Durante os meses de dezembro e janeiro os rolezinhos tornaram-se assunto de conversa entre os brasileiros, uma vez que tomaram características de manifestação de resistência, principalmente após a repressão policial que ocorreu nos shoppings de São Paulo.
Os shoppings são o centro da propaganda do consumismo, onde famílias e amigos reúnem-se para divertir-se, seja na praça de alimentação ou numa sala de cinema. É uma verdadeira festa do capital, onde quem tem mais tem direito a divertir-se mais.
Porém, a juventude pobre, que geralmente pouco tem, também quer participar dessa diversão, e dessa forma marca encontros nesses centros de consumismo, encontros que foram caracterizados como um “rolezinho”, já que se eles não podem “ostentar” dentro das lojas, fazem isso nos corredores, com muito funk, brincadeira e animação.
Esta atividade poderia ser algo considerado comum, já que eventos bem parecidos também são realizados com a parceria dos administradores dos shoppings e donos das lojas. São os flash-mobs e os trotes universitários. Como denunciou manifesto do Centro Acadêmico da Faculdade de Educação, Administração e Contabilidade da USP, esses eventos são organizados todos os anos durante a calourada e reúnem centenas de jovens no Shopping Eldorado, fazendo barulho e subindo nas mesas. O manifesto provoca: “Se os eventos são similares, o tratamento deve ser o mesmo, independentemente de quem os frequentem”.
Uma expressão da luta de classe
Para a sociedade capitalista, a diferença está na cor e na classe social. Enquanto os jovens ricos e brancos podem fazer muito barulho em qualquer espaço, os jovens negros e pobres são marginalizados e criminalizados. A Polícia Militar vem mostrando que está aí para perpetuar tal preconceito, já que desde dezembro tem agido em favor dos ricos e reprimido a diversão dos pobres nos shoppings, agredindo, ameaçando e prendendo, qualquer jovem pobre e negro que ouse romper com o padrão de shopping center estruturado pelas elites. O mesmo tipo de tratamento que a polícia está acostumada a dar a esses jovens nas favelas, onde o xingamento e o tapa na cara são rotineiros.
Como se não bastasse a juventude das periferias já ser explorada por falta de um trabalho que a remunere de forma digna, pela ausência de uma educação de qualidade e de um sistema de saúde que as contemple e por anualmente ser excluída das universidades, agora está tendo seus espaços de locomoção limitados pelas regras ditatoriais e de higienização de uma grande elite. Regras semelhantes ao apartheid sul-africano.
Para as elites a propriedade privada deve ter limites claros para esta parcela da população, caso contrário o povo vai entender cada vez mais que não pode obter a maior parte do que produz com seu trabalho.
É preciso questionar e analisar que o grito desses jovens vai para além dos muros dos shoppings; esses só querem poder ter o mesmo direito que os jovens de classe média têm, só querem poder ver os seus sonhos se realizarem.
Cansados de verem os jovens brancos e a grande mídia esfregar em suas caras a falta de oportunidade e as poucas esperanças que a sociedade lhes dá, parecem dispostos a enfrentar toda tentativa da burguesia de higienizar os espaços não só privados, como públicos. Parecem não aceitar mais o fato de, em seus encontros, muitos jovens serem presos sem qualquer motivo, além do constrangimento que são submetidos pelos seguranças particulares dos shoppings, que não evitam qualquer chance de bater nesses jovens e ameaçá-los com armas, detê-los e levá-los para averiguação.
Pelo jeito, a burguesia pode esperar, porque o rolezinho vai se nacionalizar.
Thiago Vidal e Rafael Cantuária, militantes da UJR – RJ