Depois das gigantescas manifestações de junho e julho, em que milhões de trabalhadores foram às ruas conquistando a redução do preço das passagens, a frase “Quem luta conquista” passou a ter mais força em nosso País. Essa realidade influenciou milhares de famílias de baixa renda da Região Metropolitana de Belo Horizonte, que resolveram não ficar esperando os inexistentes programas habitacionais de prefeituras e governos e foram à luta pelo direito humano de morar dignamente.
No fim do mês de julho, famílias de sete comunidades (Eliana Silva, Camilo Torres, Irmã Dorothy, Helena Greco, Cafezal, Dandara e Rosa Leão), organizadas pelo Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) e pelas Brigadas Populares, realizaram uma histórica ocupação da Prefeitura de Belo Horizonte, reivindicando a regularização de suas comunidades, ligação de água, energia elétrica, esgoto e títulos de posse. As famílias foram recebidas pelo prefeito Márcio Lacerda, que, pressionado, foi obrigado a se comprometer com as reivindicações dos movimentos. A repercussão foi nacional e, no Estado de Minas Gerais, acabou sendo outro fator impulsionador para milhares famílias sem teto se mobilizarem.
Aumentam as ocupações urbanas
A Ocupação Rosa Leão, situada na Mata do Isidoro cresceu e passou a contar com cerca de 1.500 famílias. Outras duas ocupações surgiram perto de Rosa Leão: a Ocupação Vitória, com mais de quatro mil famílias, e a Ocupação Esperança, com mais de 2.500, totalizando mais de oito mil famílias nessa mesma região. Em Contagem, cidade da Região Metropolitana de BH, além da ocupação Guarani-Kaiowá (Brigadas Populares), com 150 famílias, em outubro, surgiu a Ocupação Wilian Rosa (Movimento Luta Popular), com mais de quatro mil famílias. Outras milhares de famílias vêm se mobilizando em cidades como Betim, Ribeirão das Neves e Santa Luzia. Segundo levantamentos realizados pelo MLB, Comissão Pastoral da Terra (CPT) e pela Rede Nacional de Advogados Populares (Renap), essas ocupações urbanas realizadas nos últimos meses, somadas as já existentes e não regularizadas, somam mais de 20 mil famílias.
Cresce a repressão
No entanto, esses milhares de famílias sofrem com a falta de políticas públicas e programas de habitação, e também com a enorme repressão promovida pela Polícia Militar a mando das prefeituras e do Governo Estadual. A PM, com total apoio das gestões municipais, vem utilizando diversas táticas de guerra contra essas famílias pobres, como o emprego de cavalaria, cachorros, batalhão de choque, grupo de ação tática especial, helicópteros, tratores, incêndio de barracas, destruição de pertences das famílias e até o uso do Caveirão (tanque blindado da PM). “Infelizmente, apesar de existir uma ponderação do Estado, afirmando que é ineficaz a desocupação forçada de famílias, uma vez que o que vai resolver é uma política de reforma agrária e urbana, a PM vem agindo de forma truculenta, em casos pontuais com abuso de poder”, destacou o advogado popular Élcio Pacheco, da Renap.
Exemplos que confirmam essa afirmação são o despejo violento da Ocupação Eliana Silva, em maio de 2012, quando 350 famílias foram removidas de um terreno na região do Barreiro, em BH; e o despejo de 150 famílias, ocorrido no último dia 25 de outubro, de uma ocupação que nem sequer tinha nome ainda, situada ao lado da Vila Corumbiara, também na região do Barreiro. Nesse último, a Polícia Militar, juntamente com a prefeitura de BH, realizou um despejo ilegal, pois não havia sequer ordem judicial. Em mais uma operação de guerra contra o povo pobre, foram presas sete pessoas. “A Polícia vem agindo como verdadeiros capitães do mato, jagunços fardados, deixando de ser funcionários públicos para agir fora da lei, humilhando as pessoas a serviço do capital”, afirmou Frei Gilvander, da CPT.
Luta e avanços
Diante de tamanhas injustiças, duas declarações são importantes para exemplificar os sentimentos experimentados pelas famílias moradoras dessas ocupações: “Meu filho é cego. Entramos na ocupação porque não suportamos mais sobreviver em um único cômodo, cedido de favor. A gente estava almoçando na barraca e, de repente, bombas começaram a explodir ao lado, que era já nossa casa, esperança de uma vida nova. Foi um sufoco enorme ter que fugir correndo com meu filho cego sob tiros e gritaria. Meu filho e eu temos direito de viver em paz. Como se pode fazer isso também com uma criança cega?”, disse Dona Maria Neuza Barbosa, moradora despejada da ocupação no Barreiro. Mas também importantes avanços vêm sendo registrados por algumas ocupações, fruto das diversas manifestações promovidas pelos moradores da Ocupação Eliana Silva. Com participação das Ocupações Irmã Dorothy e Camilo Torres, organizadas pelas Brigadas Populares, uma comissão composta pela Copasa (companhia de saneamento), Cemig (companhia de Energia), Ministério Público e Prefeitura visitaram essas ocupações para fazer levantamentos iniciais sobre as ligações de esgoto, água e energia elétrica. O levantamento foi bastante positivo: “Os técnicos constataram o que o movimento já diz há muito tempo: é possível ligação oficial de água, luz e esgoto e a regularização de nossa ocupação; vamos aumentar nossa luta até resolver esse problema”, afirmou Poliana Souza, da Coordenação do MLB.
Leonardo Pericles, Belo Horizonte