Derrotada no 2º turno das eleições presidenciais, a extrema direita brasileira prepara suas estratégias para pressionar o governo e disputar a consciência popular.
Sabemos que o governo Dilma teve sua campanha financiada por empreiteiras e capitalistas e do agronegócio. Os capitalistas vão agora fazer lobby para cobrar a fatura desse financiamento, procurando fazer com que o governo aplique medidas em seu próprio benefício. Na oposição de direita, há um conjunto de forças políticas e especuladores interessados em manipular a opinião pública para impedir qualquer medida do governo que sirva para reduzir as injustiças sociais que existem no Brasil.
De cara, é preciso saber que essa estratégia não é fruto de geração espontânea nem tampouco floresce apenas de preconceitos e atitudes despolitizadas já arraigadas em parte da população. É uma estratégia formulada por órgãos da mídia e institutos de propaganda fortemente financiados pelos capitalistas que respondem de maneira unificada em nível internacional. Após anos de repetição midiática das teses da extrema direita, é compreensível que essas ilusões tenham certa ressonância na sociedade.
Tirar proveito das divisões regionais do País
A primeira parte dessa estratégia consiste em criar um mito e separar o país entre “ignorantes” e “inteligentes”, “preguiçosos” e “bem-sucedidos”. O alvo preferencial dessa propaganda são os moradores da região nordeste do país e o argumento principal é o pagamento do Bolsa-família.
O nordeste votou massivamente contra o candidato Aécio Neves por que é a região mais afetada pela política antipopular da extrema direita desde antes da ditadura militar. Políticas básicas de industrialização e incentivo à educação nunca haviam sido implantadas na região, obrigando grande parte de seus habitantes a emigrarem em verdadeiro êxodo até a década de 1990. Foi com pleno conhecimento do perigo que o candidato do PSDB representa que os brasileiros do nordeste foram votar.
A verdade é que o estado de São Paulo é o segundo estado do Brasil com maior número de beneficiários do Bolsa Família, ficando atrás apenas do Ceará. Dilma teve a maior parte de seus votos no sul e sudeste, vencendo as eleições inclusive no Rio de Janeiro e em Minas Gerais. No entanto, faz parte da estratégia do fascismo encontrar um inimigo interno, que esconda a divisão da sociedade em classes e turve a percepção das pessoas sobre a verdadeira origem dos problemas sociais.
No Brasil, não existe um número suficiente de imigrantes, judeus ou ciganos que possam servir como alvo desse preconceito, assim como acontece na Europa. A solução então foi mirar na povo do nordeste e realizar uma propaganda sistemática, certas vezes subliminar, certas vezes direta, para fomentar a xenofobia e colocar o povo do nordeste como responsável pelos problemas do Brasil.
Os representantes da extrema direita mais radical são mais explícitos nesse ataque aos brasileiros do nordeste. Entre eles está Diogo Mainardi, fiel puxa-saco da burguesia paulista, que afirmou logo após as eleições: “O nordeste é atrasado em tudo, inclusive na linguagem. É uma região bovina que sempre se conformou com o poder”. Outros são mais discretos, como os jornalistas servidores da família Marinho, que na manhã após as eleições apresentaram um mapa com os estados do nordeste pintados de vermelho, escondendo os milhões de votos em Dilma no sul e sudeste.
Lei, ordem e força bruta
A segunda parte da estratégia consiste em convencer a população que existe um estado de anarquia instalado em toda a parte, que ao país faltam leis, punição, regras e limitações. A mídia investe pesadamente em programas policiais que fazem um verdadeiro terror jornalístico ao meio-dia e no fim da tarde em vários canais e têm à sua disposição helicópteros e diversos pontos ao vivo.
Esses programas televisivos promovem a força militar como solução para todos os problemas. Querem convencer de que um código penal mais punitivo, a redução da maioridade penal, a pena de morte e a prisão perpétua vão transformar o Brasil em um verdadeiro paraíso. Eles sonham em tornar popular uma liderança militar que possa ser o “redentor” do Brasil.
Não à toa, o deputado estadual eleito conhecido pela alcunha de Coronel Telhada foi o único parlamentar a se posicionar publicamente defendendo a separação de São Paulo do restante do país como solução para a questão social.
Eles escondem que, considerando apenas as punições feitas dentro da lei, o Brasil é um país campeão em prender e punir, em especial os jovens e os negros. São hoje mais de 700 mil pessoas presas no Brasil, a terceira maior população carcerária do mundo. Temos mais presos do que a Índia, país com mais de 5 vezes nossa população. Por fora da lei, temos uma das polícias que mais mata no mundo fazendo com que a própria ONU recomendasse ao Brasil a desmilitarização das polícias. Se prender e matar pessoas gerasse mais segurança, certamente o Brasil seria mais seguro que a Suíça.
O objetivo dessa estratégia é ganhar a simpatia da classe trabalhadora às medidas de restrição da liberdade e do uso da força bruta contra o protesto social. Ganhando a tese da lei e da ordem será mais fácil criminalizar os movimentos sociais, as lutas sindicais, a luta das mulheres pelo direito ao aborto seguro e contra a violência e a luta da população LGBT por igualdade.
Os corruptores gritam corrupção
Manipular a percepção popular sobre a corrupção consiste na terceira parte dessa estratégia. O povo brasileiro evidentemente repudia quem se corrompe e usa o dinheiro público para enriquecer. O mito que eles querem criar, no entanto, tem o seguinte fundamento: a corrupção é uma invenção dos políticos e são os políticos os principais beneficiados com a corrupção.
A verdade porém é outra. A corrupção é uma invenção dos capitalistas que usam o pagamento de propina para obterem benefícios do estado e assim reunirem mais lucros. Os políticos não passam de marionetes dos capitalistas na gestão do estado, manobrando com o objetivo de beneficiar um ou outro especulador e recebendo seus 10% em troca disso. Os corruptores (ou seja, os que pagam a propina), nunca têm evidência nas materiais dos jornais e, comumente, nada acontece com eles e suas empresas.
Tanto é verdade que a principal corrupção que acontece nas eleições é totalmente legalizada. Ela consiste no financiamento privado das candidaturas. Os capitalistas da empresa Friboi, por exemplo, doaram R$ 51 milhões para vários partidos da situação e da oposição neste ano. É possível acreditar que alguém faça uma doação de R$ 51 milhões sem esperar nada em troca?
O objetivo dessa estratégia é paralisar o governo e ela é usada sempre que a extrema direita sente que o governo pretende avançar em alguma medida popular. Do ponto de vista dos reacionários, é melhor um governo paralisado do que um que democratize a mídia, faça a reforma agrária, re-estatize as estatais privatizadas e faça a auditoria da dívida pública.
Com estratégia definida, a extrema direita está em campo para defender seus interesses e já mostrou que não tem limite em impôr o ódio para conseguir o que quer. O movimento popular não poderá sair vitorioso dessa disputa se se limitar a responder aos ataques ou permanecer em uma postura defensiva em relação ao governo, pregando o medo de que este não se sustente. A maioria do povo brasileiro mostrou nas urnas que quer mudanças profundas no país e os movimentos populares precisam ser os primeiros defendendo essas mudanças, empurrando e exigindo do governo.
Jorge Batista, São Paulo