Por Alysson Lemos (artista e militante da Unidade Popular – Ceará)
A aterrorizante entrevista de Regina Duarte ao telejornal 360º, da CNN Brasil, revela mais um episódio grotesco, porém programado, do embate político que o governo fascista de Jair Bolsonaro vem travando junto aos trabalhadores da cultura, seus inimigos declarados segundo o presidente. A classe artística em sua grande maioria vem cumprindo um papel fundamental no enfrentamento contra o desmonte galopante nas políticas públicas destinadas ao setor.
Desde que tomou posse, o atual governo extinguiu o Ministério da Cultura, relegou o seu papel a uma secretária esvaziada, sublocada e realocada constantemente em outros ministérios. “Passando de mão em mão”, a Cultura vem sofrendo os efeitos de um projeto político sombrio e impiedoso, capaz de desenterrar narrativas que até então eram lidas como desprezíveis e criminosas.
Após a passagem fulminante do dramaturgo fascista Rodrigo Alvim pela pasta, que culminou no episódio de apologia clara ao nazismo, e a resposta imediata das camadas progressistas da população brasileira, o então secretário foi exonerado e a pasta iniciou a sua trágica novela com a “namoradinha do Brasil”, Regina Duarte, apoiadora declarada dos ideais bolsonaristas e cotada para assumir a Secretaria Especial da Cultura. Sem as credenciais e competências que o cargo exige, como a própria relatou diversas vezes, e sem contar com o apoio do setor, a atriz assumiu a pasta, tornando-se mais uma peça no jogo baixo e midiático sob o qual este governo vem operando.
Desde que assumiu o cargo, a secretária se pronunciou publicamente em duas ocasiões, a primeira em seu discurso de posse, onde afirmou que uma das razões para aceitar a tarefa seria uma “carta branca” prometida por Jair Bolsonaro na condução dos trabalhos e decisões da pasta, promessa esta quebrada em pouco tempo, com interferências diretas em nomeações e gerências que seriam da competência de Regina. A segunda manifestação pública da secretária aconteceu na última quinta-feira, dia 07 de maio de 2020, em entrevista exclusiva ao canal CNN Brasil, e dessa vez a carta branca de Regina veio manchada de sangue.
Em menos de 40 minutos, a secretária minimizou as mortes e torturas cometidas durante a ditadura militar, tripudiou sobre o atual momento enfrentado pela população brasileira, onde até o momento da entrevista se contabilizava 9.146 mortes por conta da COVID-19, e também se demonstrou profundamente alheia à morte de colegas artistas que tanto contribuíram com a cultura brasileira e a construção imagética de outros possíveis para o mundo. A morbidez sarcástica no discurso de Regina Duarte escancara o que existe de pior nas entranhas obscuras do governo Bolsonaro, e nos alerta que, independente de histórico, carisma ou discurso, todos que cercam esse projeto estão alinhados com o fascismo e a morte de qualquer ideia em oposição.
Diante dos absurdos proferidos por Regina, em sua entrevista, podemos atenuar que as suas palavras, mais do que deslocadas de um senso de realidade, demonstram uma crueldade institucionalizada; a ironia, a violência e a morte como argumentos possíveis de um projeto de poder que precisa a todo custo ser repudiado, combatido e derrubado. Nesse sentido, os trabalhadores e as trabalhadoras da cultura devem assumir o seu papel de protagonistas nesse enfrentamento, pois só estes são capazes de criar imaginários, levantar outras propostas de mundo, alimentar uma esperança verdadeiramente revolucionária e emancipatória.
Como muitos já passaram, a indesejável secretária especial da cultura também passará, será esquecida junto aos miseráveis no calabouço dos desprezíveis, e só restará espaço para a arte, a luta e a vida. Viva os trabalhadores e as trabalhadoras da cultura, organizados e em luta sempre. Até a vitória!