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terça-feira, 19 de novembro de 2024

Como os empresários apoiaram a Ditadura

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boilesen ditadura militarA Ditadura Militar, patrocinada pelas classes ricas, recebeu apoio de empresas de diversas áreas: indústrias, bancos, meios de comunicação, agências de publicidade, em geral, comandados por famílias tradicionais, financiaram os gastos dos militares na luta contra as organizações de esquerda.

As formas de apoio foram as mais variadas: contribuição em dinheiro vivo, apoio na estrutura, financiamento de propaganda, pagamento de salário de funcionários da repressão, perseguição a trabalhadores(as) e permissão para militares se infiltrarem nas empresas.

Antes mesmo do Golpe de 1964, empresários criaram o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (IPES), financiado por 125 empresas, entre elas a Light (que até hoje atua na distribuição de energia do Rio de Janeiro) bancos e comércios, principalmente de São Paulo e do Rio de Janeiro, além de Porto Alegre e Minas Gerais. Só em 1963, foi levantado para financiar o IPES cerca de 4 milhões de cruzeiros, moeda da época.

Esse Instituto nada mais era do que uma fachada para a produção de material ideológico e político contra o governo do presidente João Goulart, que, segundo pesquisa do IBGE à época, contava com o apoio de 70% da população. Entre os funcionários do IPES, destacam-se grandes nomes da arte e da cultura do Brasil como o escritor Rubem Fonseca e a escritora Rachel de Queiroz, além dos cineastas Jean Manzon e Carlos Niemeyer, e o famoso narrador Luiz Jatobá.

No dia 15 de março, a jornalista Denise Assis, da Comissão da Verdade do Rio de Janeiro, exibiu, em São Paulo, num seminário que discutia a participação das empresas na Ditadura, um dos 14 vídeos produzidos pelo IPES. As imagens manipuladas do vídeo e a narração comparam e igualam o terror do nazifascismo ao socialismo soviético.

No primeiro governo militar, foi criado o Serviço Nacional de Inteligência (SNI) para vigiar a atuação de opositores do regime e no seu quadro de funcionários constavam mais de 500 espiões que trabalharam no IPES.

Outro caso famoso foi a “vaquinha” feita entre empresários para comprar equipamentos e armamentos que seriam utilizados caso houvesse resistência dos apoiadores do Jango e que, depois de dado o golpe, serviu para financiar as torturas.

A Operação Bandeirantes (Oban), que foi o embrião do DOI-Codi, era o principal órgão de repressão da Ditadura e funcionava em um prédio na Rua Tutóia, em São Paulo, que existe até hoje e abriga uma Delegacia de Polícia. Ela não tinha verba própria, mas contou com os esforços de Henning Albert Boilesen (presidente da Ultragaz, na época) para torturar e matar quase 60 militantes de esquerda.

Além disso, documentos do DOI-Codi e do Dops mostram registros da entrada de funcionários do alto escalão das principais empresas em atuação no país. Muitas das entradas ocorriam durante a noite e a saída era registrada no dia seguinte, insinuando que esses funcionários passavam as noites assistindo sessões de torturas dos presos.

Uma das principais formas de apoio veio da chamada mídia. Os vídeos de propaganda contra o governo Jango, produzidos pelo IPES, eram veiculados nas principais emissoras do país na década de 1960, como Tupi, Cultura e Excelsior. Com o sucesso do golpe, grandes grupos da mídia brasileira favoráveis aos militares se fortaleceram e outros conquistaram seu espaço. O falecido Roberto Marinho construiu todo o império midiático da Rede Globo na época da Ditadura, sendo hoje um dos cinco maiores do mundo.

São históricos os editoriais do jornal O Globo engradecendo a chegada dos militares ao poder. O mais exaltado deles saiu nos jornais no dia 2 de abril de 1964: “Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas que, obedientes a seus chefes, demonstraram a falta de visão dos que tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil livrou-se do Governo irresponsável que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições”.

Durante os 21 anos do regime, as Organizações Globo tiveram um salto enorme de poder político e econômico. A família Marinho é, segundo a revista Forbes, a mais rica do Brasil, somando uma riqueza de quase R$ 30 bilhões. Tudo construído à base de falácias e da defesa dos militares e, após a redemocratização do país, da defesa das políticas neoliberais do governo dos EUA, do FMI e do Banco Mundial.

Não podemos esquecer da Folha de São Paulo, maior jornal diário do país, que emprestava seus carros de entrega de jornais para que presos políticos e vítimas da tortura fossem transportados para a Oban, hospitais ou valas comuns onde seriam enterrados. Esse fato só ficou claro após militantes de esquerda queimarem um carro da Folha como denúncia.

A rede de lojas de varejo Mesbla bancava caminhões que levavam projetores e telas de cinema para transmitir os filmes produzidos pelo IPES no interior do país e nos horários de almoço dos trabalhadores nas grandes fábricas.
É preciso lembrar que órgãos da imprensa resistiram contra o regime. A revista O Cruzeiro é um exemplo, até ser comprada por apoiadores do regime. Porém, como os funcionários se negaram a apoiar a Ditadura, ela foi fechada. O jornal Última Hora foi outro que se opôs ao golpe e foi à falência. Muitos outros surgiram como O Pasquim e Opinião, etc.

Ditadura criou grandes monopólios

Foi durante a Ditadura Militar que as indústrias automobilísticas estrangeiras tiveram grande crescimento, recebendo incentivos do governo. Em troca, permitiam que policiais infiltrados atuassem nas empresas, espionando as atividades políticas dos trabalhadores. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) foi forte aliada do regime, interessada no arrocho salarial e em outras medidas realizadas pelo governo.

Outro setor favorecido foi o da construção civil. Grandes monopólios atuais como Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa conquistaram seu poder graças aos incentivos dos militares e suas políticas de grandes obras, mesmo que desnecessárias, como a Transamazônica, no Norte, e o “Minhocão”, em São Paulo, além das obras da Usina de Itaipu e da Ponte Rio-Niterói.

Até hoje, sentimos as consequências da política econômica dos militares, como o aumento da nossa dependência em relação aos países capitalistas mais desenvolvidos e as intermináveis dívidas públicas interna e externa.
A Comissão da Verdade de São Paulo realizou um seminário que deve servir de exemplo para que mais estudos sejam feitos sobre a relação das elites brasileiras com os crimes da Ditadura. É preciso aprofundar a investigação desse tema para que, em breve, além dos ditadores e torturadores, passemos a renegar e punir também os aliados e financiadores da Ditadura Militar.

Sobre o Golpe Militar assista:

Cidadão Boilesen, que trata da relação do presidente da Ultragaz com a repressão. Direção de Chaim Litewski

O Dia que Durou 21 Anos, que revela, em detalhes, o apoio do Governo dos EUA ao golpe de 64. Direção de Camilo Tavares.

Jango, sobre a deposição do presidente João Goulart e a realidade do país antes e depois do golpe. Direção de Silvio Tendler.

Eles não Usam Black-Tie, filme baseado na peça de Gianfrancesco Guarnieri que mostra a história de um operário que fura uma greve por interesses particulares. Direção de Leon Hirszman.

Pra Frente Brasil, um dos primeiro a retratar o sistema de torturas quando um homem de classe média, confundido com um militante de esquerda, é preso e morre nos porões da Ditadura. Direção de Roberto Farias.

Lucas Marcelino, presidente do DCE das Universidades Oswaldo Cruz e militante da UJR

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