Manifestação contra o fim da educação modular indígena expõe retrocessos nas políticas públicas, repressão policial e descaso do governo estadual com os povos originários.
Ayry Guará Porã Tupinambá
No final do ano passado, Hélder Barbalho e seus deputados aprovaram, na Assembleia Legislativa do Pará (ALEPA), o Projeto de Lei nº 10.820/2024, que, na prática, extingue o Sistema de Ensino Modular (SOME) e o Sistema de Organização Modular de Educação Indígena (SOMEI). Essas políticas públicas são essenciais para garantir o acesso à educação nas áreas do interior do estado, especialmente para os povos indígenas. A aprovação da medida ocorreu sob repressão a trabalhadores da educação e estudantes que lutavam contra esse retrocesso.
Em resposta a essa ação autoritária, diversos povos indígenas das regiões do Baixo e Médio Tapajós, Xingu e Alto Rio Guamá se organizaram e ocuparam a sede da Secretaria de Educação do Pará (SEDUC) no dia 14 de janeiro de 2025. Eles exigem a revogação dessas medidas e a garantia de professores nas escolas indígenas, já que o PL aprovado propõe a implementação de ensino remoto nas aldeias.
A Polícia Militar, sob o comando de Hélder Barbalho, reprimiu de forma violenta os povos indígenas que realizaram a ocupação. Na parte da manhã, impediram que as comunidades recebessem água, comida e outros mantimentos, além de cortar o fornecimento de água e energia elétrica da SEDUC como forma de retaliação ao protesto.
Governo do Pará é a favor do sucateamento das escolas indígenas e beneficia os latifúndios
Em entrevista ao Jornal A Verdade, Wender Tembé, liderança indígena do povo Tembé-Tenetehara da Terra Indígena do Alto Rio Guamá, destacou que a ocupação foi uma necessidade para defender o direito à educação escolar indígena. Ele denunciou o projeto de sucateamento das escolas indígenas, que frequentemente enfrentam a falta de professores e estrutura adequada. Wender criticou a postura do governador e do secretário de educação, afirmando que ambos ignoram as reivindicações das comunidades e dificultam o diálogo:
“O governador precisa parar de fingir que defende a Amazônia, que defende a floresta e os povos indígenas, enquanto apoia o agronegócio, a garimpagem, os madeireiros e não atende às reivindicações dos povos indígenas”, declarou.
No período da tarde, a ocupação continuou, mesmo com a intervenção do Ministério Público Federal (MPF). Hélder Barbalho e Rossieli Soares, secretário de educação do estado, não se pronunciaram sobre a situação dos povos indígenas, tampouco atenderam às demandas apresentadas ou encaminharam a revogação do PL que extingue a educação modular indígena.
Hélder Barbalho, cuja família possui milhares de hectares de terra no Pará, tem adotado uma postura sistemática de ataque aos povos indígenas e comunidades tradicionais desde o início de seu mandato. O governador mantém alianças com o agronegócio, latifundiários e grileiros, principais responsáveis pelos conflitos de terra no estado, e permanece omisso diante das reivindicações desses grupos.
Mesmo no ano em que Belém sediará a COP-30, o governo do Pará continua a atacar e retaliar os povos indígenas, posicionando-se contra o meio ambiente e a justiça climática. Não há justiça climática sem a garantia dos direitos dos povos originários, que são os principais responsáveis pela proteção de florestas, terras, rios e do ar, especialmente na Amazônia, onde o desmatamento, os incêndios e os conflitos por terra atingem níveis alarmantes. Os povos indígenas estão na linha de frente na defesa da natureza, combatendo o agronegócio, a mineração e os madeireiros.
O sistema capitalista tenta apropriar-se das terras e da natureza para mercantilizá-las, reservando seu acesso apenas à elite econômica. Esses ataques aos direitos dos povos indígenas fazem parte de um projeto maior de opressão e marginalização, com o objetivo de roubar suas terras.
A luta dos povos originários e a ocupação da SEDUC são ações fundamentais para barrar os retrocessos na educação no Pará, especialmente nas regiões interioranas. Essa luta busca assegurar um direito constitucional garantido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e pelo Decreto nº 6.861/2009, que regulamentam a organização da educação indígena nos territórios.
É essencial fortalecer essa mobilização para impedir qualquer retrocesso. Direitos são conquistados com luta, e a resistência dos povos indígenas diante da opressão não pode ser reprimida. A revogação imediata do PL 10.820/2024 é indispensável para garantir a soberania dos povos originários, sua autodeterminação e a preservação de suas culturas, saberes e cosmologias.