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quinta-feira, 21 de novembro de 2024

PL do Estupro é cruel e inconstitucional

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O PL 1904/24 pretende equiparar o aborto feito com mais de 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, inclusive nos casos em que a gravidez for fruto de estupro. A resposta das mulheres diante desse projeto de lei fascista foi ocupar as ruas de todo o país.

Monique Zuma | Advogada e militante do Movimento de Mulheres Olga Benario


Recentemente, o povo brasileiro foi surpreendido com mais um ataque aos direitos das mulheres. O PL 1904/24, de autoria do deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), pretende equiparar o aborto feito com mais de 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, inclusive nos casos em que a gravidez for fruto de estupro. Se for aprovado, a pena para a mulher que realizar aborto pode chegar a até 20 anos de prisão, enquanto a pena máxima para um estuprador é de 10 anos!

Como é a legislação hoje

O aborto no Brasil é considerado ilegal, mas, desde 1940, existem três exceções que permitem a sua realização: quando a gravidez representa risco à vida da gestante; quando é resultado de estupro; quando o feto é anencéfalo (não possui cérebro). Apesar dessa previsão, na prática, o acesso ao aborto legal é extremante difícil. Apenas seis dos 27 estados possuem informações sobre o serviço na internet e nos locais em que o serviço deveria ser prestado é comum profissionais e hospitais alegarem objeção de consciência para não realizar o procedimento.

Na contramão do retrocesso proposto pelo PL 1904, existe a ADPF 422, que visa a descriminalizar o aborto até a 12ª semana de gestação, mas teve o julgamento no STF suspenso em setembro de 2023, quando a ministra relatora Rosa Weber votou a favor da ADPF, entendendo que a criminalização do aborto viola os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, além da dignidade humana.

Maiores vítimas são crianças

No Brasil, mais de 60% das vítimas de estupro têm de 0 a 13 anos de idade, e menos de 4% dessas crianças conseguem acessar o aborto legal. Além disso, uma menina de 10 anos tem risco de morte de duas a cinco vezes maior por complicações na gestação. É nítido que a preocupação de quem defende o PL 1904 não é com a vida das crianças, mas sim em manter o controle sobre o corpo das mulheres e meninas.

O sistema de justiça burguês não é capaz de proteger as crianças. Exemplo disso é o caso da menina de 11 anos que foi estuprada em Florianópolis. Ela descobriu a gravidez com 22 semanas e teve o acesso ao aborto legal negado pelo hospital. Ao buscar seus direitos foi enviada pela juíza do caso a um abrigo, para impossibilitar a realização do aborto legal, em uma decisão desumana, além de ilegal.

Inconstitucionalidade do projeto

O texto do PL 1904 contraria, de uma só vez, vários princípios e direitos previstos na Constituição Federal. Equiparar o aborto ao homicídio vai na contramão da proporcionalidade; retirar direitos previstos desde 1940 desrespeita a vedação ao retrocesso; criminalizar todo tipo aborto a partir da 22 semana, sem considerar a situação socioeconômica da mulher, viola os direitos à autonomia reprodutiva, saúde e planejamento familiar da mulher.

A frase “gravidez forçada é tortura” resume outra ilegalidade do Projeto, porque obrigar mulheres e meninas vítimas de violência a manterem uma gravidez indesejada é uma clara violação à dignidade da pessoa humana, além de desrespeitar a proibição de tortura e tratamentos cruéis, desumanos e degradantes.

Inclusive, no dia 17 de junho, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) aprovou, por unanimidade, uma resolução, amparada num parecer técnico-jurídico, na qual afirma que este projeto de lei é inconstitucional, inconvencional e ilegal.

Mulheres nas ruas contra o PL do Estupro

A resposta das mulheres diante desse projeto de lei fascista foi ocupar as ruas de todo o país. A rápida mobilização mostrou que o povo não vai assistir calado às retiradas de seus direitos e fez com que o presidente da Câmara, Arthur Lira, recuasse, adiando a votação para o segundo semestre de 2024. Essa vitória, no entanto, é parcial. Só a continuidade e o crescimento da luta popular serão capazes de barrar mais esta investida do fascismo.

Agora, é necessário que a luta continue pelo arquivamento definitivo do PL 1904/24, até a conquista do aborto legal, seguro e gratuito no Brasil.

Matéria publicada na edição nº 295 do Jornal A Verdade

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