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quinta-feira, 15 de agosto de 2024

Organizações Sociais da Saúde sucateiam saúde pública de São Paulo

Em São Paulo, o SUS enfrenta problemas graves devido à terceirização e privatização promovida pelas OSS com o aval da Prefeitura. Cortes de verbas, diminuições no quadro de funcionários e baixos salários resultam em superlotação, longas filas de espera e sobrecarga dos profissionais de saúde nas UBSs da cidade

Magno Pereira Rocha e Viviane Damaceno | São Paulo (SP)


SAÚDE – O Sistema Único de Saúde (SUS) é um dos serviços essenciais mais importantes do nosso país, pois é a partir dele que a população pode ter acesso a uma saúde pública, gratuita e de qualidade, apesar de diversas insuficiências. Contudo, em todo o país, mas especialmente na cidade de São Paulo, o SUS tem sido entregue a Organizações Sociais de Saúde (OSS), entidades privadas que atentam contra sua transparência, sua eficácia e seu caráter público, tornando-o apenas um atravessador mercantilista.

Assim, apesar da enorme importância que o SUS tem para o povo, temos visto a concessão de seus equipamentos, como hospitais e Unidades Básicas de Saúde (UBSs), para o que na realidade são empresas terceirizadas (apesar das OSS alegaram que “não tem fins lucrativos”) que cortam gastos e diminuem o quadro de funcionários. Algumas das OSS oferecem mais benefícios, mas em compensação pagam baixos salários. O resultado desse processo é o sucateamento da saúde pública, aumentando a quantidade de pacientes em filas de espera, fragilizando a autonomia do Estado para intervir em problemas administrativos e dificultando a transparência dos gastos públicos.

Saúde ameaçada em São Paulo

Dados do IBGE mostram que, em 2019, 17,3 milhões (10,7%) de pessoas de 18 anos ou mais de idade procuraram algum serviço da Atenção Primária à Saúde (APS), como as UBS, nos seis meses anteriores à pesquisa. Entre elas, 69,9% eram mulheres; 53,8% não tinham uma ocupação e 64,7% tinham renda domiciliar per capita inferior a um salário-mínimo.

Nas Unidades Básicas de Saúde da cidade de São Paulo, a terceirização se acelerou na gestão do ex-prefeito Bruno Covas (PSDB) e teve continuidade na atual gestão de Ricardo Nunes (MDB). Cerca de 90% das UBS estão sendo administradas por OSS, em uma verdadeira entrega de dinheiro público para bolsos privados.

A falta de compromisso da prefeitura com a administração pública das Unidade Básicas de Saúde tem uma primeira grande consequência: a superlotação generalizada desses espaços, já que eles contam com um número de funcionários cada vez menor. A sobrecarga dos enfermeiros dentro das unidades se tornou parte de um “novo normal”.

Além disso, o crescimento exponencial no número de casos de gripe e dengue no primeiro semestre de 2024 ocasionou uma falta de testes disponíveis e no aumento das filas de espera. No contexto da epidemia de dengue que afetou o país, os enfermeiros foram pressionados a bater metas de atendimento altíssimas, a despeito da ausência de materiais e enfrentando uma grande insatisfação de pacientes que, revoltados, chegam a ameaçar fisicamente os trabalhadores.

Um problema similar ocorre nas campanhas de imunização organizadas pela Secretaria Municipal de Saúde, prejudicadas pela falta de vacinas e pelo número reduzido de enfermeiros para aplicá-las. Isso gera uma expectativa maior pela aplicação de uma única vacina, levando à frustração de quem utiliza o serviço.

Ainda por cima, a Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM), uma das OSS contratadas pela prefeitura de São Paulo, custeia de forma insuficiente essas ações, de acordo com relatos de seus funcionários. Com isso, enfermeiros, responsáveis técnicos e outros profissionais, tiram de seus próprios salário o dinheiro para comprar insumos para a campanha.

Nas unidades de saúde mental, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), a saúde pública paulistana também enfrenta um processo de sucateamento, com falta de funcionários e necessidade urgente da construção de novas unidades. Sem a abertura de novos serviços de saúde, os usuários não terão garantido o acesso à integralidade e longitudinalidade do cuidado que são diretrizes centrais da construção do SUS.

Controle social sob ataque

Há anos, para não convocar novos editais de contratação de trabalhadores (algo que a Prefeitura também se negava a fazer quando era responsável pelas unidades), a SPDM recorre à realocação de funcionários, “emprestando-os” para as unidades que gere e para a sede administrativa, segundo denúncias feitas ao jornal A Verdade. Essa prática, além de estimular a sobrecarga, leva a muitos casos de desvio de função.

O cenário é devastador: um dos depoimentos relata que, sozinhos, 3 funcionários da sede administrativa da SPDM no Butantã atenderam mais de 300 ocorrências mensais no último período, em que foi registrado um aumento no número de ocorrências para a manutenção. Os problemas do tipo vão ainda mais além, sendo vistos também na contratação de empresas terceirizadas para o fornecimento de materiais e equipamentos.

Em outra medida questionada, na gestão Ricardo Nunes, a Secretaria Municipal de Saúde contratou a Organização Nacional de Acreditação (ONA) para supostamente “aferir a qualidade” dos postos de saúde. Nas visitas da ONA, são verificados itens como organização da unidade, uniformização dos funcionários, pintura e reformas e protocolos de atendimentos de todos os profissionais. Quando todos os itens estão em conformidade com as diretrizes da ONA, a UBS recebe certificação de acreditação.

Porém, este método de avaliação não está previsto nas diretrizes da saúde pública brasileira, que é de administração tripartite e prevê que administradores do serviço, trabalhadores e usuários, por meio dos Conselhos Gestores, é que devem exercer o controle social do SUS, e não empresas externas. Apesar de se apresentar como uma entidade “filantrópica”, a ONA tem como presidente Fábio Leite Gastal, um representante da UNIMED, um monopólio do setor da saúde privada.

Tirem as mãos da saúde pública!

A entrega de equipamentos públicos para OSS e as privatizações são medidas realizadas com a promessa de melhorias na gestão e no funcionamento. Porém, como mostra esse conjunto de denúncias, essas formas de gestão são pautadas apenas pela sede de recursos públicos escondida pela máscara “sem fins lucrativos” das Organizações Sociais da Saúde, que sempre optam por decisões que prejudicam pacientes e trabalhadores.

As demissões e a precarização do trabalho na saúde pública, além de gerarem mais dificuldades para o sistema absorver a demanda de pacientes, ameaçam o caráter social do SUS e o transformam e um balcão de negócios dos grandes barões da medicina, que tiram o direito da população de acessar uma saúde universal, pública e de qualidade para todos.

Os trabalhadores da saúde e os movimentos em defesa do SUS, por sua vez, defendem um Sistema Único de Saúde 100% público. A experiência dos últimos anos em São Paulo já tem mostrado que é impossível ter uma boa gestão com as OSS, que tiram proveito do sucateamento e da terceirização da saúde.

Para enfrentar esse quadro, os movimentos e o jornal A Verdade convocam os cidadãos que utilizam os serviços de saúde a participar ativamente dos conselhos gestores dos serviços do SUS, como as UBS, os CAPS e as Supervisões Técnicas de Saúde.

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