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quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

Educação pública vai mal e professores vão à luta

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A situação que atravessa a educação brasileira não é novidade para ninguém. Violência física e verbal contra professores, funcionários das escolas e estudantes; baixos salários, jornadas extensas de trabalho; superlotação de salas de aula; falta de material pedagógico; autoritarismo de algumas direções; inexistência de planos de carreira e de concursos públicos; grades e mais grades, que fazem das escolas não espaços agradáveis e que favoreçam a aprendizagem, mas espaços que mais se parecem com prisões. Estes são alguns dos problemas que enfrenta a escola pública atualmente.

Para que se possa educar com qualidade, o professor precisa conhecer sua turma, conhecer os estudantes, planejar aulas que façam parte da realidade com a qual trabalha. Além disso, a escola precisa oferecer uma série de materiais pedagógicos para que isso se torne possível: computadores, acesso à internet, som, projetor etc. No entanto, isto é um sonho distante para a maioria das escolas e educadores brasileiros.

Além de uma rotina estressante, o fato de muitas vezes não conseguir ensinar, devido à enorme precarização do seu trabalho, causa uma profunda frustração neste profissional. Este se formou para educar, para ensinar e, quando não consegue realizar o que seria sua tarefa principal, adoece. No Estado de São Paulo, segundo pesquisa realizada pela Apeoesp (Sindicato dos Professores do Estado de São Paulo), todos os dias, cerca de 20 professores se afastam do trabalho devido a doenças adquiridas, causadas principalmente pelas jornadas extensas, barulho e frustração. Doenças como depressão, estresse, síndrome do pânico e de burnout atingem um número cada vez maior de professores. Ainda segundo a Apeoesp, 46% dos professores paulistas sofrem de estresse; e, no Espírito Santo, de acordo com o     Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Espírito Santo (Sindiupes), até outubro cerca de 700 professores haviam se licenciado devido a problemas de saúde.

Ao mesmo tempo, a iniciativa privada invade as escolas públicas, transvertidas de “parceiros da educação”. ONGs como os Amigos da Escola e Todos pela Educação são alguns dos exemplos. Bancos, grandes indústrias e construtoras estão entre os patrocinadores como, por exemplo, Santander, DPaschoal, Unibanco, HSBC, Camargo Correa, Odebrecht, Itaú Social, Gerdau, Fundações Bradesco, Suzano papel e celulose.

É uma estranha lógica: o Estado paga a essas empresas os juros e as tais amortizações de dívida, enquanto eles “investem” em educação e são agraciados com as isenções de impostos. O dinheiro público investido em iniciativa privada e a iniciativa privada “ajudando” as escolas que sofrem com falta de investimento público.

Este ano, a União deixará de arrecadar R$ 116,1 bilhões isentando ou reduzindo tributos de empresas. Tamanha generosidade do governo representa mais que o dobro do orçamento do Ministério da Educação. Ora, a educação é um direito previsto na Constituição. Esta deve ser, portanto, uma obrigação do Estado. Isso significa que a riqueza produzida pelos trabalhadores brasileiros faz bancos e capitalistas enriquecerem cada dia mais, enquanto seus filhos e filhas e seus educadores amargam uma triste realidade escolar.

Mas por que as coisas são assim?

Investir em educação não parece ser, como mostram os dados, interesse do Estado. Como bem escreveu Lênin, no livro O Estado e a Revolução, o Estado é o aparelho de dominação de uma classe sobre a outra. Desta maneira, vivendo sob o capitalismo, o Estado é o aparelho de dominação da burguesia sobre os trabalhadores. A burguesia utiliza-se das mais variadas formas de oprimir e explorar os trabalhadores para conseguir se manter no poder e uma dessas formas é o que faz com a educação pública.

Uma juventude que receba uma educação de qualidade, na qual aprenda a pensar criticamente, a questionar a situação na qual vive, não é o interesse dos patrões. Imaginem se todos os trabalhadores se dessem conta de que, enquanto recebem míseros salários, seus patrões enriquecem às suas custas? Imaginem se os jovens aprendessem na escola toda a história de luta de nosso povo contra as injustiças; toda a história de luta da juventude?  Por isso não é natural encontrarmos a educação nesta situação. É intencional privilegiar o interesse de meia dúzia de capitalistas e reservar pouquíssimo do orçamento público para a educação. É intencional que tenhamos milhares de analfabetos e jovens abandonado os bancos escolares.

A Lei do Piso

A lei do piso – Lei nº 11.738 – foi aprovada em 2008, devendo entrar em vigor em janeiro de 2009. Tem vigência nacional, ou seja, deve ser cumprida por todos os Estados brasileiros. Ela prevê um piso salarial mínimo de R$ 1.187 aos professores da educação básica pública para 40 horas semanais, reajustáveis anualmente, e determina que ao menos 33% de sua jornada seja cumprida em atividades extraclasse. Este tempo fora da sala de aula deve ser destinado ao preparo de aulas, correção de provas e trabalhos e à formação do profissional.

A lei, no entanto, passou por alguns percalços. Apenas em abril deste ano a Suprema Corte julgou constitucional o dispositivo que vincula o piso aos vencimentos iniciais da carreira docente.  Entre 30 de abril de 2009 e 24 de agosto de 2011 esteve suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal, sendo questionada a jornada extraclasse e, a partir da última data, a validou em definitivo, reconhecendo que “é constitucional a norma geral federal que reserva o percentual mínimo de 1/3 da carga horária dos docentes da educação básica para dedicação às atividades extraclasse”.

Lei efetiva é lei que se cumpre. Porém, segundo pesquisa realizada pela Folha de S.Paulo  (em 16 de novembro de 2011), a lei nacional do piso do magistério não é cumprida em pelo menos 17 Estados. Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pará e Bahia são os campeões em não cumprimento da lei: os salários dos docentes estão abaixo do estipulado e sua jornada extraclasse é menor do que a que a lei determina. Segundo a Unesco, os professores brasileiros têm o pior salário, quando comparado a 32 países de economia comparável à do Brasil.

A resposta dos professores

Milhares de professores, trabalhadores de escolas e estudantes foram às ruas este ano protestar contra essa situação, dando uma verdadeira aula a todos aqueles que dizem que nosso povo é acomodado. Suas salas de aulas foram transferidas para as avenidas de mais de uma dezena de capitais brasileiras e não apenas os estudantes, mas todos os trabalhadores brasileiros puderam aprender a lição que tinham para ensinar: a educação pública está mal e somente a luta pode salvá-la. Essa lição foi ensinada sem giz e com muita combatividade.

Os Estados do Ceará, Goiás, Bahia, Espírito Santo, Sergipe, Santa Catarina, Minas Gerais, Mato Grosso, Rio Grande do Norte, Paraná, Rio de Janeiro, Amapá e Pará realizaram greves em 2011. Isso sem falar nas inúmeras paralisações e manifestações não apenas nestes, mas em praticamente todos os Estados brasileiros. A bandeira comum foi a implementação da lei do piso e condições dignas de trabalho. Reivindicavam a implementação da lei, simplesmente isto. Enfrentaram tropa de choque, as difamações da grande mídia burguesa, a truculência dos governos estaduais e punições das mais diversas simplesmente porque exigiram que uma lei fosse cumprida.

No Ceará, onde um professor de nível médio tem salário-base de R$ 739,84 por uma jornada de 40 horas semanais, a greve durou 63 dias apesar da forte repressão do batalhão de choque aos professores. No Rio Grande do Norte, os professores após uma grande luta conquistaram 34% de reajuste salarial.

Os professores mineiros ficaram 112 dias de braços cruzados. Realizaram passeatas e greve de fome.  Seu salário estava abaixo do piso e o governo também não tinha demonstrado a intenção de cumprir a parte da lei do piso referente à jornada de trabalho. O governador Anastasia negou-se a negociar com os grevistas e financiou com dinheiro público propaganda na televisão contra a greve e contra os professores.

Professores cariocas, em uma greve que durou dois meses, também realizaram passeatas e um acampamento em frente à Assembleia Legislativa. Ao final, algumas conquistas importantes foram alcançadas, como o descongelamento do Plano de Carreira dos Funcionários Administrativos, embora o reajuste para os professores tenha sido de apenas 5%.

No Pará, a Secretaria de Educação contratou professores em regime temporário para furar a greve. Esta greve, como tantas outras, foi considerada abusiva pela justiça, que também estabeleceu multa para o sindicato.

Em Mato Grosso, mais de 50% da categoria possui contrato temporário. No Rio Grande do Norte, antes da greve os professores recebiam R$ 664,33 por uma jornada de 30 horas semanais, segundo dados do próprio governo.

Em Santa Catarina o piso salarial dos professores de nível médio era de R$ 609,46 e de R$ 993,12 para professores de nível superior, segundo dados informados pela Secretaria de Educação deste Estado, para uma jornada de 40 horas semanais.

No Espírito Santo, além dos professores da educação básica, educadores do Instituto Federal cruzaram os braços com apoio dos estudantes, e, em São Paulo, os trabalhadores do Centro Paula Souza também ficaram um mês em greve.

Educação pública e gratuita

A lei do piso, embora não resolva o problema da educação pública brasileira, se aplicada ajudaria a minorar o caos da educação, pois elevaria os salários dos professores.

A educação pública precisa de mais investimentos. Portanto, apenas dizer que se defende 10% do PIB para educação não ajuda. É preciso que se mostre de onde esses recursos devem ser retirados. Ou seja, da enorme fatia que vai para o pagamento da dívida pública, para o pagamento de juros a bancos e grandes empresas. Segundo a Auditoria Cidadã da Dívida, em 2010, enquanto 44,93% do PIB brasileiro foi utilizado para o pagamento de juros, amortizações e refinanciamento da dívida pública, apenas 2,89% foram destinados à educação. Em 2011, o Orçamento-Geral da União foi de R$ 1, 4 trilhão e, no entanto, o investimento em educação não aumentou.

Além disso, os professores, todos os trabalhadores da escola, comunidade e os estudantes são quem devem decidir como a escola deve ser. Como querem aprender e o que necessitam aprender e ensinar.

Por tudo o que foi dito a luta não é e não pode ser apenas dos trabalhadores da educação. A luta em defesa da educação pública é a luta contra as privatizações. É a luta pelo direito à greve. É a luta pelo direito que os milhões de jovens têm de receber uma educação de qualidade e os educadores de ter condições dignas para realizar tal tarefa. É a luta em favor de que o dinheiro público, o dinheiro que é fruto da riqueza produzida por trabalhadores e trabalhadoras, seja usufruído por estes e utilizado em suas necessidades básicas, como saúde e educação.

Carolina Vigliar, São Paulo

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