As classes dominantes do Brasil, a grande burguesia nacional em associação com a burguesia internacional e um punhado de parasitas do campo que exploram a terra e espoliam os camponeses pobres têm memória curta quando o que está em jogo é a defesa de seus interesses de classe, e, em particular, a propriedade privada dos meios de produção.
É o que se conclui ao analisar o caso do ex-homem mais rico do Brasil e ex-sétimo do mundo, o empresário Eike Batista, pai do playboy Thor Batista, que ao dirigir seu carro em alta velocidade na rodovia BR-040, matou o trabalhador Wanderson Pereira de Souza, que voltava do trabalho numa bicicleta, em março de 2012.
Até pouco tempo, Eike Batista era saudado como a grande evidência de que os burgueses brasileiros são portadores do chamado “espírito animal” do capitalista, ou seja, de ousadia, obstinação, arrojo, coragem para assumir riscos e espírito de realização e inovação. Eike, além de ser um membro dessa espécie, era um novo rei Midas¹, pois tudo que tocava virava ouro.
Por duas vezes, ao lado de ministros, governadores, empresários e da presidenta da República, Batista recebeu da revista Carta Capital o prêmio de “executivo mais admirado do Brasil’, Em 2008, ele estava na 142ª posição do levantamento da revista Forbes com uma fortuna de R$ 13,2 bilhões. Cinco anos depois, em 2012, com R$ 60 bilhões pulou para a 7ª posição.
Suas extravagâncias e exibições de luxo inútil, como a de ter em sua sala de jantar um automóvel de luxo ou de fretar um Boeing para trazer um cachorro da Alemanha com o qual diz conversar em alemão, embora, obviamente, o cachorro responda na linguagem universal dos cães, eram motivos de inveja por seus pares e exemplos da máxima burguesa de “Poder não é pra quem quer, é pra quem pode”.
Participando desse coro, Dilma Roussef, presidenta do Brasil, em abril de 2012, expressou assim sua opinião sobre Eike Batista: “Eike é o nosso padrão, a nossa expectativa e sobretudo orgulho do Brasil quando se trata de um empresário do setor privado.”
Em maio deste ano, durante o leilão para a entrega do petróleo brasileiro, a diretora-geral da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Magda Chambriard, afirmou que a empresa de petróleo de Eike Batista, a OGX, era mais competente que a Petrobras; disse ela: “A OGX já furou mais de cem poços. Não é um empresa ruim. Os planos de avaliação da Petrobras são longos, enquanto os da OGX levam 5, 8 meses. Gostaria de ter mais Eikes” nos leilões; ele pelo menos entrega a produção”.
Filho de Eliezer Batista, ex-ministro das Minas e Energia da Ditadura Militar, e detentor de informações privilegiadas sobre minérios e outras coisas, Eike Batista começou seus negócios por acaso nessa área. Aos 23 anos, em 1981, com um empréstimo de US$ 500 mil, comprou a sua primeira mina de ouro no Brasil. Em 2001, vendeu sua participação na TVX Gold para a Kinross Gold Corp por 875 milhões de dólares canadenses. Por vários anos, seguiu comprando minas e minérios barato e vendendo mais caro.
Os subsídios do Estado aos capitalistas
Somente após receber vultosos empréstimos do Estado brasileiro é que Batista ergueu o que chamou de Império X e tornou-se o homem mais rico do Brasil. De fato, a OGX recebeu do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), R$ 10,4 bilhões de financiamento. Desse total, o BNDES afirma ter liberado nada menos que R$ 6 bilhões. Uma fortuna para uma empresa que mostrou que não era nem eficiente, nem competente e muito menos produtora de alguma coisa, a não ser de declarações do tipo: “Não tenho complexo de vira-lata ou medo de concorrentes, nacionais ou estrangeiros”; “Se temos sucesso, por que não reverenciá-lo?”
Com essa dinheirama do BNDES em caixa, Eike Batista colocou as ações das suas empresas à venda no mercado, nas Bolsas de Valores. Como forma de impulsionar o “espirito animal” do sr. Eike, o próprio BNDES comprou ações da OGX, bem como a Caixa Econômica Federal. A CAIXA investiu (ou seria desperdiçou?) R$ 750 milhões de dinheiro público em ações da OGX.
Além do BNDES e da CAIXA, também Fundos de Pensão de trabalhadores das estatais investiram milhões nas empresas de Eike e, agora, veem o dinheiro investido virar fumaça, já que em outubro uma ação da OGX valia R$ 0,13 centavos. A Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, por exemplo, perdeu R$ 15 milhões com ações do império X, e o Postalis, fundo dos trabalhadores dos CORREIOS, outros milhões.
Ter “espirito animal” com dinheiro público é uma rotina no capitalismo brasileiro, como mostra a história das privatizações passadas e presentes. Na realidade, todas as fortunas na sociedade burguesa são formadas com subsídios ou financiamentos do Estado e com a exploração do trabalho alheio, ou seja, da mais-valia, o trabalho não pago do operário e que é a origem do lucro do capitalista.
Com efeito, entre janeiro de 2009 e março de 2012, dos R$ 240 bilhões repassados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), 64% foram aplicados em projetos de grandes empresas, entre elas a Brasil Foods, OI, VIVO, Ambev, Usiminas, OGX e as montadoras Fiat e Ford. Até a inglesa Souza Cruz e a norte-americana Philip Morris receberam do BNDES R$ 336 milhões para produzir cigarros no país e câncer no povo brasileiro.
No mundo, desde 2008, os governos dos principais países capitalistas gastaram US$ 30 trilhões de recursos públicos para salvar grandes bancos e monopólios da falência, provocando o maior endividamento da história.
Propriedade privada e a exploração do homem
Mas essa santificada propriedade privada, que tem como objetivo supremo enriquecer uma minoria de indivíduos em detrimento de milhões, e que sacrifica a cada cinco segundos uma criança de fome, além de jogar no olho da rua mais de 200 milhões de trabalhadores e despejar de suas casas outros milhões, não é eterna nem surgiu ao acaso.
No comunismo primitivo, a propriedade dos meios de produção era comum e não privada e no verdadeiro socialismo a propriedade dos meios de produção também é coletiva. Apenas no modo de produção escravagista, com a divisão entre senhores e escravos, e depois no feudalismo, é que a propriedade privada surge e se desenvolve. Ao lado da diferença entre uma minoria de homens livres e uma maioria de homens escravos, começa paralelamente a diferença entre ricos e pobres.
Sem dúvida, para a propriedade privada existir é necessário que a imensa maioria da sociedade seja privada dos meios de produção, isto é, seja obrigada, para sobreviver, a vender sua força de trabalho aos donos dos meios de produção.
Porém, é no capitalismo, que a propriedade privada se transforma num entrave ao progresso da sociedade humana e a principal responsável pelas crises econômicas, guerras e destruição do meio-ambiente, além de aprofundar a desigualdade social e de dividir a sociedade em uma minoria de exploradores, de um lado, e de outro uma maioria de explorados. Em outras palavras, neste modo de produção, a exploração do homem pelo homem se realiza de maneira mais brutal e violenta, como prova o fato de termos um exército permanente de desempregados no mundo, isto é, trabalhadores impossibilitados de sequer vender sua força de trabalho, além de dois bilhões de pessoas passando fome, ou nas palavras da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), sofrendo desnutrição. Tudo isso para um pequeno número de indivíduos se enriquecer. Nos EUA, por exemplo, uma superelite, apenas 400 indivíduos tem riqueza igual à de 50% da população e no mundo, de acordo com Mapa da Desigualdade em 2013, os 10% mais ricos do planeta detêm atualmente 86% da riqueza mundial.
Como essa riqueza é formada? Explica Karl Marx: “À custo do esforço alheio, espoliador da mais-valia e explorador da força de trabalho, o capitalismo ultrapassa em energia, exagero e eficiência a todos os sistemas de produção que o precederam”. (O Capital. Karl Marx)
A volta do neoliberalismo
Mas, como furar poços não significa produzir petróleo, a OGX, depois de vários calotes e de ter vendido a empresa de energia MPX a alemã E.ON, a empresa de logística LLX, dona do porto de Açu, a norte-americana EIG e a MMX, dona do superporto Sudeste para a holandesa Trafigura, entrou com pedido de recuperação judicial para evitar pagar a quem deve.
Com a recuperação judicial, a empresa fica protegida por seis meses de pedido de falência e da cobrança de credores e as ações param de cair, pois é proibida sua venda. Assim, a empresa privada mesmo com a corda no pescoço, e depois de receber todos os incentivos e rios de dinheiro do governo, consegue escapar da falência. É claro que esse tratamento é dado apenas aos donos de empresas privadas, aos capitalistas. Os trabalhadores, os que trabalham e verdadeiramente produzem as riquezas, quando não pagam suas dívidas, são despejados de suas casas, têm luz e água cortadas, seus nomes são inscritos no SPC, ficam impedidos de ter novos empréstimos ou de usar cartões de créditos e suas contas bancárias são fechadas.
Mas com os ricos é tudo diferente. O sr. Eike, por exemplo, mesmo atolado em dívidas e devendo a Deus e ao mundo (Somente a petroleira OGX deve R$ 11,2 bilhões ), continua vivendo sem maiores preocupações. Tem em caixa, R$ 70 milhões, fora o dinheiro depositado em paraísos fiscais, e continua frequentando os melhores restaurantes e comendo do bom e do melhor. No dia 8 de novembro, Eike Batista estava com a namorada e amigos jantando pato laqueado no restaurante Mr. Lan, no Jardim Botânico, Rio de Janeiro.
Quem vai pagar o pato?
Para nossa desgraça, em vez de refletir sobre os bilhões de dinheiro público que colocou nas mãos de capitalistas como os donos da OGX, do Banco Panamericano, do Banco Votorantim, etc, e sobre as diversas falências no Brasil e no mundo de milhares de empresas privadas², o governo Dilma Roussef continua financiando a classe dos ricos, como nada tivesse acontecido. Em outubro, privatizou o pré-sal, e em novembro, aeroportos, rodovias e o gás.
Resumindo: como o dinheiro do BNDES é do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) e também é o da CAIXA e dos fundos de pensões dos trabalhadores do Banco do Brasil, e dos Correios, embora quem come o pato laqueado seja Eike Batista e seus amigos, será o trabalhador brasileiro quem o pagará. Isto é que se chama de espírito animal do empresário e de propriedade privada dos meios de produção.
Para acabar definitivamente com essa injustiça, desde 1848, os comunistas proclamam que um dos seus objetivos é o fim da propriedade privada dos meios de produção: “Nesse sentido, os comunistas podem resumir a sua teoria nesta única fórmula: abolição da propriedade privada.”
Por isso, também, o 5º Congresso do Partido Comunista Revolucionário (PCR) realizado em novembro, em São Paulo, aprovou, como objetivo maior do Partido a realização de uma revolução socialista para acabar com a exploração do homem pelo homem e estabelecer a propriedade social dos meios de produção em nosso país.
Por fim, uma pergunta aos novos adeptos do neoliberalismo: um governo que se confessa incompetente para administrar um aeroporto ou uma rodovia, como vai administrar um país? De acordo com a vontade e o interesse das classes dominantes.
Lula Falcão,
diretor de redação de A Verdade e membro do Comitê Central do PCR
¹ Rei Midas, figura da mitologia grega, que tudo que tocava virava ouro, mas terminou seus dias com orelhas de asno.
² De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de cada 100 empresas abertas no Brasil, 48 (quase a metade) encerram suas atividades em três anos e segundo dados da pesquisa do Global Entrepreneurship Monitor (GEM), de 2011, que mede o monitoramento do empreendedorismo global, 69% das empresas brasileiras tendem a falir nos próximos cinco anos.