Por Redação de Santa Catarina
O Prefeito Gean Loureiro (DEM) no início de 2021 já havia tentado aprovar reformas do Plano Diretor de Florianópolis de forma autoritária, sem democracia e diálogo com a população, em janeiro desse ano, mas a proposta havia sido reprovada por 1 voto na câmara de vereadores. Agora, em 17/12/2021, o prefeito tenta repetir processo, evidenciando o autoritarismo e a ausência de democracia da direita.
O Plano Diretor é uma das leis municipais mais importantes de um município. Ela é conhecida como o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. É obrigatória para municípios com mais de 20 mil habitantes e tem duração de 10 (dez) anos.
Essa lei, na teoria, define as prioridades no desenvolvimento das cidades levando em consideração a melhor utilização da área urbana e rural respeitando questões sociais e ambientais. No plano diretor deveria se garantir a organização de vias e bairros e o acesso a diversos direitos como moradia, educação, saúde, trabalho, esporte, lazer, entre outros.
Para que a revisão do Plano Diretor seja efetivamente participativa, garantindo participação popular e efetiva democracia, devem acontecer, no mínimo, fóruns, cursos, capacitações e espaços de debate e construção de conhecimentos sobre o que é um plano diretor, qual sua importância e qual o impacto na vida das pessoas, nos seus bairros e na cidade como um todo.
Ainda, tendo Florianópolis 13 distritos, o correto seria ter pelo menos uma audiência pública por distrito, com ampla divulgação, em horário não comercial que possibilite a ampla participação dos moradores interessados daquela localidade, com cursos e capacitações que possibilitem a participação com qualidade das discussões, proposições e eventuais votações.
Vale recordar que em Florianópolis, no ano de 2014, ano do último processo de revisão[1] do Plano Diretor sob a gestão de César Souza Júnior (PSD), tivemos a aprovação do Plano em um processo completamente antidemocrático, autoritário, ignorando e subvertendo a participação popular. Mesmo tendo ocorrida participação pública durante anos na elaboração do projeto, no momento de aprovação a Câmara de Vereadores alterou em questão de minutos centenas de artigos sem respeitar a construção democrática e popular.
Agora, em 2021, após a primeira tentativa de golpe na revisão do Plano Diretor em janeiro desse ano, o Prefeito Gean Loureiro convocou uma única audiência pública no auditório da ALESC – Assembleia Legislativa de Santa Catarina, com capacidade para apenas 420 pessoas e limitando a metade o número de participantes, num universo de aproximadamente 500.000 habitantes, para apresentar seu projeto de reforma do Plano Diretor.
O processo de debate do Plano Diretor apresenta inúmeras falhas e vícios de origem que tornariam a lei anulável no poder judiciário, como o próprio Ministério Público de Santa Catarina alertou em Recomendação[2] de ampliação da participação popular na revisão do Plano Diretor no mesmo dia da realização da Audiência Pública.
Nesta Recomendação o Ministério Público informa que caso o Município de Florianópolis não assegure maior participação popular estará agindo na ilegalidade, por descumprir leis como a Lei Orgânica do Município de Florianópolis, o Estatuto das Cidades (Lei 10.257/01), a Constituição Estadual de Santa Catarina e a própria Constituição Federal.
Destaca-se o seguinte trecho da Recomendação do Ministério Público:
CONSIDERANDO que sua realização em um único ato, em uma sexta-feira à noite, em data próxima às festividades de final de ano e em meio ao surgimento de uma nova cepa de coronavírus, identificada como Ômicron, altamente infecciosa, claramente conspira contra a ampla e efetiva participação da população;
Mesmo diante da Recomendação do Ministério Público, da pressão de movimentos sociais, mandatos do campo popular e do povo, o Prefeito Gean Loureiro insistiu na realização da Audiência Pública em uma sexta-feira à noite, entre 18h00 e 22h00, sem garantia de amplo debate, participação popular, desrespeitando o povo, as leis e as instituições que jurou defender.
Diante desse movimento da prefeitura e do silêncio dos setores empresariais coube aos movimentos sociais como o MLB – Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas e as Brigadas Populares e aos partidos do campo popular e progressista (UP – Unidade Popular, PSOL, PT) a participação na audiência pública buscando extrair da Prefeitura o respeito a participação popular no processo de revisão do plano diretor, como prevê a legislação.
Na audiência pública militantes de movimentos sociais como o MLB – Movimento de Luta nos Bairros Vilas e Favelas e do partido UP – Unidade Popular pelo Socialismo exigiram o adiamento da audiência e a realização de pelo menos mais 13 audiências distritais em 2022 com ampla divulgação prévia, capacitação da população, participação popular e horário condizente com a jornada de trabalho do povo, denunciando que a realização de apenas uma audiência em uma sexta-feira à noite feria a participação popular, a democracia, a Constituição Federal, o Estatuto das Cidades e a Lei do Plano Diretor atual, Lei Complementar nº 482/14 de Florianópolis.
Na própria audiência pública setores empresariais aliados ao governo municipal fizeram falas apoiando as reivindicações do MLB e da UP, entendendo ser importante respeitar a democracia e a participação popular e cumprir a legislação atual, mas, a Prefeitura preferiu agendar apenas a continuação da audiência pública inicial na Câmara de Vereadores de Florianópolis no dia 27/12, entre 15:00 e 20:00, ou seja, ferindo novamente a possibilidade de ampla participação popular visto que a maioria do povo estará trabalhando ou de férias/recesso, além do fato do auditório da câmara de vereadores possuir capacidade muito reduzida.
Assim, por saberem que apenas a realização de uma audiência pública em dois dias não fornece o mínimo de participação popular necessária, os vereadores do PSOL Marquito e Afrânio e o Mandato Coletiva Bem Viver ajuizaram um Mandado de Segurança pedindo a suspensão da audiência pública que se realizaria dia 27/12 entre as 15:00 e 20h00, obtendo a suspensão da audiência por descumprir os requisitos de participação popular, divulgação prévia e respeito a legislação vigente:
Mesmo com essa vitória parcial diante do poder judiciário, se faz necessária a mobilização popular para garantir o respeito à democracia, a participação popular e a defesa de uma cidade que seja digna para o povo trabalhador morar, com a realização de ao menos 13 audiências públicas, com ampla participação popular e amplo debate na sociedade, cursos e oficinas de formação sobre a importância do Plano Diretor e sobre qual modelo de cidade devemos defender para os próximos 10 anos, sem ilusões de que uma cidade que garanta moradia, educação, trabalho, saúde, segurança, lazer, cultura, transporte, acessibilidade, respeito ao meio ambiente será conquistada no capitalismo.
[1] http://g1.globo.com/sc/santa-catarina/noticia/2014/01/redacao-final-do-plano-diretor-e-aprovada-em-florianopolis.html
[2] https://www.mpsc.mp.br/noticias/mpsc-recomenda-ampliacao-da-participacao-popular-na-revisao-do-plano-diretor-de-florianopolis-