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segunda-feira, 7 de abril de 2025

Terceirização precariza assistência social e explora trabalhadores em São Paulo

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A terceirização da assistência social em São Paulo precariza serviços essenciais para a população e explora trabalhadores, resultando em atrasos salariais, instabilidade e más condições de trabalho. Essa política favorece o capital, fragiliza direitos e exige mobilização para uma assistência pública e de qualidade.

Willian Agulhão e Cleide Bezerra| São Paulo (SP)


A cidade de São Paulo, maior metrópole da América Latina, é marcada por profundas contradições sociais. Enquanto arranha-céus imponentes simbolizam a riqueza concentrada nas mãos de poucos, milhões de pessoas vivem em situação de vulnerabilidade extrema, dependentes dos serviços de assistência para garantir o mínimo necessário à sobrevivência. Esses serviços, que deveriam ser premissas do Estado para assegurar direitos fundamentais, foram progressivamente entregues à lógica privatista, por meio da terceirização e da transferência de responsabilidades para Organizações da Sociedade Civil (OSCs).

Essa estrutura, longe de ser uma solução para melhorar a eficiência dos serviços, revela-se um mecanismo de precarização que explora os trabalhadores e fragiliza a rede de proteção social. A terceirização da assistência social expõe profissionais a jornadas exaustivas, atrasos salariais constantes, demissões arbitrárias e a um ciclo permanente de insegurança. Enquanto isso, a população mais pobre é abandonada pelo poder público, que se exime de responsabilidades sob o pretexto de “parcerias” que, na prática, representam o desmonte dos serviços públicos.

Esse modelo não é apenas resultado de más gestões ou crises financeiras, ele é a manifestação de um projeto político que atende aos interesses do capital e utiliza a precarização do trabalho como estratégia de controle. Para entender e combater esse processo, é fundamental analisar as raízes da terceirização, os impactos sobre os trabalhadores e os caminhos possíveis para construir uma assistência social verdadeiramente pública e de qualidade.

Terceirização: atrasos e a crueldade sistêmica do capitalismo

A terceirização dos serviços públicos no Brasil, impulsionada nos anos 1990 sob o neoliberalismo, desmantelou direitos conquistados pela classe trabalhadora. Sob o pretexto de eficiência, a burguesia transferiu setores estratégicos à iniciativa privada, transformando direitos em mercadoria.

Em São Paulo, a assistência social foi um dos principais alvos, ficando sob controle de Organizações da Sociedade Civil (OSCs). Apesar de serem formalmente sem fins lucrativos, essas entidades dependem dos repasses da Prefeitura, que manipula esses recursos conforme interesses políticos. Com isso, trabalhadores enfrentam precarização e instabilidade, enquanto serviços essenciais são tratados como moeda de troca.

Os constantes atrasos nos repasses da Prefeitura governada pelo fascista Ricardo Nunes (MDB) não são simples falhas, mas parte de uma estratégia de exploração. Sem salários, vale-transporte ou alimentação, os trabalhadores terceirizados lidam com insegurança extrema. Essa política de abandono não é descaso, mas um mecanismo de dominação: quebrar a resistência operária pela fome e pelo medo, enquanto empresas contratadas lucram com a miséria da classe trabalhadora. A terceirização, vendida como modernização, na prática significa precarização sistemática.

A OSC FUNDAC é um exemplo dessa lógica perversa. Em 2020, uma auditoria revelou um desvio de R$54 milhões, prejudicando 250 funcionários. Mesmo após a denúncia, a Prefeitura de Bruno Covas (PSDB) manteve o contrato, forçando os trabalhadores a realizar greves para garantia dos pagamentos. As condições eram degradantes: “Trabalhei no CRAS Grajaú no verão, sem ventilador. Para não passar mal, eu e outra colega precisávamos molhar o corpo”, relata Joana*, entrevistadora social. Só após se recusarem a continuar é que trouxeram ventiladores.

Em março de 2023, os trabalhadores da FUNDAC paralisaram atividades diante de mais um atraso salarial. Apesar da pressão, os pagamentos não foram regularizados. “Nos prometeram pagamento até dezembro de 2024, mas o prazo passou e nada”, denuncia Joana. Mesmo com registros oficiais indicando repasses de mais de R$ 1,5 milhão à empresa, os trabalhadores seguem sem receber o que lhes é devido. Após a FUNDAC perder o contrato, a substituição pela ATSantos apenas intensificou a exploração, com redução de benefícios e justificativas fraudulentas para não pagar reajustes salariais.

O caso da OSC CEBASP reforça essa brutalidade. Após o rompimento do contrato, mais de 350 funcionários foram demitidos sem receber suas verbas rescisórias. Sem alternativas, os trabalhadores se organizaram via WhatsApp para pressionar OSCs e a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS). Como relata o orientador socioeducativo Thiago, “começamos a nos mobilizar sozinhos, porque ninguém nos dava respostas.” A luta coletiva fortaleceu a resistência contra o calote.

A pressão resultou em um feito inédito: a garantia do pagamento das rescisões. Em dezembro de 2024, os trabalhadores conquistaram a transparência da planilha de pagamentos, expondo o quanto lhes era devido. No entanto, muitos ainda não receberam, reféns de uma burocracia que protege a exploração. “Com a troca da equipe, os pagamentos ficaram travados na contabilidade, e seguimos cobrando”, afirma Thiago. A terceirização não só priva trabalhadores de direitos básicos como os torna descartáveis diante da máquina pública.

Esse sistema não visa apenas economizar, mas desmobilizar a luta de classes. Trabalhadores inseguros, sem direitos e isolados são mais fáceis de controlar. Enquanto isso, o Estado age como cúmplice, transferindo responsabilidades para entidades privadas que operam como intermediárias da exploração. O discurso de “modernização” esconde um projeto consciente de desmonte dos serviços públicos e enfraquecimento da classe trabalhadora.

A terceirização não é inevitável, é um projeto da burguesia para manter seu domínio. Enquanto aceitarmos esse modelo, o capital seguirá lucrando às nossas custas. Como bem resume Maria, trabalhadora do CRAS: “Se fôssemos funcionários diretos da Prefeitura, teríamos estabilidade, melhores salários e direitos garantidos. A terceirização nos trata como descartáveis.” A luta contra esse modelo é a luta pela dignidade da classe trabalhadora e pelo controle popular dos serviços públicos.

A força da classe trabalhadora combate a terceirização e o fascismo

O desmonte da assistência social não é apenas um reflexo da lógica neoliberal, mas parte de um projeto político mais amplo, que se alinha ao avanço do fascismo no Brasil. O fascismo moderno não se limita a violências explícitas ou discursos autoritários diretos, ele atua dentro das estruturas do Estado, corroendo serviços públicos e transformando direitos sociais em mercadoria ou caridade.

Ao precarizar os trabalhadores da assistência social, o Estado enfraquece a capacidade de resistência e converte o serviço em instrumento de controle. Trabalhadores exaustos e população vulnerável, mantida na dependência do assistencialismo, perpetuam a desigualdade. Essa fragmentação da classe trabalhadora é essencial para a sustentação do projeto fascista.

A terceirização e a precarização são ferramentas fundamentais nesse processo, rompendo vínculos de solidariedade e isolando os trabalhadores em contratos instáveis. Diante disso, a única saída é a organização coletiva, como demonstram as mobilizações autônomas dos trabalhadores da assistência social.

Porém, a luta não pode se restringir a demandas imediatas: é preciso exigir a reestatização completa dos serviços, com concursos públicos, salários dignos e condições de trabalho adequadas. Como já alertava Lênin em “O Estado e a Revolução” (1917): “Nenhuma classe opressora jamais deixou seu poder sem resistência.” A Prefeitura de São Paulo deve reassumir a gestão direta, garantindo que a assistência social seja pautada pela dignidade humana e não pela lógica mercantil.

Cleide, militante da Unidade Popular pelo Socialismo (UP) e do Movimento de Luta de Classes (MLC), relata a realidade dos trabalhadores da assistência social: profissionais dedicados, mas exaustos e desamparados. Ao apresentar as organizações, ela observa um “raio de esperança” entre aqueles que, embora temam represálias, encontram força na conscientização coletiva. “Minha luta é pela dignidade de toda a classe”, afirma Cleide, destacando a necessidade de união contra a exploração capitalista. Seu testemunho reforça que a mobilização é o caminho para enfrentar a terceirização, os cortes de verbas e a precarização, que transformam direitos em lucro.

A história mostra que a classe trabalhadora só conquistou direitos através da organização e da luta, como a jornada de oito horas, o SUS e a Previdência Social. Agora, é hora de resistir aos ataques da burguesia com greves, ocupações e fóruns populares que unam trabalhadores e usuários dos serviços.

A passividade não é uma opção: como ensinou Rosa Luxemburgo, “quem não se movimenta, não sente as correntes que o prendem”. A indignação deve virar ação, para garantir direitos plenos e erradicar a exploração. A combatividade e organização da classe trabalhadora é a chave para transformar a realidade e construir uma nova sociedade, justa e igualitária, a sociedade socialista.

*Para evitar represálias aos trabalhadores, o jornal A Verdade utilizou nomes fictícios.

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