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segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

Movimento negro botando a lei pra funcionar

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Diante o contexto de intolerância vivido desde que o país foi assaltado pelos europeus e tomado à força por esses povos, os movimentos sociais se organizam minimamente para não acatar as imposições advindas desta parcela da população que explora e oprime o povo preto. Fruto de muita luta, seja através das insurreições no período colonial ou dos movimentos organizados que atravessaram o império e concretizaram nossa república, alguns passos foram dados em prol da população pobre, preta e periférica, mas muitos outros ainda faltam ser dados.

Não podemos falar em políticas públicas para as negras e os negros sem ao menos ressaltar a importância de todo o movimento africano e do movimento negro da diáspora realizado no período colonial de resistência e concretização das mais diversas relações sociais estabelecidas, seja por meio da Inconfidência Baiana, de 1799, e de revoluções como a Pernambucana, de 1817 e 1823, a Farroupilha, de 1835, a Revolta dos Nagôs, em 1826, dos Quilos-Quilos, em 1874, as insurreições dos Haussas, dos Malês e Tapas e a Irmandade da Boa Morte, na primeira metade do século XIX. Sem contar todos os quilombos, como os de Campo Grande, Grande Ambrósio, Sapucaí, Urubu, Palmares e outros, que realmente expressavam outra maneira de viver, seja no âmbito político, social, econômico ou cultural.

Os entraves da política burguesa de gênero, raça e classe

Outro aspecto que devemos ressaltar, mas que nos coloca em um ambiente mais tênue diante o Estado é a ala abolicionista. Apesar de um posicionamento mais tímido de Joaquim Nabuco perante as instituições, principalmente legislativas da época, na mesma via tínhamos Luís Gama, um advogado sem papas na língua, que em pleno tribunal mencionava que “todo escravizado que assassinava seu senhor praticava um ato de legítima defesa”, a fim de expor a contradição não enxergada pelos intelectuais da época no sistema escravocrata.

É de suma importância frisar o quanto o aparato do Estado nunca esteve a favor da população oprimida, muito menos do povo preto. Antes mesmo da consolidação da Lei Áurea houve a assinatura da Lei de Terras, em 1850, que determinou quem teria direito de possuí-las. Isso implicaria mais tarde num 14 de maio de 1888 sem retratação e reparação histórica que fornecesse oportunidades ao povo negro inserindo-os à sociedade capitalista que se intensificava naquele momento no Brasil, provocando um capitalismo periférico, pela massa de negras e negros sem inserção nesse modelo de relação social, como relata Clovis Moura. A questão racial em nosso país é algo muito dilaceradora, uma vez que nem inserir a população negra no processo produtivo para o lucro da burguesia foi cogitado.

Negritude e redemocratização

Ao passo que as experiências de ressaltar a identidade negra, a negritude, a consciência negra, como vemos na Frente Negra Brasileira, no Movimento Negro Unificado, no Teatro Experimental Negro, dentre outros, e consequentemente o processo de redemocratização, muito seletivo por sinal, fará com que diversos militantes do Movimento Negro, como Lélia Gonzalez e Abdias do Nascimento, se filiem aos partidos levando sempre a questão de gênero, raça e classe em suas pautas e falas.

Esse processo árduo de disputa ideológica culminará em avanços parciais e até mesmo efêmeros em âmbito político, social e econômico. Mas é nessa efervescência de grande ascensão dos movimentos sociais e, para além deles, de toda movimentação quilombola desde os africanos arrastados para o Brasil, que teremos em 2003 uma brecha para a promulgação da lei 10.639, que registra que “nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira” e posteriormente uma modificação sancionará a lei 11.645 de 2008, que relata “nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena”.

Bom, até aí tínhamos uma vitória no papel, como nossos ancestrais na pós- abolição, mas como efetivar esse aprendizado dentro dos ambientes propostos? Quando, ainda por cima, nos encontramos no país da democracia racial regado a ideologias conservadoras e cristãs. Como falar sobre atabaques e agogôs como cultura negra e que não tem nada a ver com Satanás?

Partindo deste entrave, o movimento negro percebe que para além da juventude exposta ao senso comum, os docentes também precisavam realizar um longo período de formação em que o intuito era provocar a desconstrução de tais pensamentos preconceituosos, seja através do repasse de vivências, conhecimentos e orientações para todo esse povo que sofre de uma lacuna na percepção da construção histórica.

Próximos passos da luta

Com esse intuito, e diante da conjuntura política da não implementação destas leis federais em nossa cidade e da tamanha injustiça social e racial, o Fórum de Promoção da Igualdade Racial Benedita da Silva vem colaborando e contribuindo na aplicação da lei federal 10.639/03 e 11645/08.

O Fórum foi fundado em 2012 pelas lideranças e representantes das entidades e associações dos movimentos negros de Diadema (SP). Essas organizações negras há mais de vinte anos vêm se reunindo e discutindo políticas de ações afirmativas e a erradicação de toda e qualquer forma de racismo e de preconceito em Diadema. Como há também outros movimentos e organizações negras, tais como UNEAFRO, UNEGRO, APNs, Coletivo de Hip HOP, etc., vamos todos repercutir a campanha “Reaja ou Será Morto@”.

Apesar de todo progresso, não podemos estagnar. Hoje o povo negro se encontra em sua maioria encarcerado ou morto. Somente a união do povo preto contra esse Estado genocida poderá dar andamento em nossa luta diária.

Texto elaborado pelo Fórum de Promoção da Igualdade Racial Benedita da Silva, de Diadema

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