BRASIL – Na última sexta-feira (12), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, editou a Portaria nº 151/2021, a qual delega ao titular da Diretoria de Pesquisa, Avaliação e Monitoramento da Biodiversidade (DIBIO) a “competência para autorizar previamente a publicação de manuscritos, textos e compilados científicos produzidos no âmbito e para o Instituto em periódicos, edições especializadas, anais de eventos e afins”. A portaria institui que solicitações de autorização prévia deverão ser dirigidas ao Diretor e devem ser acompanhadas de declaração de responsabilidade.
Atualmente, quem ocupa o cargo de diretor da DIBIO é Marcos Aurélio Venâncio, um tenente coronel da Reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo, que, apesar de ter tido alguma experiência com Policiais Militares Ambientais, não possui formação acadêmica ou prática em produção científica nas áreas de conservação, ecologia, biologia ou gestão da biodiversidade.
Quais seriam suas condições de autorizar ou desautorizar publicações oriundas de pesquisas feitas por profissionais com formação na área, financiadas com dinheiro público, cujo objetivo foi e será uma única missão: como melhor gerir, proteger e manejar a sociobiodiversidade brasileira? Ficam algumas questões: o que seria não-publicável? E por quê? Se o referido diretor não reúne condições para atestar a qualidade dos artigos nas diferentes áreas que compõem o Instituto, o que ele irá atestar? Se as revistas científicas possuem um corpo editorial com gabarito técnico-científico para analisar tais trabalhos quanto à sua pertinência e mérito, desempenhando este trabalho com esmero e conhecimento historicamente reconhecidos, o que o senhor diretor teria a dizer ou a contribuir?
A única explicação para essa intervenção no processo rotineiro de fazer ciência e publicar seus resultados é o que chamamos de “censura prévia”. A gestão militarizada do MMA e do ICMBio quer inviabilizar a comunicação de seus servidores com a sociedade, impondo um filtro ideológico que os impeça de pesquisar e publicar cientificamente o real status de conservação da sociobiodiversidade brasileira.
A publicação de artigos em revistas científicas cumpre o importante papel de compartilhar informações que auxiliam na construção do conhecimento referente à sua área temática e construir diálogos de saberes para o monitoramento, avaliação e proposição de políticas públicas. Convém ressaltar que os periódicos científicos no Brasil e no mundo trabalham pelo sistema “duplo cego” ou revisão por pares. Assim, as revistas científicas que recebem os artigos para avaliação e publicação possuem corpo editorial especializado que submete os trabalhos para avaliação de, pelo menos, dois cientistas com expertise na área temática em análise, e que não conhecem os pesquisadores autores do trabalho para garantir impessoalidade.
O ICMBio possui 14 centros de pesquisa e conservação que se constituem em unidades descentralizadas da autarquia aos quais compete produzir, por meio da pesquisa científica, o ordenamento e a análise técnica de dados, o conhecimento necessário à conservação da biodiversidade, do patrimônio espeleológico e da sociobiodiversidade associada a povos e comunidades tradicionais.
Os servidores, funcionários e bolsistas dos centros e demais Unidades descentralizadas do Instituto fazem Ciência de qualidade para melhor orientar tecnicamente políticas públicas de conservação da sociobiodiversidade. A quem (e a que) interessa impedir, dificultar, burocratizar ou desconsiderar esse trabalho? Convém destacar que os servidores que atuam em atividades de pesquisa científica, dentro e fora dos Centros Especializados, trabalham em parceria com pesquisadores de Universidades, Institutos, ONGs e diversas outras entidades da sociedade civil. A censura e condicionamento de publicações ao filtro ideológico e militar do atual governo é mais um golpe contra a liberdade de expressão e uma afronta às instituições públicas e à sociedade brasileira. A lista de pesquisadores do ICMBio pode ser consultada nesse link, caso ele também não seja retirado do ar em breve.
Compreendemos que esta iniciativa visa, mais uma vez, impor uma mordaça aos servidores do ICMBio, que já são impedidos de falar com a imprensa, mesmo sobre assuntos relacionados às unidades nas quais atuam. Lembramos ainda que em maio de 2020 o Instituto Chico Mendes publicou um Código de Ética no qual vedava ao servidor “divulgar estudos, pareceres e pesquisas, ainda não tornados públicos, sem prévia autorização”, em uma clara afronta à Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011) e em franco diálogo com a recente norma. Iniciativas semelhantes só foram vistas no período da ditadura militar com a atividade de censura instaurada e que nos trouxe tantos prejuízos históricos, científicos, artísticos, culturais etc.
Aliás, nunca é demais lembrar que estamos (ainda) em uma democracia, cuja Constituição Federal de 1988 traz em seu artigo Art. 5, IX – “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.
Não nos curvaremos e não aceitaremos censura! Estamos na luta e pedimos apoio a todos os cidadãos, instituições e imprensa para ampla divulgação desta nota. A Asibama-PB e demais associações de servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Lei Fed. 10.410/2002) estão mobilizadas e se articulando para as medidas judiciais e administrativas cabíveis. Ditadura nunca mais!
ASIBAMA-PB – Associação de Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente no Estado da Paraíba.