Cobrança de propinas e todo o tipo de fraudes no setor responsável pelo registro de sindicatos têm impedido, há muito tempo, que diversas entidades de luta cumpram integralmente o seu papel na defesa das categorias de trabalhadores que representam.
A questão é que, para obter o registro sindical, tem-se exigido dos trabalhadores muito mais do que apenas observar as exigências das portarias que disciplinam a criação de entidades. Operação recente e em curso realizada pela Polícia Federal revelou que as propinas chegam a R$ 300 mil.
O registro, que veio para substituir a antiga carta sindical, é condição indispensável para desempenhar determinadas tarefas, como assinar acordos e convenções coletivas, ou ainda propor ações como substituto processual na defesa das categorias que representam.
A operação “Registro Espúrio”, deflagrada em 30 de maio de 2018 pela Polícia Federal, teve início com buscas nas sedes da Força Sindical, da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e nos gabinetes dos deputados federais Paulo Pereira (Solidariedade-SP, também presidente da Força Sindical), Jovair Arantes (PTB-GO) e Wilson Filho (PTB-PB), que só não foram presos porque o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), não autorizou. A lista dos investigados é grande e entre eles estão o deputado cassado Roberto Jefferson (PTB), Ademir Camilo (suplente de deputado do MDB-MG), Dalírio Beber (senador pelo PSDB-SC) e Cidinho Santos (senador licenciado pelo PR-MT).
A operação da PF surgiu a partir de uma denúncia em que estão envolvidos o presidente nacional da UGT e o Sindicato dos Trabalhadores no Comércio Atacadista e Varejista de Material de Construção de São Paulo, segundo a qual a propina cobrada para se conceder ou se negar o registro era de R$ 300 mil.
Mas a fraude e a corrupção rola solta no MTE faz muito tempo: em 2014, a imprensa noticiou as denúncias feitas pela empresária mineira Ana Cristina Aquino, que é dona de duas transportadoras, a AG Log e a AGX Log Transportes e uma das fundadoras do Sindicato dos Cegonheiros de Pernambuco (Sincepe). A empresária revelou que, com a ajuda do advogado João Graça (que ocupou cargo de assessor especial de Manoel Dias – PDT, ex-ministro do trabalho e era pessoa da confiança do também ex-ministro do trabalho Carlos Lupi – PDT), entregou R$ 200 mil ao então Ministro Lupi para a obtenção do registro do Sincepe.
Em 2011, Adeilde Marques contou em entrevista à revista Istoé que foi encaminhada do Ministério do Trabalho para um escritório onde lhe foi cobrado R$ 5 mil para que a carta sindical saísse mais rápido. Em conversa com o então presidente da Força Sindical em Sergipe,Adeilde revelou que foi informada que a carta sindical poderia custar até R$ 40 mil.
Por não estarem de acordo com a venda de registros sindicais, diversas entidades de trabalhadores que já demonstraram condições de vida associativa eficientes (principal requisito para se uma entidade sindical deve existir), organizando greves, manifestações e atuando no dia a dia em defesa das categorias que representam e dos interesses gerais da classe trabalhadora como um todo, sofrem a espera de poderem cumprir integralmente com o propósito para o qual foram criadas.
Exemplos disso não faltam: o Sindlimp-PE, representante dos trabalhadores da limpeza urbana de Pernambuco, é talvez o mais representativo de todos eles. Fundado em 2002 pelos garis da cidade do Recife insatisfeitos com as péssimas condições de trabalho e com os baixos salários, sem ter uma entidade que lutasse pelos seus direitos, criaram um sindicato específico, separando-se do sindicato geral de asseio e conservação que faz a política do patrão até hoje. Tendo organizado diversas greves, o Sindlimp-PE inspirou a fundação, em 2010, do Sindlimp- Caruaru e Região – que é amigo fiel e lutador de todas as horas na defesa dos garis do Agreste pernambucano. Apesar do reconhecimento dos trabalhadores, ambos se encontram com seus pedidos de registro negados pelo MTE.
No Pará, os empregados da limpeza urbana também seguiram a mesma rota: criaram o seu Sindlimp no ano de 2010, mas, até agora, não obtiveram o registro e ainda tiveram que fazer nova assembleia para reafirmar a decisão da categoria, com a promessa de que, atendida essa exigência, o registro seria concedido. Tomara, pois no Ceará o Sindlimp-CE, fundado em 2011, teve o direito de obter seu registro negado.
Em Alagoas o Sindicato dos Empregados em Comércio Varejista de Alimentos (Sindsuper-AL), criado em setembro de 2008, não conseguiu obter sua carta sindical apesar de ter comandado greves importantes. A pressão contra a constituição de sindicatos combativos também tem se voltado contra a existência do Sindicato dos Trabalhadores na Administração Escolar em Alagoas (SAE-AL), criado em 2011; mas a categoria resiste com filiação e contribuição voluntária para manter de pé a sua entidade.
Nem mesmo o Sintelmarketing-PE, representante dos operadores de telemarketing de Pernambuco, fundado em 2009 e que já obteve várias vitórias judiciais reconhecendo o direito de obter o seu registro, teve concedido o registro sindical. A mesma sorte tem amargado os empregados nas indústrias têxteis de Ipojuca e Região, cujo sindicato, fundado em 2012, teve registro negado sob o argumento de que não foi respondida uma correspondência no prazo, o que o sindicato comprova ter feito com documentos que não deixam dúvidas.
Apesar disso, quando não existe outra saída, os trabalhadores não se deixam abater no seu propósito de se organizarem para lutar por direitos e melhores salários: em 2017, servidores federais do Rio de Janeiro criaram o Sindsep-RJ ante a total falta de democracia e o imobilismo da antiga representação da categoria. O pedido do Sindsep-RJ soma-se aos cerca de dois mil pedidos aguardando na fila do MTE somente de entidades fundadas entre os anos de 2016 e 2018.
Ao mesmo tempo em que denunciamos a venda de registros sindicais em Brasília para pelegos financiados pelos patrões, os sindicalistas verdadeiramente interessados na defesa dos trabalhadores devem desenvolver uma luta incansável para garantir melhores salários, condições dignas de trabalho e contra o fim da aposentadoria que o Governo de Temer e dos banqueiros quer impor. Só assim, conseguiremos o principal reconhecimento que um sindicato precisa: aquele que vem dos trabalhadores.
Thiago Santos, presidente do Sintelmarekting/PE e diretor da Fitratelp