Idelmar Cavalcanti: “Greve na UESPI é em defesa da universidade pública”

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Os Professores da UESPI (Universidade Estadual do Piauí) estão em greve desde o dia 2. Eles buscam juntamente com a Coordenação Estadual da ADCESP reverter o grave cenário de desvalorização que há dez anos sofre uma defasagem acumulada em sua remuneração superior a 68%. O professor de História em Parnaíba – PI, coordenador de comunicação da ADCESP (Sindicato dos Docentes da UESPI) e militante da Unidade Popular Idelmar Cavalcanti denuncia o descaso do Governo Estadual de Rafael Fonteles (PT) com a educação, em especial com a UESPI.

Fabio Andrade | Teresina 


Jornal A Verdade – Por que os professores da UESPI decidiram entrar em greve?

Idelmar Cavalcanti – Bom, em primeiro lugar, acho que é importante destacar que em se tratando de UESPI nos últimos anos, o estranho é a gente ter passado tanto tempo sem se manifestar, porque motivos é que não faltam. A UESPI tem sido vítima da negligência dos governos já há muito tempo.

Então, nesse caso específico dessa greve, a gente decidiu iniciar esse movimento grevista justamente pela forma como Rafael Fonteles (PT) tem tratado as nossas demandas nesse ano. Desde janeiro do ano passado que a gente vem tentando negociar com o Governo Estadual a respeito de uma defasagem salarial que já nos aflige há dez anos. Nos últimos dez anos essa defasagem salarial se acumulou e hoje está na casa de quase 70%.

Então, em janeiro a gente apresentou o nosso estudo com essa defasagem, tentamos o ano inteiro negociar com ele e simplesmente se recusou a negociar. E paralelamente a isso, enquanto a gente estava nessa luta para tentar negociação com o governo, ele apresentou uma proposta de Projeto de Lei Nº 09/2023, à Assembleia Legislativa, extremamente lesiva para o nosso plano de encargos. Simplesmente essa proposta, se for aplicada do jeito que ele imagina, vai matar a pesquisa e a extensão dentro da Universidade Estadual do Piauí.

Por que? Porque ele quer suprir a carência de professores, enchendo os professores de disciplina. Quer que cada professor pegue o teto máximo de carga horária – disciplina. Se isso acontecer, em que momento, qual é o tempo que o professor vai disponibilizar para fazer pesquisa e extensão?. Ou seja, não vai ter tempo! Isso vai sacrificar o próprio estatuto da UESPI enquanto universidade.

O que faz uma universidade ser universidade não é só ensino, é ensino, pesquisa e extensão. Então, o que ele estava querendo fazer é praticamente matar a universidade, que além desse sacrifício do estatuto de universidade, ainda dá também um grande prejuízo para os alunos, porque estarão em jogo mais de duas mil bolsas que hoje são ofertadas para os alunos, na modalidade PIBIC, PIBID… Enfim, são atividades que os professores simplesmente não poderão mais praticar, porque vão estar presos em sala de aula. Então, a proposta do Governador Rafael Fonteles acaba com a pesquisa e a extensão.

Quais são as principais reivindicações dos professores? 

Isso tudo se condensou nas duas principais pautas dessa greve. A gente quer que o Rafael Fonteles sente numa mesma negociação para discutirmos a nossa defasagem salarial e tentar encontrar uma solução para ela. E, estamos cobrando o arquivamento total dessa proposta de projeto de lei, o PLC 09 de 2023, que é justamente esse que altera o nosso plano de encargos de uma forma absolutamente lesiva para a universidade.

Então essas são as duas pautas principais do movimento grevista. Isso não quer dizer que isso seja uma camisa de força, que isso seja estanque. Não, estamos aliados aos estudantes, estamos abertos para as reivindicações dos estudantes.

A ADCESP nunca se furtou de lutar por tudo aquilo que significa bem estar de toda a comunidade acadêmica. Embora  a campanha salarial fosse o foco, estávamos em todos os espaços da luta, em que as condições de trabalho dos professores da UESPI estivessem em risco, e dos estudantes, a ADCESP estava lá; a exemplo do que ocorreu no Campus de Uruçui que foi praticamente destruído por um incêndio, assim que soubemos, imediatamente nos dirigimos até o sul do estado para prestar solidariedade aos colegas e denunciar a precarização da UESPI.

E nada é feito, e quando é feito é de forma improvisada e publicitária. Os últimos anúncios de verba para a universidade, foram feitas para reagir a algum desastre que ocorreu, ou seja, são questões que estão abaixo da linha de razoabilidade. A universidade estadual tem vários níveis de deterioração que vai desde a falta de equipamentos em laboratório, falta de pessoal técnico administrativo, até os mais graves como é o caso de incêndio e teto desabando.

Na sua opinião, por que o Governador não quer sentar pra negociar com a categoria?

Por que não tem compromisso nenhum com a UESPI. A gente observa os discursos e slogans do governo – que é um governo que se pretende desenvolvimentista – e em nenhum momento aparece a UESPI, e isso aí já é revelador, porque em outras sociedades do mundo, as grandes potências, o desenvolvimento passa pela universidade, pela pesquisa e ciência.

É inconcebível pensar de um lado o desenvolvimento e de outro, a universidade, e essa proposta que o Governador está fazendo não passa pela valorização do professor, nem pela ciência, da pesquisa dentro da estadual. Aí o que ele faz: quer tornar o estado do Piauí o mais digital do Brasil, e vai buscar tecnologia na Estônia e não investe em sua própria universidade. Enquanto isso, o curso de Computação no Campus de Parnaíba está discutindo se permanece Bacharelado ou se torna um curso tecnólogo.

Enquanto o Governador propaga um desenvolvimento pro estado através do Hidrogênio Verde, o Porto, opta por manter a universidade estadual a pão e água, querendo com isso transformar a UESPI uma ótima mercadoria com salários achatados, funcionando com poucos equipamentos, opera a baixo custo e rende ótimos resultados, enxugando a universidade para uma Parceria Público – Privada, ou uma possível privatização, a exemplo do que ocorreu com alguns hospitais do estado que foram entregues à iniciativa privada. Então é isso que ele quer fazer? Privatizar a Universidade Estadual do Piauí?

Quais são os próximos passos da luta grevista?

No último dia 10 de Janeiro obtivemos uma importante vitória. Parcial, é verdade, mas uma importante vitória. No final de dezembro de 2023, o governo através da justiça, conseguiu declarar nossa greve como ilegal. Um absurdo pois nossa greve não tinha nem começado ainda, e isso é um crime cometido pelo governador por estar nos roubando o direito à greve, o direito da manifestação.

Como é que ele criminaliza uma greve que nem sequer tinha sido iniciada? E vejam só o que foi alegado pra justiça para tornar nossa greve ilegal: que a categoria não queria negociar! Disse que estava sempre aberto a negociação e fomos nós que não quisemos e de forma intransigente declaramos a greve. E conseguimos provar que há muito tempo procuramos o governo e ele não abria nenhum canal de negociação. Enfim provamos tudo na justiça, desmascaramos o governo estadual e a suspensão da ilegalidade deu um novo ânimo para a categoria. 

Após o ato de rua que tivemos no dia 11 de Janeiro numa marcha até o Palácio de Karnak, a categoria se organizou através de uma assembleia para se preparar e apresentar nossas propostas na mesa de negociação marcada para o dia 18 de Janeiro.

E qual foi o resultado dessa mesa de negociação?

Estavam presentes 46 categorias do estado na reunião. O Governo efetivamente não trouxe nada de novo e frustrou todo mundo; nem os 4,7% que o governador insinuou via imprensa foram oficialmente confirmados como proposta. E por outro lado, o governo não recebeu as propostas das categorias do conjunto de servidores do estado, que era de 22%, sendo 11% em Janeiro e 11% em Maio (reajuste referente às perdas acumuladas nos anos de 2021, 2022 e 2023). Está na cara que o Governador está enrolando, querendo ganhar tempo. Essa mesa já está sendo considerada de ‘Mesa da Enrolação’!

É tão absurdo, que na reunião eles estavam propondo a criação de duas comissões: uma para estudar a possibilidade de reajuste e outra para discutir a metodologia da mesa. Sendo que a metodologia, tanto a ADCESP quanto os outros sindicatos, já vêm cobrando há mais de um mês e eles nunca deram um retorno. Ou seja, ignora completamente a proposta apresentada pela categoria, o que quer dizer que ele não quer negociar!

Por fim, o mais importante é que todas as categorias estão unidas, nenhuma cedeu, e a unidade da classe trabalhadora será determinante para conseguirmos a vitória.