No último dia 27 de maio, uma operação comandada pelo FBI (Polícia Federal dos EUA) e pela Receita Federal dos Estados Unidos prendeu, na Suíça, sete dirigentes do alto escalão da entidade sob a acusação de extorsão, fraude, suborno e lavagem de dinheiro, entre outras irregularidades.
A escalação dos cartolas presos é digna de seleção: José Maria Marin (ex-presidente da CBF), Jeffrey Webb (presidente da Concacaf), Eduardo Li (presidente da Federação de Futebol da Costa Rica), Julio Rocha (diretor de desenvolvimento da Fifa), Costas Takkas (assessor do presidente da Concacaf), Rafael Esquivel (membro executivo da Conmebol) e Eugenio Figueiredo (vice-presidente da Fifa).
Segundo a procuradora-geral de Justiça dos EUA, Loretta Lynch, os presos são acusados de montar um esquema de enriquecimento próprio por meio de negociatas envolvendo o futebol. “A corrupção é desenfreada e sistêmica”, afirmou.
A investigação, que está apenas no começo, revelou o pagamento de propinas de pelo menos US$ 150 milhões em contratos de transmissão de jogos e direitos de imagem na América do Sul e nos Estados Unidos. Além disso, há indícios de compra de votos na escolha da África do Sul como sede da Copa do Mundo 2010 e na eleição para presidente da Fifa, em 2011.
A Justiça dos Estados Unidos alega que o motivo para a investigar a Fifa e seus dirigentes, é a sonegação de milhões de dólares para a Receita Federal do país já que boa parte da propina do esquema foi paga ou recebida por meio de bancos norte-americanos, como o Delta, JP Morgan Chase, Citibank e Bank of America, ou por filiais de bancos como o Itaú e o Banco do Brasil nos EUA.
Como funcionava o esquema
Segundo o FBI, desde 1991, cartolas da Fifa e das confederações nacionais se aproveitam de suas posições para fazer acordos com empresas de marketing esportivo e lucrar com campeonatos de futebol, como a Copa América, a Libertadores e a Copa do Brasil.
O esquema funcionava assim: para ter direito de transmitir um evento organizado pela Fifa, as empresas de marketing pagavam propinas milionárias aos dirigentes da entidade. Depois, esse direito era revendido para emissoras de televisão por verdadeiras fortunas. “A maioria dos esquemas investigados diz respeito à solicitação e recebimento de propinas por autoridades do futebol vindas de executivos de marketing, em conexão com a comercialização de direitos de imagem e marketing de várias partidas e campeonatos”, revela o Departamento de Justiça dos EUA.
Apenas o contrato de transmissão das Copas América de 2015, 2019 e 2023, assinado pela Datisa, empresa ligada ao brasileiro J. Hawilla, foi de US$ 352,5 milhões. Em depoimento à Justiça norte-americana, este afirmou ter pago US$ 110 milhões a altos dirigentes do futebol sul-americano para fechar o negócio. Depois disso, Hawilla vendeu os direitos de transmissão da Copa América no Brasil para a Rede Globo.
Globo e Fifa: tudo a ver
A TV Globo insiste em negar seu envolvimento, mas é público que J. Hawilla é sócio da TV TEM, uma das afiliadas da Rede Globo em São Paulo, ao lado de ninguém menos que Paulo Daudt Marinho, filho de João Roberto Marinho. Hawilla também é dono da produtora TV 7, responsável pelos programas globais “Auto Esporte” e “Pequenas empresas, grandes negócios”.
O empresário foi condenado nos Estados Unidos por extorsão, fraude, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. Para não ir para a cadeia, fez acordo de “delação premiada” e pagou uma multa de quase R$ 500 milhões.
Apesar de não ser citada na investigação do FBI, a Globo é uma das principais parceiras da Fifa desde os anos 1970, e proprietária dos direitos de transmissão de quase todos os campeonatos ligados à corrupção da cartolagem.
O próprio Roberto Irineu Marinho já confessou a importância dessa parceria para a emissora: “Por mais de 40 anos, a Globo e a Fifa desenvolveram uma parceria muito frutífera, que trouxe ótimos resultados para ambas as partes. Nós estamos orgulhosos de prolongar esta parceria”, disse.
CBF comanda esquema no Brasil
A investigação do FBI também envolve diretamente Ricardo Teixeira, que presidiu a Confederação Brasileira de Futebol por 23 anos. Teixeira é acusado de receber propina em, pelo menos, duas negociatas: no contrato da CBF com a Nike e na venda de direitos de transmissão da Copa do Brasil.
O cartola deixou o comando da CBF em 2012, sendo substituído por outro ladrão, José Maria Marin, agora preso. O ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol ainda responde processo por ter participado de 27 negociatas envolvendo lavagem de dinheiro, tráfico de divisas e fraude fiscal, além de ter usado recursos da CBF para financiar campanhas eleitorais de políticos aliados.
Fundada em 1904, em Paris, a Fifa tinha como objetivo original desenvolver o futebol, organizar competições internacionais e estabelecer as regras para a prática do esporte mais popular do mundo. Porém, de lá para cá, especializou-se em outro tipo de “negócio”, passando a ser conhecida como a entidade mais corrupta do mundo.
“A Fifa está roubando a paixão das pessoas. O futebol é uma paixão, e a paixão cega. Esses crápulas que dirigem a Fifa enriquecem às custas do dinheiro da paixão. Todo o sistema das grandes confederações do esporte está contaminado. A corrupção está lá”, denuncia o jornalista inglês Andrew Jennings.
Porém, o presidente da Fifa, Joseph Blatter, chefe maior da máfia da Fifa, não só continua solto, como, inclusive, foi reeleito para mais um mandato. “Ele vende a imagem de ser um amante do futebol, mas é um parasita. Um sanguessuga grudado na jugular do futebol. Um homem de negócio que usa o esporte para se autopromover e ganhar dinheiro, disse Jennings.
Há que se perguntar, então, por que o nome Blatter não consta na lista dos investigados. Se a própria procuradora Loretta Lynch afirma que a corrupção no futebol é sistêmica, não faz sentido deixar ileso o chefe desse sistema, ou melhor, da quadrilha que comanda o futebol mundial.
Heron Barroso, Rio de Janeiro