O melodrama grego do Syriza

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GréciaOs romanos são frequentemente criticados pelos especialistas da história literária por terem deturpado o gênero dramático da ‘tragédia’ grega, transformando-a em um melodrama sem a seriedade, a dignidade e a profundidade filosófica que são próprias das tragédias de Ésquilo e Sófocles. Desde sua eleição, em janeiro deste ano, a Coalizão de Esquerda Radical (Syriza, por sua sigla em Grego) e sua maior liderança e ex-primeiro-ministro do país, Alexis Tsipras, têm cumprido o romano papel de transformar em farsa as legítimas aspirações e vontade de mudança da classe trabalhadora e do povo grego.

O último ato deste melodrama foi a entrega para o imperialismo alemão de praticamente toda a infraestrutura aeroportuária do país, seguida da renúncia de Tsipras como primeiro-ministro para a convocação de novas eleições.

Desde o primeiro ‘pacote de ajuda’ do Fundo Monetário Internacional ao país, em maio de 2010, a Grécia entrou em uma forte crise humanitária, política e social. Todo o resquício de Estado de Bem-estar social foi gradualmente destruído no país. A Classe Trabalhadora e o povo resistiram de maneira heróica a esses ataques com dezenas de greves gerais, manifestações e outras formas de luta.

Até a  chegada do Syriza no poder, em janeiro de 2015, foram aprovados – pelos governos dos sociais-democratas e da direita – dois memorandos com o FMI e quase 400 leis que atacaram os direitos conquistados. O Syriza foi depositário da esperança de transformação construída em todo este processo de lutas. Alexis Tsipras assumiu o poder prometendo revogar todos os memorandos e leis antipopulares, governando para tirar a Grécia desta crise.

O caminho da conciliação

Mas as negociações entabuladas com a Troica demonstraram que a vontade de mudança da direção do Syriza não era verdadeira e passaram a ceder mais e mais aos interesses alemães pensando ser possível conseguir uma posição razoável da parte da União Europeia. Seja por ingenuidade ou puro oportunismo, o Syriza não previu que os imperialistas não ficariam contentes senão com a rendição completa por parte da Grécia.

No momento crítico deste negociação, Alexis Tsipras ensaiou um gesto de altivez convocando um referendo em que o povo grego disse um sonoro ‘Não’ (Oxi, em grego) às exigências do imperialismo alemão. Mas o Syriza insistiu em sua atitude conciliadora e, em menos de uma semana, fez o contrário do exigido pelo povo grego em referendo negociando o terceiro memorando com o FMI e aprovando – agora em parceria com os social-democratas e a direita – novas leis antipopulares no parlamento.

Nem o repúdio de mais da metade do comitê central do Syriza, nem o voto contra de cerca de 40 parlamentares do partido foram suficientes para fazer Alexis Tsipras recuar em sua decisão de impôr o novo memorando. No dia 20 de agosto, após o fundamental das medidas do terceiro memorando terem sido concluídas, Tsipras apresenta sua renúncia na esperança de constituir um governo mais forte e mais à direita nas próximas eleições.

Mais de 25 deputados do Syriza já anunciaram a formação de um novo partido e pretendem concorrer às próximas eleições – possivelmente em 20 de setembro – sob a denominação de Unidade Popular. Este novo partido defende de maneira expressa a saída do Euro e a volta da Dracma como moeda nacional. Já o tradicional partido revisionista no país que têm cerca de 5% do parlamento, o KKE, segue em sua política de denunciar as forças reformistas sem ser capaz de construir uma frente popular capaz de apresentar uma alternativa política à situação.

Dentre as várias lições que ensinam o processo dos últimos anos de luta popular na Grécia, a principal diz respeito ao papel dos acordos e compromissos nessa quadra histórica de forte aprofundamento da crise do sistema capitalista-imperialista. A grande verdade é que os países imperialistas estarão dispostos a tudo para submeter os povos e a alternativa da conciliação só pode nos levar ao caminho da humilhação e do aumento da exploração para o povo.

Sandino Patriota, São Paulo.