Hoje é feriado em todo o país em memória ao dia 15 de novembro de 1889. Neste dia, militares do exército liderados pelo Marechal Deodoro da Fonseca ocuparam as ruas da cidade do Rio de Janeiro e obrigaram a família imperial, liderada por D. Pedro II a partir para o exílio na Europa. O Brasil deixava de ser uma monarquia e passava a ser uma república presidencialista.
Felipe Annunziata
BRASIL – Este processo foi apoiado largamente pelas oligarquias cafeeiras de São Paulo e Rio de Janeiro. Isto porque um ano antes havia sido abolida, após muita luta de escravizados e setores populares do Brasil, a escravidão. Para estas elites a monarquia servia como um instrumento de manutenção desse regime no nosso país. Ao abolir a escravidão, o Império abolia também uma de suas bases de sustentação. Vicente de Souza, um dos primeiros militantes socialistas do país, negro e professor do Colégio Pedro II, já afirmava que junto da abolição deveria vir o fim da monarquia.
As elites brasileiras se assustaram com o tamanho e a amplitude do movimento popular que levou à Abolição em 1888. Greves, passeatas e clubes abolicionistas se formaram nos principais centros urbanos do país. Do Rio Grande do Sul ao Amazonas as pessoas se mobilizavam contra a escravidão, Logo a monarquia não viu alternativa senão a Abolição.
Ao mesmo tempo surgiam vários líderes abolicionistas que defendiam a República. Exemplos de José do Patrocínio, Luiz da França e Silva e do próprio Vicente de Souza já mencionado. Muitas dessas lideranças entendiam que a república deveria vir como uma forma de emancipar o trabalhador nacional, ou seja, que o objetivo dela deveria ser servir ao povo brasileiro e não às oligarquias que por tanto tempo o império defendeu. Com medo desses movimentos a elite escravista cafeeira adere ao republicanismo e vê que não tem alternativa senão aceitar o fim da escravidão.
Golpe Para Evitar Mudanças
Pintura: Reprodução/Benedito Calixto
Diante desse contexto as elites passam a apoiar os militares para que estes derrubem a monarquia. No início da República muitas dessas lideranças socialistas viam que a Proclamação significava um avanço. Finalmente acabava o voto censitário*, o Estado se separava oficialmente da Igreja e o poder executivo passava a ser eleito. No entanto, não vai demorar muito para isso se mostrar uma ilusão.
De início mesmo com o fim do voto censitário, o voto só existia para homens alfabetizados, o que excluía mais de 70% da população do processo político. Logo a população negra passa a ser reprimida com leis “contra a vadiagem” que na prática era maneira do Estado reprimir qualquer manifestação cultural ou política desta população. O samba e as religiões de matriz africana são reprimidas, mostrando que a separação do Estado com a Igreja não era tanta assim.
Revoltas Contra a Miséria e a Verdadeira República
Além disso, os governos de plantão durante a Primeira República sempre pautaram uma política econômica que favoreceu os interesses das elites agrárias do país. A carestia aumentou, a fome era um problema geral e os trabalhadores nas cidades viviam jornadas extenuantes de trabalho. No campo o governo republicano criou mecanismos para fortalecer o poder político dos coronéis (grandes donos de terra ou membros de família com poder político nos estados) e o sistema político e eleitoral passou a ser controlado e fraudado pelas oligarquias. Para o governo, greve era assunto de polícia e sempre reprimiu com toda força esses movimentos.
Assim, os anos da Primeira República foram marcados pelas greves e revoltas de trabalhadores urbanos, camponeses e militares de baixa patente contra os governos de plantão. É o caso da Guerra de Canudos (1896-1897), ocorrida no sertão da Bahia, que foi uma tentativa dos camponeses dos estados do atual Nordeste fugirem da seca e miséria e criarem uma comunidade onde pudessem produzir e viver sem a opressão dos coronéis.
Na capital federal, em 1904, a população se revolta contra as demolições de casas e expulsões de famílias para as periferias na conhecida Revolta da Vacina. Ainda no Rio, em 1910, marinheiros liderados pelo Almirante Negro João Cândido, tomam dois encouraçados da Marinha e se revoltam contra as más condições de vidas e os castigos físicos implementados pelos oficiais na chamada Revolta da Chibata. Nesse momento, acontecem as primeiras grandes greves e os sindicatos tomam forma nas principais cidades. Os trabalhadores pouco a pouco percebem que só com organização e luta conseguirão conquistar direitos. Em 1917 a primeira greve geral acontece e mobiliza mais de 100 mil trabalhadores de São Paulo, Rio de Janeiro e várias outras cidades do país.
A data de hoje não significa a lembrança do surgimento de uma república verdadeiramente democrática no nosso país. O 15 de novembro ainda é a data que significou não a mudança, mas luta das elites para evitar qualquer conquista dos trabalhadores. O verdadeiro 15 de novembro ainda está por vir, aquele dos sonhos de Vicente de Souza e Luiz da França e Silva, onde o trabalhador se emanciparia. A construção de uma outra república, mesmo 130 anos depois, ainda está na ordem do dia. Uma república realmente democrática, dirigida pelos trabalhadores e que garanta uma vida digna e livre para todo o nosso povo.
*Voto censitário: No período do Império só podiam votar cidadãos homens católicos e que tivessem uma renda mínima estipulada pelo Estado. Este tipo de voto e chamado de censitário, pois não permitia que toda a população maior de idade tivesse acesso ao voto.