Com promessa de privatizações e expansão de vagas, o recém-eleito governador de São Paulo defende modelo ‘insustentável’ para sistema prisional, diz especialista.
Em declarações públicas e em seu plano de governo, João Doria já deixou clara sua intenção de implementar em São Paulo a privatização de unidades prisionais. Por meio de Parcerias Público-Privadas (PPPs), a ideia do tucano vai de encontro ao modelo de complexo penitenciário privado adotado em Ribeirão das Neves, Minas Gerais.
Em média, um preso no estado de São Paulo custa R$ 1.450 por mês aos cofres públicos. Nas unidades prisionais administradas pelo poder privado em Ribeirão das Neves, essa quantia aumenta para R$ 2.700 por preso, segundo informações do governo de Minas Gerais. Essa discrepância, de acordo com especialistas, pode justificar a geração do ‘business penitenciário’, isto é, o lucro obtido por empresas envolvidas na privatização de prisões com o encarceramento em massa – no caso de Minas Gerais, a licitação foi concedida ao consórcio de empresas Gestores Prisionais Associados (GPA).
O lucro de empresas envolvidas em unidades prisionais privatizadas, segundo reportagem da Agência Pública, se daria principalmente por meio da redução de custos internos com a população carcerária, com o próprio repasse financeiro do estado e com o trabalho de presidiários, que recebem até ¾ de um salário mínimo – sem benefícios proporcionais aos estabelecidos pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) – e que, portanto, têm um custo menor para empregadores.
Para Rafael Custódio, advogado criminalista e assessor do programa de Violência Institucional da ONG Conectas, a medida defendida por Doria, além de incentivar o ‘business penitenciário’, apenas “aprofundaria” a presente conjuntura do sistema prisional do estado, que conta com 240 mil presos, maior população carcerária do país segundo o Infopen. “São Paulo já é o estado que mais prende e mais mata no Brasil. E, indo na mesma linha que (Jair) Bolsonaro, essas ações do Doria só tendem a aprofundar a situação atual, aumentando o encarceramento em massa em vez de combater a raiz do problema”, declara.
Doria defende que, com a Parceria Público-Privada, a superpopulação nas prisões – que em São Paulo chega a 183% – acabaria. Para isso, seria necessário aumentar quase o dobro do número de vagas e investir na construção de novas penitenciárias no estado. Atualmente, há 170 unidades prisionais espalhadas pela capital e por cidades do interior.
Em entrevista concedida à rádio Jovem Pan, o tucano também falou sobre seus planos de empregar todas as pessoas privadas de liberdade no estado, primeiro para “pagar o custo que representam à sociedade”. De acordo com o Levantamento de Informações Penitenciárias, apenas 13% da população carcerária de SP exercem alguma atividade laboral e, destes, 27% não recebem remuneração. Para que os planos do governador eleito atingissem seu objetivo, portanto, seria necessário empregar mais de 200 mil presos.
Para Custódio, porém, as promessas de Doria no que tange o sistema carcerário visam apenas o lucro, por meio das empresas envolvidas nas privatizações, e um ‘controle social’, a partir do encarceramento em massa de jovens, negros e pessoas pobres. “Não é interesse do estado promover a paz. Ele precisa de um pouco de violência para se legitimar”, declara.
O advogado explica, ainda, uma possível justificativa para o mencionado ‘controle social’. “Como a sociedade brasileira é desigual e possui uma classe dominante, as políticas criminais acabam refletindo essa desigualdade”, diz. Conforme dados do Infopen, mais de 56% das pessoas presas em São Paulo são negras e cerca de 53% têm idade entre 19 e 29 anos, sendo a maioria de baixa escolaridade – 45% possuem ensino fundamental incompleto – e em situação de pobreza.
Bianca Ribeiro, São Paulo