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domingo, 22 de dezembro de 2024

A COVID-19 e o futuro que se aproxima

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Paciente na sala de espera do Hospital Regional da Asa Norte usando máscara. Sérgio Lima/Poder360 14.03.2020

Wanderson Pinheiro

O senso comum, construído e propagado pela grande mídia e pelas redes sociais, diz que o coronavírus e demais doenças virais são apenas crises naturais, que surgem do nada e sem qualquer explicação. A forma que nos passam faz crer que estamos no juízo final, pois dão uma explicação mística, ainda que com algum conteúdo científico. Mas de onde vem a COVID-19 doença causada pelo SARS-CoV-2?

Existem explicações geopolíticas para o caso. Uma parte dos ultraneoliberais fascistas, afirmam que o novo vírus foi produzido em laboratório pela China, que a China não tem liberdade política e que por isso não conteve o vírus em suas fronteiras. Esta é uma versão pouco plausível uma vez que a China foi quem teve maior prejuízo com a pandemia, que causou milhares de mortes em seu país e grandes prejuízos econômicos. Vale lembrar que a queda do comércio mundial prejudica principalmente a China que tem sua economia voltada prioritariamente ao mercado internacional, gerando grande prejuízo para sua balança comercial. Também não teriam nada a ganhar com a queda geral das bolsas de valores. A China tem muitos interesses em todo mundo, além dos interesses comerciais, interesses financeiros. Promovem uma diversificada e massiva exportação de capitais por meio de empréstimos, financiamento de infraestrutura nos países em desenvolvimento e investimento estrangeiro direto. Portanto, não teriam interesse em promover uma crise mundial.

É verdade que, mesmo tendo todos esses prejuízos, a China saiu fortalecida com o combate que conseguiu fazer à COVID-19, pois alçaram efetivamente a acabar com o vírus em suas fronteiras em apenas 3 meses. Devem assim fortalecer o cinturão e rota da seda, que tem a China como potência. Agora a China investe apoiando os países de sua área de influência a combater o coronavírus, aumentando sua influência em todo planeta e buscando estabelecer modelos diplomáticos fora do sistema FMI-Banco Mundial.

Também não se tem dados suficientes para acreditar que os EUA produziram biotecnologicamente esse vírus em um laboratório. É verdade que os EUA teriam interesses em disseminar um vírus desses na China, causando prejuízos econômicos e sendo uma segunda etapa da guerra comercial em voga. Os EUA foram questionados pela China a respeito da abertura de suas informações sobre como se desenvolveu a contaminação em seu território nacional. Porém, os dados não são liberados pelos EUA, gerando grande desconfiança. No entanto, parece que não exitem informações suficientes e tudo isso mais assemelha-se a uma guerra de informações entre as duas grandes potências mundiais. Os EUA teriam mais a perder do que a ganhar com toda essa situação. De qualquer maneira, o fato é que não se pode concluir que houve uma produção laboratorial do SARS-CoV-2, causador da COVID-19[1].

Descarte-se então a hipótese de uma causa terrorista fabricada, será que restaria crer que foi o acaso que propagou o vírus?

Certamente não. Deve-se perceber que os vírus também têm uma história, que são biológicos e naturais, mas também tem seus aspectos sociais e históricos. Dito de outra maneira, foram em relações sociais historicamente determinadas que produziram o atual estoque viral e precisamos averiguar como isso se desenvolveu. Poder-se-ia levantar, por exemplo, que no século XIX e XX aconteceram inúmeras crises de pandemias com gripes virais e essas crises sempre estiveram relacionadas a concentração populacional nas grandes cidades, as más condições sanitárias e a consequente proliferação e mutação genética ocorrida nesses vírus.

Uma das primeiras epidemias foi a gripe Russa, que teve como ápice os anos de 1889 e 1890, se espalhou pela América, África e Ásia e causou 1,5 milhão de mortos. Em seguida ocorreu a gripe Espanhola durante a primeira guerra mundial e causou aproximadamente 100 milhões de mortes. Esta gripe surgiu nos EUA mas esse a escondeu e a culpa foi posta na Espanha. Passou-se ainda pela gripe Asiática, a gripe de Hong Kong, a gripe suína e a gripe aviária, que mataram milhares de pessoas. A produção capitalista “moderna” com grande concentração nas cidades, com as crises sociais vividas pelas populações mais pobres e as crises de superprodução relativa, são o esteio onde ocorreu a proliferação descomunal de vírus e que levou a morte de milhões de seres humanos.

Não é de se estranhar que a crise viral de 1889 tenha ocorrido justamente no período de auge do imperialismo capitalista, pois esse fazia nessa época a colonização desumana da África e da Ásia e o neocolonialismo imperava na América Latina com igual brutalidade. Menos de três décadas depois, em meio a uma grave crise econômica que culminou com a 1ª Guerra Mundial, tivemos mais uma crise viral sistêmica.

Vê-se então que a COVID-19 tem como tataravó a gripe espanhola e russa, mas tem como causadora uma variação do coronavírus dos anos de 1960. Tem, portanto, um grande potencial de matar milhares de pessoas. Mesmo ainda não havendo evidências científicas para determinar exatamente como, a questão é que houve uma mutação genética, como muitas outras que virão e trarão consequências cada vez mais mortíferas. Porém, também fica claro que além de natural, a causa das epidemias são sociais e estão vinculadas historicamente ao atual capitalismo.

O capitalismo produziu inúmeras armas para combater vírus e bactérias, armas essas que não combatem a raiz do problema. Por isso estamos perdendo essa guerra. Precisa-se enxergar que o problema está relacionado mais com nossa forma de vida que concentra tudo nas grandes cidades, estabelece o consumismo exacerbado e uma produção industrial concentrada tanto no campo quanto na cidade, nas mãos das elites; nas cidades assiste-se milhares de seres humanos morrerem de desnutrição, de fome, da falta de saneamento básico, mortos em enchentes e deslizamentos. Nessas condições, a proliferação viral é inevitável e novas mutações ocorrerão.

Assim sendo, devemos agir socialmente enquanto classe, e pensarmos: que ações devemos tomar para tentar conter a crise de COVID-19?

É evidente que não se pode confiar nesse atual “Estado racional” e nem numa ciência acima das classes para salvar nossas vidas. Exite uma sociedade dividida em classes sociais e deve-se  perceber que os interesses de classes sempre falam mais alto. Tem-se que ter claro que o Estado é burguês, a serviço das elites, e não se preocupa com os direitos e nem com a vida do povo.

Isso fica evidente quando os meios de comunicação e os políticos burgueses pregam a quarentena apenas para a burguesia, visto que estes podem ficar em suas casas repletas de alimentos, com luxúria inimaginável e total conforto. Assim ficarão isolados por meses sem que tenham nenhum problema. Continuarão explorando os operários nas fábricas e os trabalhadores informais que necessitam continuar trabalhando dia e noite, sem folga, sem nenhum dia de quarentena. É verdade que também uma parcela minoritária da classe trabalhadora conquistou a liberação para trabalhar em casa e faz o chamado home-office. São vigiados e cobrados rigorosamente e precisam ficar alerta e defender os seus direitos.

O governo fascista de Bolsonaro faz tudo para burguesia e nada para o povo. Baixaram decreto para beneficiar empresas aéreas e garantir “capital de giro”; decretaram estado de emergência que serviria para liberar o governo de licitações e do teto de gastos, mas já conta com denúncias de corrupção e desvio do dinheiro público; aprovaram que os empresários poderiam cortar os salários dos trabalhadores pela metade, portanto, além de não terem o direito de fazer quarentena, não terão direito de alimentar sua família. Também até o momento não viu-se nenhum investimento em hospitais, em contratação de médicos e muito menos baixar um decreto para que os hospitais privados sejam obrigados a atender a toda população. Bolsonaro e os fascistas estão só esperando a crise se agravar para verem o povo morrer.

Mas voltando a pergunta, o que se deve fazer para salvar o povo dessa situação?

Investir no processo científico é, sem dúvida, fundamental. A ciência é importante e diversos cientistas têm ajudado com informações de enorme valor e vários deles, como ocorre em Cuba, buscam encontrar a vacina sem se preocupar com o que vão ganhar em troca. Mas esse não é o caso dos EUA, Alemanha e França, pois estes se preocupam primordialmente em ganhar lucros e registrar marcas e patentes. Se preocupam ainda em salvar seus monopólios e bancos, mesmo que isso signifique a morte de milhares de seres humanos. Irão mais uma vez querer despejar a crise sobre os ombros e o túmulo dos trabalhadores. É por isso que os cientistas, embora sejam importantes, não podem resolver sozinhos o problema do COVID-19, pois não podem decidir onde serão investidos os recursos públicos; não podem decidir como, para que e onde produzir os insumos; quem decide tudo é a grande burguesia e seus governos que não vacilarão diante da crise na qual se encontram e defenderão seu regime com unhas e dentes, colocando todos os principais recursos a serviço desse sistema.

Também não se pode colocar na responsabilidade dos profissionais de saúde a solução desse problema. Eles são fundamentais no tratamento, no cuidado com as pessoas infectadas e salvarão milhares de vidas. Mas a crise se alastrará e isso se torna a cada dia inevitável, tornando esses profissionais vítimas de uma situação insustentável. Estarão trabalhando em turnos dobrados, com condições ainda piores do que o normal. Já estão trabalhando em muitos casos sem a proteção devida e sobre uma pressão inimaginável.

Somente os lutadores sociais podem resolver essa parada!

Como pode-se a cada dia perceber, a única intenção da burguesia é se isolar do povo e deixá-lo morrer nos guetos e favelas. Assim ocorreu em toda a história do capitalismo, assim ocorreu no processo de urbanização do Brasil já no início do século XIX, onde o povo trabalhador era jogado em cortiços e morria com epidemias aos milhares. A burguesia sempre atuou para isolá-los nos bairros pobres e ficava recolhida para preservar sua vida. Sempre associaram os pobres a sujeira, promiscuidade e ignorância, por isso não queriam vê-los por perto, a não ser para explorar sua mão de obra. É verdade que o vírus não escolhe classe social, por isso eles se apavoram, visto que inevitavelmente alguns deles morrerão. Porém, conseguirão se isolar e se tratar nas melhores condições, o que não ocorrerá para o povo pobre que será descartado como lixo pela burguesia.

Por isso, o mais importante que precisa ser feito é a luta social junto ao povo para salvar vidas e lutar por um mundo melhor. Primeiramente deve-se promover ações de solidariedade proletária nos bairros populares. Trabalhadores e trabalhadoras necessitam das brigadas de solidariedade nos bairros, assim contribuir-se-á para elevar a autoestima e salvar vidas. O próximo mês de abril será crucial para isso, pois será o mês de ápice da crise do coronavírus. Deve-se considerar que o trabalho que fazem os lutadores sociais é tão imprescindível quanto o trabalho realizado pelos profissionais da saúde, pois estes lutam para curar os enfermos, enquanto aqueles lutam junto com o povo para mudar a situação em que se encontram, sendo uma alternativa real para curar toda sociedade.

Praticar a solidariedade aproxima e une o povo e coloca o partido em condições de assumir a vanguarda da luta que virá. Como vanguarda tem-se a obrigação a enxergar um passo a frente dos inimigos de classe e assim apontar o caminho para classe trabalhadora. Começou-se bem quando o partido percebeu corretamente e afirmou, ainda em janeiro de 2020, que o atual governo fascista de Bolsonaro estava ficando a cada dia mais fraco, mas que precisaria ser derrubado. Alguns não acreditaram e outros diziam que era exatamente o contrário, que o governo era fortíssimo. Olhando para frente deve-se facilmente perceber que o passo seguinte será a queda desse governo, que, como outros governos afora, não se sustenta mais. Uma crise política se instalará e pode ser resolvida nos palácios ou nas ruas. Portanto, não se pode medir esforços para levar esta disputa política para o terreno em que os trabalhadores sabem lutar e, podem, portanto, derrubar esse governo por meio das greves, manifestações e revoltas populares. Para isso, é importante que se faça imediatamente o trabalho solidário, mas em seguida precisa-se organizar a luta popular para derrubar esse governo dos fascistas pelas mãos do povo trabalhador.

Evidentemente é indispensável cuidar das vidas dos militantes e da vida de terceiros, acontece que não se fará isso como a burguesia quer, se isolando e não tomando consciência da realidade em que vivemos. O povo morrerá nas favelas e nas filas dos hospitais e é preciso lutar pela vida e pelos direitos. Isolamento sem abrir milhares de leitos, sem dar alimentos, medicamentos, promover socorro aos mais pobres, não passa de uma blindagem para os mais ricos, que ficarão confortáveis com grandes estoques e lucrando com a exploração da mais valia dos trabalhadores.

Os trabalhadores já estão percebendo e precisa-se dizer para eles que façam greve para serem liberados do trabalho e para ter direito a tratamento médico, medicamentos e pagamento de salários integrais. Neste sentido o maior exemplo está sendo dado pelos combativos companheiros do Movimento Luta de Classes (MLC) que estão fazendo paralisação nas empresas de limpeza urbana e telemarketing desde o Nordeste até o Rio de Janeiro e São Paulo. Já conquistaram vitórias importantes como o fechamento da empresa Atendo em São Bernardo do Campo, que paralisou suas atividades com o apoio dos militantes sociais do MLC. Esse exemplo precisa se espalhar e pode ser um prelúdio para greves maiores que virão.


[1]. Estudo publicado na revista Nature Medicine, que analisou diversas características genômicas e bioquímicas do novo SARS-CoV-2, demonstra a improbabilidade do vírus ter sido criado em laboratório. As duas hipóteses principais são:

1) Evolução através de seleção natural ainda nos animais hospedeiros (como morcegos e pangolins – um mamífero em extinção, semelhante a um tatu);
2) Ou evolução através de seleção natural em humanos, após infecção por um progenitor do SARS-CoV-2.

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