ambiente e sobre a população. Outro dado importante é sobre a preservação do solo e das águas que não é realizada pelas grandes empresas, que contaminam com resíduos químicos o lençol freático das áreas de plantio do dendê, logo a estatização desses latifúndios e o estabelecimento do controle popular sobre eles é a única maneira de barrar a sede de lucro sobre a terra e seus produtos, no qual o povo tomará todas as medidas para preservar seu principal meio de sobrevivência: a natureza e suas riquezas.

Matheus Tavares Nascimento, estudante da UFPA