Ingrid Marrese Lopes | Florianópolis
Na manhã do dia 09/06 a Ocupação Antonieta de Barros acordou sob ataque. Após uma decisão judicial pela reintegração de posse completamente arbitrária e baseada em mentiras, o oficial de justiça veio até a ocupação acompanhado de policiais do tático para despejar a ocupação organizada pelo Movimento de Mulheres Olga Benario sem sequer aviso prévio da realização do despejo. Durante os dois meses de ocupação, o Estado não se prezou a realizar sequer uma mesa de negociação com o movimento, nem a elaborar novas políticas públicas em defesa da vida das mulheres, mesmo após as inúmeras denúncias e mobilizações realizadas pelo Olga. Pelo contrário, aprovou uma reintegração de posse com uma decisão que mentia sobre um suposto uso da casa e autorizava o arrombamento e o uso da violência policial contra militantes, apoiadoras e mulheres que estavam sendo atendidas na ocupação. A reintegração de posse iniciou sem qualquer aviso prévio e antes da audiência de conciliação, já prevista no processo. O movimento, entendendo a ameaça iminente de forte agressão por parte dos policiais e por presar pela segurança das mulheres presentes na casa, optou pela saída pacífica. A partir das negociações realizadas junto às nossas advogadas e demais apoiadores, conquistamos o direito de retirarmos as coisas que conseguimos com muita luta e apoio de quem esteve ao nosso lado até aqui. Dessa forma, seguiremos denunciando os absurdos vividos pelas mulheres trabalhadoras catarinenses.
“Em 2021 o TCE concluiu essa detalhada auditoria, na qual pudemos constatar que, após mais de 15 anos da Lei Maria da Penha, Santa Catarina ainda tem muito o que fazer. Em 2019, os números já eram alarmantes, com mais de 60 mil notificações na Secretaria de Segurança. No ano passado, com o resultado da auditoria, percebemos que a situação no nosso Estado havia piorado. Além do aumento em 51,7% nos registros nos últimos 5 anos, os achados evidenciaram que não havia articulação e interlocução entre os órgãos que compõem a rede de atendimento, que não temos alguns instrumentos previstos em lei para esse atendimento, que carecemos de pessoal qualificado para o atendimento às vítimas (somente 31 delegacias especializadas em todos o Estado, que atende também crianças, adolescentes e idosos, e apenas 5 delegacias com equipe especializada em investigação de violência grave contra a mulher), bem como locais adequados |para receber essas mulheres (apenas 12 Casas Abrigo em todo o Estado, com capacidade para atender 236 mulheres). Com relação à prevenção, mais precariedade. Não temos programas de prevenção bem estruturados no Estado e são mínimos os programas voltados à reabilitação dos agressores.” (MPC/SC, 2022)
Observa-se o pronunciamento do próprio estado denunciando a insuficiência e precariedade no serviço público para proteção às mulheres, muito aquém do previsto na política pública nacional para orientar e ampará-las juridicamente. É dever do estado garantir que existam equipamentos públicos de qualidade, que sejam especializados para acolher essas mulheres vítimas de violência. Igualmente importante é que estes funcionem 24h, visto que as mulheres não sofrem violência apenas nos horários comerciais, como infelizmente é o caso dos poucos e precários equipamentos de Florianópolis.
Como apontam os dados relatados acima, é de suma importância a existência da ocupação autogerida pelo Movimento De Mulheres Olga Benario De Santa Catarina, que é a Casa De Referência Antonieta De Barros. A ocupação, que estava sediada no centro da cidade de Florianópolis, tem como função principal acolher e salvar a vida das mulheres que são vítimas de violência, proporcionando orientação jurídica, acolhimento psicológico, formações técnicas e políticas, atividades culturais, espaços de convivência entre outras atividades, tão necessárias para poder efetivamente salvamos nossas mulheres da situação de violência.
Mesmo frente a essas denúncias do cotidiano da mulher nesse estado, ainda sim recebemos um despacho validando o despejo da ocupação com alegação que o imóvel já estava sendo habitado, mesmo com provas que isso não é verdade, mesmo como apelações e recursos judiciais, conseguimos apenas uma mesa de conciliação entre o estado e o movimento, no dia anterior ao despejo, e os 4 oficiais de justiça negaram ao pedido das nossas advogadas de primeiro haver a negociação com estado antes de despejar-nos.
Esse ato vai contra a constituição brasileira, contra a vida das mulheres e isenta a responsabilidade do estado em garantir que tenha equipamentos públicos em todas as cidades, como também a construção da Casa Da Mulher Brasileira, projeto travado há mais de 10 anos, mesmo havendo o terreno cedido pela União. Não só o Estado burguês ignora a vida das mulheres como também ataca aquelas que trabalham para a emancipação das mulheres trabalhadoras.
O Movimento de Mulheres Olga Benario está saindo da ocupação Antonieta de Barros com a cabeça erguida e a certeza de que continuará suas lutas no Estado. Se ilude quem acredita que o movimento não construirá novas ocupações, cada vez mais fortes e combativas, para salvar as trabalhadoras que atualmente ficam abandonadas pelo Estado.
Resistiremos! É pela vida das mulheres!