MLB organiza 600 famílias em Diadema para lutar por moradia digna

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Ivanildo Silva Xavier é membro da coordenação do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) do Estado de São Paulo e milita no movimento na cidade Diadema, região do Grande ABC paulista. O MLB, movimento que tem como lema a luta pela Reforma Urbana e o Socialismo está organizado há cerca de cinco anos na cidade e tem se destacado por aglutinar centenas de trabalhadores e obtido conquistas. A Verdadeentrevistou Ivanildo, que falou sobre o início da organização do movimento e as vitórias conquistadas pelo MLB na cidade de Diadema.

A Verdade: Quando iniciou a luta do MLB por moradia em Diadema?
Ivanildo Xavier: Iniciamos a luta por moradia digna em janeiro de 2008, na cidade de Diadema. Antes, havíamos realizado manifestações e abaixo-assinados pela melhoria da Unidade Básica de Saúde do Bairro Eldorado. Diante das péssimas condições de habitação da imensa maioria dos moradores da cidade, percebemos que estava na hora de organizar uma ocupação.

Éramos apenas três quando começamos a chamar as pessoas para organizar a luta pela casa própria. Na época, eu trabalhava como garçom. Tinha uma hora de descanso por dia e eu aproveitava para me juntar aos outros companheiros. Nós saíamos panfletando e batendo de porta em porta, sem discriminar casa alguma, falando com todos, perguntando se moravam de aluguel, chamando para reunião.

A grande maioria das pessoas com que falávamos concordava de imediato com nossa luta, mas, algumas ficavam desconfiadas, achando que era algum tipo de golpe, e outras tinham medo ou até discordavam da ocupação. Íamos preparados para argumentar e convencer essas pessoas e, na maioria dos casos, conseguíamos.

A primeira reunião que fizemos contou apenas seis pessoas. Explicávamos sobre a necessidade de organizar a ocupação, falávamos da experiência do MLB em outros estados e todos saíam com o compromisso de trazer mais pessoas nas próximas reuniões. Em pouco tempo, tivemos que conseguir uma sala numa escola do bairro, pois já não cabia mais tanta gente onde fazíamos a reunião. Depois, percebendo que várias pessoas vinham de outros bairros, começamos a organizar núcleos fora do Eldorado, em dias diferentes. Assim, o movimento foi crescendo e se espalhando pela cidade.

Quais as principais manifestações organizadas pelo Movimento na cidade?

Em maio de 2008, realizamos nossa primeira manifestação, quando reunimos cerca de 100 pessoas. Foi um ato na Câmara de Vereadores e depois ocupamos a Secretaria Municipal de Habitação. Depois, realizamos a Ocupação Olga Benário. O objetivo era vencer a intransigência da Prefeitura, que ainda se negava a reconhecer o MLB como um movimento organizado na cidade. Assim, no dia 12 de outubro de 2008, ocupamos um terreno municipal com cerca de 300 famílias. Na madrugada, enfrentamos uma forte repressão. Mais de 200 policias nos cercaram e tentaram nos intimidar. As famílias resistiram bravamente e impediram que a policia entrasse no terreno. Foi uma experiência marcante para mim e para todos do movimento. Com o compromisso da Prefeitura de abrir as negociações e solucionar o problema da falta de moradia para nossas famílias, decidimos sair do terreno.

Depois dessa ocupação, o movimento só cresceu. No mesmo ano, em dezembro, realizamos a campanha nacional do MLB “Natal sem fome e sem exploração” e ocupamos dois supermercados para denunciar a carestia dos alimentos. Em 2009, diante da demora da Prefeitura em atender as famílias do Movimento, ocupamos uma praça no Centro da cidade. Quase 200 pessoas armaram suas lonas, e um fogão industrial foi colocado no meio da praça para garantir a alimentação das famílias. O Batalhão de Choque da Guarda Municipal foi acionado para tentar retirar nos retirar, mas permanecemos firmes no local. Com o fato, o prefeito foi obrigado a nos receber no mesmo dia e, dias depois, participou de uma assembleia com todos os núcleos do MLB, onde confirmou a participação do movimento nos projetos do programa federal Minha Casa, Minha Vida na cidade. No segundo semestre, ocupamos por três vezes a Câmara Municipal junto com outros movimentos para conquistar áreas para construção de moradias populares. Mais de 30 AEIS (Área Especial de Interesse Social) foram conquistadas.

No ano passado, realizamos duas ocupações na Prefeitura, em abril e maio, com o objetivo de cobrar mais agilidade no atendimento às famílias. Mas, nossa maior atividade foi a ocupação Lucinéia Xavier, em novembro de 2010. Mais de 500 famílias chegaram a ocupar o terreno. Durante uma semana, permanecemos no local. As famílias resistiram bravamente às fortes chuvas e às tentativas da Polícia de desocupar a área. Foi uma semana muito importante, em que comprovamos a força que o povo tem para lutar por uma vida melhor. Além das famílias que já estavam organizadas no MLB, todos os dias chegavam pessoas de várias regiões, que ficavam sabendo da ocupação através dos jornais. É importante ressaltar o nível de organização dessas famílias. Todos estavam conscientes da importância da luta e dificilmente alguém desrespeitava as regras do movimento, como a proibição do uso de drogas e bebidas alcoólicas e a necessidade de participar das assembleias diárias.

Também, participamos das plenárias do Orçamento Participativo (OP) de vários bairros da cidade, elegendo cinco companheiros para o Conselho do OP. Além disso, elegemos um companheiro para o Conselho do Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social.

Em março desse ano, realizamos uma nova manifestação para cobrar mais agilidade da Prefeitura nos compromissos assumidos após a ocupação Lucinéia Xavier, denunciar a burocracia da Caixa Econômica Federal na liberação de recursos para construção de moradias populares e exigir mais investimentos do Governo do Estado na cidade. Cerca de 200 pessoas fizeram uma caminhada pela cidade e até barricadas foram erguidas em três pontos. Fizemos um ato na frente de uma agência da Caixa e depois fomos recebidos pelo secretário de Governo da Prefeitura. A repercussão foi muito grande.

Que vitórias o movimento conseguiu até agora?

Cada luta que fazíamos conquistava alguma coisa. Com a ocupação Olga Benário, conseguimos abrir um canal de negociação e ser reconhecidos pela Prefeitura, além do compromisso em viabilizar projetos que atendessem as famílias do movimento. Após a ocupação da praça em 2009, garantimos a confirmação de que o MLB seria um dos movimentos atendidos no Minha Casa, Minha Vida. Com as duas ocupações na Prefeitura no ano passado, foi montada uma comissão de integrantes do movimento e técnicos da Prefeitura para analisar os terrenos da cidade viáveis para a construção das moradias do MLB, indicando uma área particular na Zona Sul da cidade. Com a ocupação Lucinéia Xavier, conquistamos a verba para a desapropriação da área. Com a manifestação do último mês de março, confirmamos que a verba já está disponível e garantimos mais agilidade para a desapropriação da área.

Mas, a vitória mais importante que conseguimos foi a expansão do movimento e o aumento da consciência dos nossos militantes. A cada luta que fazemos, nossas famílias ficam mais unidas e decididas a lutar por seus direitos e pela sociedade socialista.

Como o MLB se organiza na cidade e o que se discute nas reuniões?

O MLB se organiza em núcleos, que se reúnem semanalmente. Em Diadema, temos seis núcleos nos bairros do Eldorado, Inamar, Serraria, Ruyce, Campanário e Jardim das Nações, atingindo todas as regiões da cidade. Temos ainda dois núcleos em processo de formação nos bairros Gazuza e Canhema.

Hoje, reunimos cerca de 600 famílias. Nas reuniões discutimos não somente o andamento das lutas locais, mas também falamos das lutas que ocorrem em outros lugares do Brasil e no mundo. No início de cada mês, sempre lemos as principais matérias publicadas no jornal A Verdade. Mostramos sempre que o caminho para se conquistar direitos é a organização e a luta, e que essa luta deve levar a uma nova sociedade, a sociedade socialista. Os núcleos do MLB são não só instrumento de mobilização e organização, mas também de formação política dos nossos militantes.

Quais os principais problemas dos moradores de Diadema?

Um dos graves problemas enfrentados por boa parte das famílias que residem em Diadema é ausência de moradia de qualidade. Construída através de um intenso processo de ocupação irregular do solo, moradias irregulares e em áreas de risco são uma realidade muito presente. Um grave problema é a coabitação. Diadema possui a segunda maior densidade demográfica do país, ou seja, várias famílias moram numa mesma residência, geralmente muito pequena. Segundo a prefeitura, o déficit habitacional da cidade é de mais de 10 mil unidades.

Com as lutas dos movimentos de moradia, muita coisa mudou. Moradias populares foram construídas e muitas regiões da cidade foram urbanizadas. Entretanto, há anos que não são construídas um grande número de moradias na cidade para atender as famílias com renda de zero a três salários mínimos. A especulação e o mercado imobiliário também são muito fortes. Várias áreas que poderiam abrigar milhares de famílias ficam vazias, e outras estão servindo para a construção de edifícios para as classes ricas. A burocracia da Prefeitura, do Governo do Estado e da Caixa Econômica é enorme. Até hoje, por exemplo, nenhum projeto do Minha Casa, Minha Vida em Diadema saiu do papel. Por isso, só nos resta a luta.

Roberto Luciano, São Paulo