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sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Eduardo Cunha declara guerra ao SUS

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Desde que assumiu a presidência da Câmara dos Deputados, em fevereiro deste ano, Eduardo Cunha (PMBD-RJ) tem cumprido com excelência o papel de defensor da privatização da saúde: tentou passar a MP 627/2013, que anistiava uma dívida de R$ 2 bilhões em multas dos planos de saúde, barrou a criação da CPI dos planos de saúde, propôs a PEC 541/2014, que obriga os empregadores a pagarem planos de saúde para os empregados, e conseguiu promulgar a Emenda Constitucional 86/2015, que reduz substancialmente o financiamento da União para o SUS.

Eleito deputado federal pelo Rio de Janeiro com a ajuda do Bradesco Saúde, plano privado que doou R$ 250 mil para sua campanha, em 2014, Eduardo Cunha tem feito o possível para defender seus financiadores. Apesar de liderarem o ranking de reclamações no Procon, sendo 80% das denúncias referentes ao não cumprimento contratual, e apresentarem a exorbitante quantia de R$ 111 bilhões em lucro no mesmo ano, os planos de saúde não serão investigados pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) graças a Cunha. Segundo ele, a proposta, apresentada pelo também deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP), era “inconsistente e sem foco”, apesar de contar com a assinatura de 201 deputados (30 a mais do que o mínimo necessário previsto pelo regimento interno da Câmara) e ter parecer favorável da consultoria da casa.

Segundo o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), as operadoras de planos de saúde devem mais de R$ 742 milhões ao SUS, segundo dados da Agência Nacional de Saúde (ANS). Essa dívida se deve ao cumprimento do artigo 32 da Lei de Planos de Saúde (Lei nº 9.656/1998), que estabelece que as operadoras devem ressarcir os serviços prestados aos seus clientes por instituições integrantes do Sistema Único de Saúde. Porém, ao invés de cobrar dos planos o ressarcimento pelo atendimento prestado, Cunha quis aprovar uma Medida Provisória (MP 627/2013) para perdoar a dívida e reduzir as multas aplicadas aos planos pelo não cumprimento dos contratos com os clientes. A presidenta Dilma Rousseff vetou a MP em maio deste ano, porém a cobrança das multas ainda é falha: para se ter uma ideia, as operadoras pagaram apenas 20% das multas aplicadas em 2013.

Os retrocessos na saúde pública

Hoje, 50 milhões de brasileiros (aproximadamente um quarto da população) são contratantes de planos de saúde. Porém, esse número pode aumentar consideravelmente se a PEC 451/2014, de autoria de Cunha, for aprovada. A PEC determina que todo empregador ofereça plano de assistência à saúde ao seu empregado em decorrência do vínculo empregatício. Com isso, Eduardo Cunha retira do Estado sua obrigação constitucional de garantir assistência médica à população, resultando em redução do investimento no SUS e, provavelmente, aumento dos benefícios e isenção fiscal e tributária às operadoras de saúde. Dessa forma, o presidente da Câmara pretende retroceder à época do Inamps (Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social), órgão anterior ao SUS e que restringia a assistência médica aos trabalhadores com carteira assinada, deixando à margem a população informal e os desempregados, que não tinham direito ao serviço de saúde gratuito.

Outro retrocesso promovido pelo deputado Eduardo Cunha diz respeito ao financiamento do SUS. A Emenda Constitucional 86, sancionada em março deste ano, estabelece que o financiamento da União para o SUS será calculado com base “na receita corrente líquida do exercício financeiro, não podendo ser inferior a 15%”, porém de forma progressiva: 13,2% no primeiro ano, chegando aos 15% após o 5º ano da promulgação da Emenda. Atualmente, o cálculo é feito a partir do valor empenhado no exercício anterior acrescido de, no mínimo, o percentual correspondente à variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Traduzindo: com essa mudança trazida pela EC 86, o SUS terá uma perda estimada de R$ 11 bilhões no ano de 2016, podendo chegar a R$ 15 bi, dependendo da crise financeira e econômica no País. Um estudo realizado pelo economista e mestre em economia política pela PUC-SP Francisco Funcia, revela que os ganhos para o financiamento do SUS só deverão acontecer a partir de 2018. Até lá, os estados e municípios terão que arcar com as consequências da redução do repasse federal para garantir a continuidade dos serviços.

“O que fica cada vez mais claro é que está em curso uma subversão do projeto constitucional para a saúde. (…) Como as Propostas de Emenda Constitucional têm que ser assinadas por um terço da Câmara dos Deputados, está ficando evidente que entre os parlamentares há muita gente interessada no desmonte do SUS. Se tal medida prevalecer, haverá um SUS definitivamente de baixa qualidade para os que não podem pagar pela saúde – os pobres, desempregados, aposentados, viúvas, órfãos (…) Garantia de desigualdade de atendimento permitido pela própria Constituição, ferindo o princípio da igualdade do SUS”, diz o manifesto do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) contra as propostas de Eduardo Cunha.

A luta em defesa da saúde pública

A proteção dos planos privados de saúde por Eduardo Cunha e outros deputados e senadores é explicada facilmente: nas últimas eleições (2014), as operadoras de saúde “investiram” R$ 52 milhões em 131 candidaturas de 23 partidos, em todos os níveis.

Esse fato e suas consequências só reforçam a luta pelo fim do financiamento privado das campanhas eleitorais, que compram a política em defesa dos grandes empresários e banqueiros. Também reafirma a luta pelo fim da mercantilização da saúde, colocando sob o Estado a total responsabilidade pela saúde da população e retirando a complementaridade de empresas privadas, que na prática assumem, a um preço altíssimo, a assistência médica da população.

Ludmila Outtes, Recife

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