No dia 13 de agosto, foram divulgados os dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que é a forma utilizada pelo Governo para avaliar o nível de aprendizado dos estudantes de nível fundamental (do 1º ao 9º ano) e de nível médio (da 1ª à 3ª série). Através do Ideb, apenas dois aspectos quantitativos do nível de aprendizagem são considerados: a taxa de aprovação e a pontuação atingida em um teste de português e matemática (os testes são a Prova Brasil e o Saeb, aplicados obrigatoriamente a cada dois anos para os estudantes do 5º e 9º anos do ensino fundamental e 3ª série do ensino médio).
O resultado do Ideb é desanimador do próprio ponto de vista governamental, pois as metas estabelecidas, por si só muito subestimadas, não foram atingidas em grande parte dos estados, e muitas escolas chegaram mesmo a diminuir seus índices. Mas a situação é ainda pior, pois o Ideb retrata de maneira bastante limitada o atual quadro da educação, não levando em conta aspectos centrais como a situação de infraestrutura das escolas (bibliotecas, quadras esportivas, laboratórios, computadores, merenda escolar, etc.); a formação dos professores e suas condições objetivas de desenvolver o projeto político-pedagógico; a democracia, a gestão participativa e a violência no interior da escola; e o número de estudantes por sala de aula.
A resposta do Ministério da Educação aos baixos índices do Ideb assina o atestado de falência da educação pública brasileira. Segundo o ministro Aloizio Mercadante, o problema é o excesso de matérias no ensino médio (13, atualmente). No dia 15 de agosto, Mercadante declarou: “É uma sobrecarga muito grande. Não contribui para formar melhor o aluno”. Ou seja, já que o Estado não é capaz de educar, diminui a quantidade de conteúdos. Provavelmente o ministro esteja se referindo àqueles que contribuem para uma formação mais crítica como filosofia, sociologia ou história, por exemplo.
O nível de aprendizagem do estudante de escola pública é completamente desproporcional à situação econômica atual do Brasil. Sendo a 6ª maior economia do mundo, com uma produção anual de riquezas da ordem de R$ 4,143 trilhões, nada justifica a escola pública brasileira ensinar tão pouco e educar tão mal. A escola brasileira ensina menos do que em outros países da América Latina que têm uma situação econômica muito pior que a brasileira, como Chile, Bolívia, Venezuela e Argentina.
Aos péssimos números do Ideb, não podemos deixar de somar os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que indicam que 14,1 milhões de brasileiros são analfabetos, e que 20% da população (um em cada cinco brasileiros) têm menos de quatro anos de estudo e entram no cálculo na qualidade de analfabetos funcionais.
A interpretação dos dados do Ideb é agora objeto de disputa na sociedade. A entidade que se autodenomina “Todos pela Educação” e é mantida, entre outros, pelos bancos Itaú, Bradesco e Santander, e tem a Rede Globo e a Editora Abril como seus principais porta-vozes, procura ressaltar os exemplos que comprovam que o prêmio ao mérito e a transformação das escolas em organizações sociais geridas pelo trabalho voluntário em “parceria” com empresas privadas melhoram os índices do Ideb. Chega a ser ridículo sugerir que a solução para a educação está em fazer um trabalhador que fica no emprego muitas vezes dez horas e enfrenta outras duas se deslocando ainda tenha que ir à escola do filho pintar um muro, consertar uma cadeira ou dar aulas voluntariamente.
Mais grave é a afirmação de que o problema da educação pública não é a falta de dinheiro, mas a incapacidade do ente público de gerir o dinheiro investido. O que os bancos e demais capitalistas defendem, através da entidade “Todos pela Educação”, é a privatização da escola pública, entregando sua gestão a organizações sociais privadas (da mesma maneira que se está fazendo com postos de saúde e hospitais país afora); a contratação de professores e funcionários através de terceirizadas; a decisão do projeto político-pedagógico a partir dos interesses dos capitalistas e não da sociedade; e a premiação daquelas escolas que tenham maior mérito (a chamada meritocracia), criando, na prática, ilhas de excelência enquanto a massa das escolas permanece com escassos investimentos e sem oferecer solução à educação de milhões de jovens.
É preciso reafirmar que implantar uma escola pública, gratuita, para todos e todas, democrática, laica e de qualidade referenciada no trabalho é possível e necessário. Os movimentos sindical, estudantil e todos que lutam por essa bandeira precisam participar dessa disputa na sociedade, defendendo questões que são de princípio e não podem ser negociadas.
Primeiro. A educação precisa, sim, de mais investimentos, e o Brasil deve investir, imediatamente, 10% de seu PIB em educação. Enquanto o governo federal nega aumento salarial a professores e funcionários das universidades federais e os professores do Estado da Bahia estão há mais de cem dias em greve por dignidade na profissão, mais de 50% do orçamento federal é jogado no lixo através do pagamento dos juros da dívida pública. Os novos recursos para a educação devem, prioritariamente, tornar digna a profissão do professor, remunerando-o de maneira adequada e dando-lhe condições de trabalho. Devem, também, reduzir o número de estudantes por sala de aula, transformando a classe em um ambiente que permita o desenvolvimento da educação com o acesso às novas tecnologias.
Segundo. A gestão da educação brasileira, em todos os seus níveis, deve ser pública e a qualidade na educação deve ter como referência o trabalho, o desenvolvimento e a soberania do país. É necessário aperfeiçoar os instrumentos de controle popular sobre os recursos da educação, transformar em crime hediondo os desvios de verba dessa área e fortalecer a gestão democrática em cada sistema de ensino através dos diferentes conselhos.
Terceiro. É possível, sim, oferecer educação de qualidade a todos e todas. O Plano Nacional de Educação, que está em discussão no Congresso Nacional, precisa assumir metas condizentes com as potencialidades do Brasil. É preciso zerar o analfabetismo, acabar com o abandono no ensino médio e fundamental, oferecer vagas para todos e todas no ensino infantil, superior e, também, no ensino técnico. O problema da educação não será resolvido com algumas escolas de excelência, mas sim elevando o nível geral de qualidade de todo o sistema de ensino, o que só é possível, evidentemente, investindo-se 10% do PIB em educação.
A aprovação, em uma das Comissões da Câmara, do investimento de 10% na educação mostra que é possível lutar e conquistar no momento atual. Sigamos os exemplos da juventude chilena e transformemos a educação em uma bandeira que mobilize toda a sociedade para que o país possa dar um passo seguro no sentido de vencer o atraso e a submissão que marcaram nossa história nos últimos séculos.
Redação SP