Em 16 de setembro de 1973, era assassinado pela ditadura de Pinochet o cantor, compositor, diretor de teatro e comunista Victor Lidio Jara Martínez. Victor foi precursor da chamada “Canção Nova”, movimento cultural que pretendia resgatar a cultura latino-americana em uma época na qual a cultura Pop dos EUA invadia todos os países do mundo.
Victor, profundo estudioso do folclore e das tradições de seu país, exerceu grande influência na cultura chilena. Desempenhou grande papel na eleição de Salvador Allende em 1970, que traria mudanças profundas ao país. Allende, presidente eleito democraticamente, foi derrubado por um golpe militar apoiado pela CIA, que colocou no poder o fascista general Augusto Pinochet.
Em 1998, Joan Jara, viúva de Victor, lançou o livro “Canção Inacabada: a vida e a obra de Victor Jara”, que narra, além de sua vida e origem de sua obra grandiosa, a visão de quem viveu os turbulentos dias que precederam o golpe e a convicção inabalada de Victor Jara, membro do Partido Comunista Chileno, no socialismo e na força do povo. Leitura obrigatória para quem deseja se aprofundar nesse momento tão importante para a história da América Latina, seja no âmbito cultural ou politico.
Em 2013, completam-se 40 anos da imortalidade de Victor Jara, como também lembramos no Brasil a imortalidade de Manoel Lisboa, fundador do PCR, assassinado em 4 de Setembro de 1973. Assim como Manoel, Victor Jara deixou seu legado para nossa geração, como seu último verso, escrito no estádio do Chile, enquanto ele tentava acalmar seus companheiros, afirmando que tudo ficaria bem. Os versos não foram completados, mas nem por isso deixam de ter sua força e beleza:
“Somos cinco mil
nesta pequena parte da cidade.
Somos cinco mil.
Quantos seremos no total,
nas cidades e em todo o país?
Somente aqui, dez mil mãos que semeiam
e fazem andar as fábricas.
Quanta humanidade
com fome, frio, pânico, dor,
pressão moral, terror e loucura!
Seis de nós se perderam
no espaço das estrelas.
Um morto, um espancado como jamais imaginei
que se pudesse espancar um ser humano.
Os outros quatro quiseram livrar-se de todos os temores
um saltando no vazio,
outro batendo a cabeça contra o muro,
mas todos com o olhar fixo da morte.
Que espanto causa o rosto do fascismo!
Colocam em prática seus planos com precisão arteira,
sem que nada lhes importe.
O sangue, para eles, são medalhas.
A matança é ato de heroísmo.
É este o mundo que criaste, meu Deus?
Para isto os teus sete dias de assombro e trabalho?
Nestas quatro muralhas só existe um número
que não cresce,
que lentamente quererá mais morte.
Mas prontamente me golpeia a consciência
e vejo esta maré sem pulsar,
mas com o pulsar das máquinas
e os militares mostrando seu rosto de parteira,
cheio de doçura.
E o México, Cuba e o mundo?
Que gritem esta ignomínia!
Somos dez mil mãos a menos
que não produzem.
Quantos somos em toda a pátria?
O sangue do companheiro Presidente
golpeia mais forte que bombas e metralhas.
Assim golpeará nosso punho novamente.
Como me sai mal o canto
quando tenho que cantar o espanto!
Espanto como o que vivo
como o que morro, espanto.
De ver-me entre tantos e tantos
momentos do infinito
em que o silêncio e o grito
são as metas deste canto.
O que vejo nunca vi,
o que tenho sentido e o que sinto
fará brotar o momento…”
(Victor Jara, Estádio do Chile, Setembro 1973)