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sábado, 24 de agosto de 2024

“A UP está preparada para fazer a denúncia dos conchavos das elites”

O jornal A Verdade realiza entrevistas com os candidatos e candidatas da Unidade Popular (UP) às prefeituras das capitais brasileiras.

Rafael Freire | Redação


BRASIL – O jornal A Verdade inicia uma série de entrevistas com os candidatos e candidatas da Unidade Popular (UP) às prefeituras de capitais brasileiras. Trazemos Lenilda Luna, 57 anos, jornalista e servidora da UFAL, candidata em Maceió (AL). Também Luciano Schafer, 44 anos, militante do MLB, candidato em Porto Alegre (RS). Raquel Brício, 32 anos, trabalhadora portuária, candidata em Bélem (PA). E Ricardo Senese, 37 anos, metroviário, candidato em São Paulo (SP). Nesta primeira rodada, falamos sobre Brasil, os objetivos da UP nas eleições e sobre a realidade de cada cidade.

  1. Qual a avaliação da UP sobre a atual situação do povo brasileiro?

Ricardo Senese – Mais de 64 milhões de brasileiros vivem em insegurança alimentar, que é um nome menos duro pra fome. Isso mostra um grande sofrimento do nosso povo pra sobreviver. Uma classe trabalhadora que batalha muito pela sobrevivência, submetida a condições de trabalho muito precárias. Uma classe trabalhadora extremamente explorada. A precarização é a principal marca do trabalho no Brasil hoje. Nas grandes cidades, as pessoas levam muito tempo para chegar ao local de trabalho e já chegam cansadas.

Além disso, os salários são rebaixados e, após a Reforma Trabalhista do governo golpista de Michel Temer (MDB), aumentou o desemprego e a contratação sem carteira assinada. Jornadas de trabalho móveis, de acordo com os interesses dos patrões e que não garantem o salário integral ao final do mês.

Luciano Schafer – É isso que o companheiro trouxe: muita informalidade, ou seja, falta de direitos, e para quem tem carteira assinada, perda de direitos. E, em geral, um grave problema de moradia. O aluguel é uma forma de escravidão. As grandes cidades também são dirigidas pela burguesia. A burguesia que atua no mercado imobiliário tem muita força e, por isso, existe falta de moradia. Apesar de serem construídas cada vez mais casas e prédios, por um lado, o déficit de moradia cresce também, por outro.

Porém, o povo brasileiro está sempre disposto à luta. A prova disso é que, desde a pandemia, quando as condições de vida do povo pioraram muito, inclusive aqui no Rio Grande do Sul, aumentou a quantidade de ocupações de famílias sem-teto. É assim sempre quando vamos aos bairros mobilizar: as famílias entendem perfeitamente a luta por moradia e pelo socialismo, que nada mais é do que os trabalhadores decidirem seu próprio destino. E a luta, quando é bem organizada, traz muitas vitórias.

Raquel Brício – Essa questão da fome no Brasil é uma contradição muito triste, principalmente porque sabemos que nosso país é um dos maiores produtores e exportadores de alimentos do mundo. Mas essa produção não é destinada para alimentar o povo. Colocar a alimentação nas mãos do agronegócio é condenar nosso povo à fome. O setor da burguesia que atua no campo quer aumentar seus lucros e, se eles obtêm uma maior margem de lucro exportando, eles vão exportar. Por isso plantam tanto milho e soja para exportação, criam gado para o mesmo fim. Inclusive, todos os governos incentivam isso, mantendo nosso país com esse papel de exportador de alimentos, encarecendo os produtos no mercado interno, impedindo as famílias mais pobres de terem acesso ao mínimo necessário de alimentação. Precisamos também de uma alimentação saudável, livre de agrotóxicos, sem ultraprocessados.

Quero destacar também que a crise capitalista afeta toda a classe trabalhadora, mas especialmente as mulheres. O direito à alimentação, à moradia, ao trabalho, ao estudo são negados o tempo todo às mulheres, inclusive pela falta de creches para deixar os filhos. Esta é uma realidade para milhões de mulheres brasileiras.

BELÉM. Raquel é a candidata para enfrentar as oligarquias. Foto: JAV/PA
BELÉM. Raquel é a candidata para enfrentar as oligarquias. Foto: JAV/PA

Lenilda Luna – A questão ambiental tem tudo a ver com essa superexploração capitalista, já citada pelos companheiros. O povo brasileiro está refém dos interesses das multinacionais nas nossas riquezas. Então, o meio ambiente e nossos territórios estão sendo explorados de uma forma brutal, com muita ganância, sem nenhuma preocupação com a vida das pessoas e com a natureza. E é nesse solo contaminado onde plantamos e construímos nossas casas. E, claro, essa situação afeta mais a classe trabalhadora, que não tem como se deslocar para outras regiões.

Outra questão é que sempre aparecem oportunistas para tentar enganar o povo. Recentemente, foi Bolsonaro, com todo aquele discurso de que iria melhorar as coisas, mas só queria roubar joias. Apesar de termos derrotado esse fascista nas últimas eleições, no lugar veio a política de conciliação de classes, que, na prática, muda pouca coisa. Até alguns nomes do Governo Bolsonaro permanecem no Governo Lula. Então temos que nos mobilizar por mudanças efetivas, reais, que provoquem mudanças no sistema, não apenas no governo de plantão.

  1. Quais os principais objetivos da UP nessas eleições municipais?

Raquel – Um dos nossos objetivos nessas eleições é desmascarar o caráter de classe do fascismo. O fascismo ainda não foi derrotado em nosso país e, nessas eleições municipais, os candidatos fascistas vão disputar para tomar as gestões municipais para colocar em prática a sua política dos ricos, das elites. E é exatamente isso que eles escondem: vestem uma capa de moralidade, de Deus, Pátria e Família, mas escondem que o seu programa, que a sua política econômica, a sua política para as cidades e para o país, é uma política de retirada de direitos, de redução de serviços públicos ofertados à população, para manter e ampliar os privilégios dos ricos que financiam suas campanhas.

Ricardo – Queremos também valorizar as lutas do nosso povo. Têm surgido muitas lutas organizadas, greves, manifestações, ocupações. Como afirmou a companheira Raquel, essa luta contra o fascismo é fundamental e ela tem que ser o mais organizada possível. Porque o povo é maioria e o segredo está na organização. Essa questão do fascismo também está muito associada à militarização da sociedade, situação que estamos enfrentando aqui no Estado de São Paulo, com os projetos de privatização e militarização das escolas que o governador Tarcísio (amigo de Bolsonaro), tenta nos impor. É isso que eles querem como modelo de sociedade.

Luciano – Queremos acender a chama revolucionária em cada cidade. A denúncia é importante, mas precisamos apresentar soluções a partir das lutas. Os movimentos têm cumprido um papel fundamental na conjuntura nacional, e a Unidade Popular pode cumprir o papel de centralizar essas lutas radicalizando, construindo mais ocupações e mais greves, apontando para a construção do socialismo. O povo brasileiro tem plenas condições de gerir sua própria vida. Vamos crescer nossas fileiras, filiar muita gente nova, vender muito jornal A Verdade, para que, logo depois que passar o período eleitoral, fazer muita luta.

Lenilda – Essas elites fazem o jogo eleitoral, de direita. Num dia, são inimigas (de fachada), no outro, estão se confraternizando.  Porque os interesses são os mesmos, de explorar o povo. Então é muito importante isso que os camaradas já colocaram. E a UP está preparada para fazer essa denúncia. Aqui em Maceió, só nós iremos fazer essa denúncia. De um lado, está o atual prefeito, do PL, mesmo partido de Bolsonaro e ligado ao presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira. Do outro, o candidato do MDB, com uma vice também fascista, que atualmente é vereadora e chegou a apresentar um PL do Estupro na Câmara Municipal antes mesmo do PL apresentado no Congresso Nacional. E essa chapa será apoiada pelo PT…

MACEIÓ. Lenilda é a única candidata mulher e de esquerda. Foto: JAV/AL
MACEIÓ. Lenilda é a única candidata mulher e de esquerda. Foto: JAV/AL

Lenilda, Maceió sofre atualmente com um grave crime socioambiental provocado pela mineração desenfreada da empresa Braskem. Como a UP tem denunciado este caso e quais as consequências para o povo maceioense?

Esse crime da Braskem provocou o afundamento de cinco bairros de Maceió, gerando o deslocamento forçado de mais de 60 mil pessoas de suas casas. E, a cada capítulo, essa história só piora. Primeiro, porque as vítimas não sabem mais em quem confiar. O Ministério Público Federal, que deveria ter atuado em defesa das vítimas, acabou atuando como mediador de um acordo em que todas as vítimas são unânimes em dizer que foi favorável à empresa, principalmente aquelas pessoas em situação mais vulnerável.

Em troca de promessas de indenização, a Braskem se apropriou dos terrenos das casas das pessoas e está fazendo aterramento nas crateras que ela mesmo fez no subsolo ao longo de décadas, praticando mais um crime ambiental ao retirar toneladas de areia das praias para, literalmente, tapar buraco. A UP tem sido incansável nesta denúncia desde 2018, e sempre apoiando as mobilizações das famílias atingidas, pois ainda existem muitas questões pendentes nas indenizações, no amparo às vítimas. Neste processo eleitoral, vamos subir o tom das denúncias.

Luciano, como o partido tem enfrentado, especialmente em Porto Alegre, todo esse processo das enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul? Quem são os responsáveis e o que fazer para impedir novos crimes contra o povo e a natureza?

Nosso partido, desde os primeiros dias das enchentes, convocou os núcleos de militantes para organizarmos a rede de solidariedade. Quando conseguimos reunir todo mundo, decidimos visitar os abrigos para cadastrar as famílias atingidas, convocando para reunir nos núcleos do MLB. Depois, toda a militância da UP vestiu a camisa do MLB e foi para os bairros populares prestar solidariedade, levar alimentos, água e roupas, e fazer mais cadastros. Esse processo nos levou a organizar a Ocupação Sarah Domingues, inclusive com reforços de militantes vindos de outros estados, como Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro.

Além da solidariedade imediata, eu penso que a questão mais importante que apresentamos às famílias foi a luta, que só na luta podemos resolver nossos problemas, pois os governos sempre prometeram e nada aconteceu. Então nosso desafio agora é enfrentar os interesses da burguesia, da especulação imobiliária, que coloca o povo trabalhador pra morar nos piores lugares, que alagam. A Prefeitura não faz a devida manutenção das bombas de drenagem, das bocas de lobo, das galerias. Deixou parados milhões de reais nos cofres da Dmae e não fez essa manutenção, sucateando o departamento para vendê-lo com dinheiro em caixa. Ou seja, as privatizações e todo o dinheiro que deixou de ser investido foi para algum lugar. O atual prefeito Melo e as administrações anteriores têm culpa em tudo isso.

Raquel, Belém sofre, há várias décadas, com falta de infraestrutura, como moradia e saneamento. Como a UP se mobiliza para enfrentar esses problemas?

Belém vive esses problemas de infraestrutura porque a lógica da cidade ainda é a lógica de serviços privados. Transporte público operado pelos empresários que boicotaram a recente tentativa de licitação e seguem com o péssimo serviço para a população. Outro exemplo é a empresa Guamá Ambiental, que ganhou volumosos recursos para organizar o aterro sanitário, mas que, no final das contas, não passava de mais um lixão, cometendo vários crimes ambientais e causando muito transtorno para toda a população da Região Metropolitana, deixando Belém com lixo entulhado por longos períodos nas ruas da cidade.

A outra questão é da moradia, com mais de 80 mil famílias que não têm onde morar na nossa capital. E sabemos que há formas legais de resolver isso, inclusive, com previsão de expropriação de imóveis que se encontram abandonados, sem cumprir nenhuma função social, e que podem ser destinados para moradia popular. Neste sentido, temos que saudar a Ocupação Chico Mendes, realizada no Centro de Belém nos últimos dias, mobilizando famílias sem-teto para lutar por seus direitos.

O saneamento é outro ponto que precisa ser encarado com seriedade, pois investir no setor significa qualidade de vida e saúde para a população. Inclusive, para piorar ainda mais a situação, o governador do Estado Hélder Barbalho quer privatizar a companhia de água Cosanpa. Já vimos os casos desastrosos de privatização do setor elétrico e o povo de Belém vai lutar contra mais uma entrega do patrimônio público nas mãos dos monopólios capitalistas.

Ricardo, no Estado de São Paulo existe uma onda de privatizações (metrô, trens, escolas, empresa de água, etc.) e a UP tem se colocado na linha de frente da resistência. Como isso afeta a vida do povo paulistano?

A gente sente que é um barril de pólvora pronto pra explodir, porque é muita revolta do povo. Está todo mundo se sentindo oprimido e o nosso partido atua no sentido de desenvolver essa revolta para a construção de uma greve geral, com muita força, no momento certo. A vida está cada vez mais penosa, o povo cada vez mais massacrado. Na estação do Metrô, onde eu trabalho no atendimento ao público, percebo isso, a dificuldade das pessoas até em entrar no sistema para pagar sua passagem. Só para entrar no Metrô já é uma luta.

A UP, sim, está na linha de frente dessas lutas contra o Governo do Tarcísio de Freitas, aliado do atual prefeito da capital, Ricardo Nunes, a exemplo da aliança que eles selaram para privatizar a Sabesp, a companhia de água. Não teria como privatizar a empresa em nível estadual sem garantias de que a Câmara Municipal aprovaria também que a empresa fosse a leilão.

Sabemos que o Nunes deseja um segundo mandato para seguir nas privatizações na capital. Ele já privatizou os cemitérios e boa parte das escolas infantis, que foram para as mãos das chamadas Organizações Sociais. Não vamos deixar!

Matéria publicada na edição impressa nº 297 do jornal A Verdade.

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