UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

terça-feira, 23 de abril de 2024

Combater o machismo é um dever de todo revolucionário

1 a a a a marcha vadias brasilia 2012 machismo mataVivemos em uma sociedade cindida em classes e marcada por profundas desigualdades de gênero e raça. O patriarcado enquanto sistema de dominação dos homens sobre as mulheres constitui-se em um conjunto de valores que historicamente foram se estabelecendo e determinando lugares sociais e de poder. As relações de dominação patriarcal não se resumem apenas às esferas familiar, trabalhista, midiática e política. O patriarcalismo compõe as mais variadas dinâmicas sociais e está relacionado não apenas a uma ideia, mas a uma maneira de pensar.

Inserido no conceito marxista de ideologia, é possível pensar o patriarcado como um dos elementos presentes na superestrutura ideológica que diz respeito à visão de mundo própria da burguesia.

Segundo Marx, quem cria as ideologias são as classes e não os indivíduos. Por isso, o patriarcado possui uma base social, e apesar de os homens serem os seus representantes legítimos, ele está presente no imaginário e na lógica de homens e mulheres. No caso das mulheres, dependendo do contexto em que estiverem inseridas, estas poderão se beneficiar disto ou não.

Poder, racismo e controle

Para exemplificar melhor de que maneiras o patriarcalismo possui raízes profundas que se desenvolveram e se transformaram até se apresentarem da forma como existem hoje na sociedade capitalista, imbricando questões de gênero, classe e étnico/raciais, é conveniente que lancemos nosso olhar em direção à história, nos valendo mais uma vez da teoria marxista.

O processo de alienação do trabalhador/trabalhadora reduz os indivíduos humanos à condição de coisas, objetos. A consequência imediata da alienação do trabalhador/trabalhadora frente a humanidade é o estranhamento do indivíduo frente ao outro ser. A relação entre capital, trabalho e alienação promove a coisificação do mundo e a consequente naturalização desta condição pelos homens e mulheres. A partir disto, é possível visualizar de maneira mais clara as motivações de um operário que ao chegar em casa após o trabalho espanca a esposa. Este operário reproduz e projeta a mesma relação a que foi submetido pelo seu patrão. O capitalista não consegue enxergar o operário como um ser humano igual a ele e, por isso mesmo, não vê razões óbvias para lhe conceder direitos. Assim também ocorre no caso do operário que espanca a esposa: o operário não a enxerga enquanto outro ser humano, e se acha no direito de trata-la como bem entender, naturalizando a violência física e moral.

O processo de violência que está intrinsecamente baseado nos princípios do patriarcado também se relaciona de maneira direta com o racismo. Trata-se de um arranjo que poderia ser exemplificado por meio do tripé patriarcado, racismo e capitalismo. Dessa forma, as mulheres brancas historicamente também reproduziram e projetaram nas mulheres negras a mesma relação de dominação a que eram submetidas por seus maridos. Desde a escravidão, a violência que mulheres brancas praticavam contra mulheres negras tinha suas raízes na ideologia patriarcal. Os variados tipos de violência que as mulheres negras sofriam não se limitavam a agressões físicas, mas incluíam também violência moral e tortura psicológica. As negras escravas podiam ser castigadas a qualquer momento por suas senhoras sem que para isto houvesse necessidade de maiores explicações. São comuns as referências em que escravas tinham unhas, dentes e olhos arrancados apenas porque suas senhoras desconfiavam de que haviam se deitado com seus maridos, senhores de engenho.

Essa mesma violência baseada em relações desiguais e hierárquicas continua a existir de forma diferenciada na sociedade atual. Assim, ao construir nossas análises visando contribuir para a desmistificação e o crescimento do movimento feminista, devemos evitar generalizações que consequentemente levem à invisibilidade de mulheres que se diferenciam em questões de classe, cor e mesmo de identidade de gênero, e que por isso mesmo vivenciam as opressões de modo diferente.

Desconstruir o machismo

A grande maioria dos homens exerce de forma consciente ou inconsciente sua autoridade sobre as mulheres, inclusive mulheres trans e também as que não se identificam com o gênero feminino. A partir do momento em que um homem passa a rever seus privilégios, dado que as relações de gênero na sociedade capitalista são desiguais e privilegiam os homens, ele assume a posição de um machista em desconstrução; trata-se portanto de uma decisão política. O mesmo ocorre no tocante à relação homem branco – homem negro, homem rico – homem pobre, homem – mulher, mulher branca – mulher negra, entre outras relações desiguais.

Lembrando que isto ocorre porque vivemos em uma sociedade marcada pela desigualdade, nenhuma destas relações deve ser naturalizada. Faz parte deste processo de reeducação uma constante autocrítica e uma mudança radical na relação deste homem com as mulheres e também com outros homens.

É necessário questionar os valores da sociedade patriarcal entendendo que o machismo oprime não só as mulheres, mas os próprios homens e também crianças. Um exemplo disto é a histórica construção da figura do “macho”. No Rio Grande do Norte, em março deste ano, um menino foi brutalmente assassinado pelo próprio pai porque gostava de lavar louça. O nome do menino era Alex, ele tinha 8 anos de idade e seu comportamento não condizia com a postura que um homem deveria ter, segundo seu pai. Este tipo de construção se desdobra em posturas heteronormativas e homofóbicas, que associam qualquer comportamento fora dos padrões do “homem macho” a algo ruim, como se cada sexo tivesse determinados papéis na vida, sendo algo “não natural” um homem lavar louça, usar roupa rosa ou uma mulher assumir atividades profissionais que demandem esforço físico, entre outros.

As feministas, ao construir suas críticas e reflexões sobre a sociedade patriarcal, devem atentar para o fato de que são as mulheres que mais sofrem com este sistema e com seus valores cada vez mais distorcidos e brutais, mas, no entanto, estamos longe de sermos as únicas a sofrer. A violência machista da sociedade patriarcal possui inúmeros desdobramentos que não podem ser ignorados.

Recentemente foi lançada uma campanha intitulada “Homens, libertem-se”, uma parceria entre mo[vi]mento-MG/RJ e o grupo The Living Theatre, de Nova Iorque. A proposta é estimular os homens a refletirem sobre a opressão de um modo geral ao se depararem consigo mesmos como oprimidos pelo sistema patriarcal. Essa campanha dá início a uma boa proposta de diálogo, mesmo contendo algumas limitações.

Contudo, faz-se necessário chamar atenção para o fato de que as exceções não mudam a realidade da maioria. E a realidade é que a maioria dos homens não se esforça no sentido de desconstruir o machismo, ao contrário, sentem-se bastante confortáveis ocupando um lugar privilegiado na sociedade. Afinal de contas, não são os homens que compõem maior parte das estatísticas alarmantes de violência machista.

De fato, apenas no estado do Rio de Janeiro, em 2013, 4.872 mulheres foram estupradas, o que significa 13 mulheres atacadas por dia, ou um caso a cada 2 horas. Os dados fazem parte do Dossiê Mulher 2014, divulgado pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), ligado à Secretaria de Estado de Segurança, e só dizem respeito aos casos que foram registrados oficialmente em delegacias de polícia. No total, incluindo os casos de estupros masculinos e um pequeno percentual no qual o gênero da vítima não foi informado, o crime foi registrado 5.885 vezes no ano passado em todo o estado.

Machistas não passarão!

Assim, a violência de gênero é um dos pilares do patriarcado e é utilizada como uma ferramenta eficaz para a manutenção de uma sociedade com desigualdade entre gêneros. De modo que o machismo é passível de estar presente no comportamento de um homem, independentemente de sua posição política. Um verdadeiro revolucionário é consciente dessa possibilidade e deve ter por tarefa o seu combate permanente, a partir de si mesmo e também no interior de sua organização.

Segundo a teoria marxista, as relações jurídicas e políticas não podem ser entendidas em si mesmas e suas raízes devem ser investigadas pois frequentemente encontram-se nas condições de existência material de uma sociedade. Sob este mesmo ponto de vista é possível afirmar que a instituição política patriarcal é também um instrumento a serviço da reprodução da sociedade de classes, seja ela qual for. Apenas no socialismo, porém, é que se têm as condições materiais ideais para que ela seja combatida e enfraqueça paulatinamente, até desaparecer definitivamente com o advento da sociedade comunista, sem classes. Com o fim do patriarcado, a abolição da propriedade privada, do combate aos velhos valores da família tradicional burguesa e o fim da divisão da sociedade em classes, não haverá espaço para que a ideologia burguesa se perpetue.

Entretanto, não devemos esperar que as condições ideais para a libertação das mulheres criem-se sozinhas. Se a classe trabalhadora deseja libertar-se das cadeias de exploração, precisa começar desde já e não deve concentrar suas forças apenas em suprimir as bases do sistema capitalista, mas também pela emancipação das mulheres do domínio da opressão patriarcal.

Apesar desta questão estar cada vez mais na pauta do dia, a opressão das mulheres não é algo novo e também não surge com o capitalismo; sua origem é atribuída ao surgimento da propriedade privada e da divisão da sociedade em classes.

Para Marx, as ideias derivam, em última análise, da base material de uma sociedade; e as ideias dominantes em qualquer época são as da classe dominante procurando manter sua dominação. Assim, dentro do capitalismo o patriarcado se reorganiza de forma a se tornar fundamental para a reprodução dessa lógica societária. O capitalismo se acomoda à estrutura patriarcal da sociedade e o trabalho da mulher é constantemente reorganizado de modo que seja possível torna-la submissa, reforçando a acumulação de capital ao mesmo tempo em que reafirma seu papel inferior ao do homem dentro da estrutura social. Um exemplo disso é o salário das mulheres ser historicamente inferior ao dos homens.

A superação da opressão da mulher pelo homem passa pela necessária superação dessa forma de organização social, visto que as duas coisas possuem um imbricamento estrutural. Não existe, portanto, luta de classes, sem luta de gênero. Desvencilhar uma coisa da outra é ignorar o papel da mulher na história da conquista de direitos da classe trabalhadora e também acaba por tornar obsoleta a luta de classes. Por isso, a luta pela emancipação das mulheres não é uma causa a que se deva aderir apenas em solidariedade. O trabalhador que compreende que a exploração do homem pelo homem teve início com a exploração da mulher pelo homem, compreendendo assim a inerente relação existente entre a exploração da força de trabalho e a opressão das mulheres, também está dando um passo adiante no caminho de sua própria liberdade.

Quando uma mulher avança, nenhum homem retrocede!

Assim como os militantes de esquerda, homens e mulheres, devem estar na linha de frente quando se trata de defender os trabalhadores dos ataques da burguesia, os mesmos devem assumir tal postura quando se trata de violência machista. A esquerda revolucionária deve assumir para si a tarefa de defender e incorporar o que há de mais avançado e progressista na sociedade atual. Se o que queremos é construir uma sociedade sem classes e com igualdade de gêneros, temos que começar desde já.

Sabemos que não é possível destruir por completo o sistema patriarcal sem antes derrubarmos também as bases que dão sustentação para o sistema capitalista. A compreensão materialista e dialética da história, o materialismo histórico, nos auxilia na compreensão de que em um processo de transição, as características de uma organização social anterior estarão presentes na que estiver sendo construídas. Porém, também é verdade que várias das características da sociedade futura, já devem estar presentes na atual. A sociedade patriarcal deve ser minada em todas as suas bases, por isso combater o machismo cotidianamente faz parte de um processo revolucionário.

Yohanan Barros, Rio de Janeiro

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2 COMENTÁRIOS

  1. Quem escreveu esta matéria, compreende muito pouco do materialismo dialetico. Comete equivocos primários de avaliações científicas. Possui um tendencionismo não próprio dos revolucionários.

  2. Pois bem, Paulo Justino, aguardamos a sua contribuição na qual demonstrará seu domínio do materialismo dialético, apresentando o combate que os revolucionários devem dar ao machismo

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