A inflação nos países da UE subiu para um recorde de 11,5% em outubro.
Katharina Kirsch-Soriano da Silva | Viena (Áustria)
A Europa reúne alguns dos países mais ricos do planeta. São dez países europeus no ranking dos 20 mais ricos, medido pelo PIB per capita. No entanto, cada vez mais pessoas vivem na pobreza ou estão em risco de pobreza. A pandemia de Covid-19 significou perdas de emprego ou renda para muitas pessoas. A guerra na Ucrânia e a dinâmica nos mercados de energia desencadeada pelas sanções europeias contra a Rússia aumentaram ainda mais o custo de vida e empurraram mais pessoas para a pobreza. Mais e mais pessoas não sabem como pagarão suas contas de aquecimento no inverno que se aproxima ou se poderão aquecer as suas casas.
Aumento dos preços de alimentos e habitação
A inflação na União Europeia subiu para uma média de 11,5% em outubro de 2022 em relação ao mesmo mês do ano anterior e, assim, atingiu um nível recorde. Para a maioria dos países, é a maior inflação desde a década de 1970. Os Estados Bálticos e a Hungria mostram a maior taxa de inflação, cada um em torno de 22%. Os Países Baixos têm uma inflação de 17%; a Alemanha e a Áustria – à semelhança da média na UE – cerca de 11,5%; Portugal 10,6%. Na França, com 7,1%, os preços por enquanto sobem um pouco menos do que no resto da UE.
Tendo em vista a queda nas importações de alimentos da Ucrânia, também há sinais de um aumento significativo dos preços dos alimentos na União Europeia. Em outubro de 2022, os preços ao consumidor de alimentos e bebidas não alcoólicas eram 17,3% maiores do que no mesmo mês do ano anterior. Na Alemanha, o aumento dos preços dos alimentos ficou acima dessa média, em 18,9%. Na Áustria, o aumento foi de 10,5%, na Hungria, onde foi particularmente forte, o aumento foi de 43%. O aumento do preço dos alimentos reflete-se também no aumento das filas e listas de espera nos dispensários de alimentos por parte das organizações sociais. Algumas já não conseguem cobrir mais as necessidades atuais.
Os custos da habitação também aumentaram de forma significativa em muitos países europeus nos últimos anos – particularmente nas grandes cidades, onde os imóveis estão cada vez mais servindo como um investimento para o capital financeiro e a especulação imobiliária está moldando o mercado. Por exemplo, a inflação acumulada de 2016 a 2019 para moradores que vivem de aluguel em cidades com mais de 100 mil habitantes na Áustria foi de 7,79%, e em vários outros países muito acima disso. 8% das pessoas na UE ficaram sobrecarregadas com os custos de habitação em 2021, o que significa que tiveram de gastar mais de 40% da sua renda disponível em habitação. Na Alemanha, este valor era de 11%; na Dinamarca, mais de 15% e na Grécia, um pouco menos de 29%. Devido ao alto custo da habitação, a superlotação de apartamentos também é um problema crescente. Na UE, 17% da população vivia em apartamentos superlotados.
Crise de energia e pobreza
Os preços da energia foram os que mais subiram no ano passado – por exemplo, o aumento do índice de preços de energia na Áustria, em setembro de 2022, foi de 54,5% em relação ao mesmo mês do ano passado, cinco vezes mais que o índice de preços ao consumidor. Portanto, fala-se também de uma crise energética. Como mostra a pesquisa EU-SILC 2021, no ano passado, 7% da população da União Europeia vivia em domicílios que não tinham condições financeiras para aquecer adequadamente as suas casas. Cerca de 17% (ou seja, aproximadamente 76 milhões de pessoas) estavam em risco de pobreza e cerca de 30% das famílias da UE não tinham poupanças significativas. Pesquisas atuais mostram como a situação na área de pobreza – aliada à pobreza energética – piorou nos últimos meses e vai piorar nos próximos meses.
Mães solteiras ou pais solteiros e suas crianças, famílias imigrantes, assim como pessoas idosas com pensões baixas são particularmente atingidas pela inflação. A proporção de pessoas empregadas, mas que se encontram ainda assim em risco de pobreza, também está crescendo. Organizações sociais trazem relatos sobre contas de aluguel e energia não pagas, novas dívidas e sobre pessoas ameaçadas com cortes de energia e despejos. Auxílios financeiros pontuais – dados por parte de alguns governos – servem apenas como curativos temporários, mas não conseguem resolver os problemas e melhorar as condições de vida a longo prazo.
Lutas por salários e socialização dos lucros
As empresas de energia estão atualmente obtendo lucros recordes. Um correspondente aumento dos salários dos trabalhadores deve, portanto, também ser colocado na agenda política. É por isso que, no momento, estão acontecendo negociações por melhores salários, lutas trabalhistas e numerosas greves por toda a Europa. E no que diz respeito aos lucros das empresas de energia, a socialização desses lucros por parte do Estado e uma possível redistribuição desses recursos para as pessoas mais vulneráveis nessa crise energética também devem entrar na pauta.
Matéria publicada na edição impressa nº 265 do jornal A Verdade