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domingo, 22 de dezembro de 2024

A situação dos trabalhadores da FLEX e o coronavírus

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Por Redação Santa Catarina

A COVID-19, já infectou 666.718 no mundo, das quais 31.196 morreram. No Brasil, foram registradas 117 mortes e 4.006 casos da Covid-19, sendo preciso considerar que o Brasil é um dos países que tem feito o menor número de testes para COVID-19, o que significa que os dados oficiais representam um número menor que a realidade dos afetados pela doença. A Itália, país que tardou em tomar as devidas precauções na prevenção a doença, registrou o recorde de 969 óbitos apenas em um dia, e nos Estados Unidos, os casos já ultrapassam a cifra de 100.000 infectados.

Já é sabido que a COVID-19 não é uma mera “gripezinha”. Contudo, na contramão da orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de inúmeras entidades competentes, o governo federal, na pessoa de Jair Bolsonaro, vêm menosprezando de forma criminosa o risco que o povo brasileiro, e em especial a classe trabalhadora, vêm sofrendo. Essa postura se reflete no posicionamento do governador de Santa Catarina, Carlos Moisés (PSL), um dos primeiros a decretar quarentena, mas que bastou uma reunião com o empresariado catarinense para afrouxar as medidas de segurança à saúde dos trabalhadores. E isso se exemplifica também no caso da empresa de telecomunicações FLEX, que um dia após o pronunciamento de Bolsonaro na última terça-feira (24/03) já começou a retomar as suas atividades. 

A Unidade Popular pelo Socialismo (UP) – SC e o Jornal A Verdade estiveram presentes durante o dia 25 e 26 deste mês na sede da empresa FLEX localizada na rua Dibb Mussi no centro de Florianópolis para realizar panfletagem sobre a COVID-19 e denunciar o descaso da empresa e do poder público para com a vida de centenas de trabalhadores. A Unidade Popular realizou uma denúncia ao Ministério Público do Trabalho e gravou um vídeo de denúncia que foi divulgado nas redes sociais, que obteve grande repercussão nacional, atingindo milhares de visualizações. Dezenas de denúncias e relatos vindos de trabalhadores das diferentes unidades da empresa FLEX em Santa Catarina e São Paulo chegaram à redação do jornal e à Unidade Popular. Compartilharemos algumas mantendo o anonimato dos trabalhadores e trabalhadoras, para sua própria segurança.

Aglomeração no transporte fretado

A denúncia que recebemos em maior quantidade foi em relação ao transporte fretado que leva e busca os trabalhadores. Os ônibus fretados que estão cumprindo esse serviço são do tipo de turismo, que tem a característica de não ser possível abrir as janelas, fazendo com que os trabalhadores corram mais risco de contaminação durante o trajeto. 

ônibus fretados sem ventilação adequada são uma das principais preocupações dos trabalhadores da FLEX.

Aglomeração no refeitório

Muitas denúncias vieram também da preocupação dos trabalhadores em dividirem todos o mesmo refeitório. A separação entre as mesas não é suficiente para impedir a contaminação. Além disso todos os trabalhadores utilizam as mesmas torneiras para encher as garrafas d’água e o mesmo refrigerador para guardar todas as marmitas. Se uma pessoa infectada entra em contato com algum desses lugares, as garrafas d’água e os alimentos de todos correm risco. 

Aglomeração, bebedouros e refrigeradores compartilhados são preocupações dos trabalhadores 

Sala de operações

A empresa, devido ao risco de contaminação, deve garantir aos trabalhadores o espaçamento seguro entre as P.As (P.A, ou Posição de atendimento, é o nome do local do teleatendimento). A empresa implementou a política de deixar uma P.A. vaga entre cada trabalhador, mas inúmeros trabalhadores relataram que não é isso que vem acontecendo. Além de casos em que a distância não foi respeitada, o que acontece é que a P.A. vaga não garante a não contaminação, uma vez que existem muitas fileiras de mesas e que a distância entre as fileiras é muito pequena. Outro caso que preocupa a categoria é que os auditores, funcionários que passam em todas as posições para acompanhar o processo de vendas, circulam entre os operadores. “Se um auditor estiver contaminado, todos nós estamos!” afirma uma trabalhadora. 

Em registro feito essa semana, observa-se o descumprimento do espaçamento entre PAs

Violência contra o trabalhador

O ambiente de empresas de telecomunicações é marcado pela rigorosidade, pelo desgaste emocional de seus trabalhadores, que muitas vezes acabam desenvolvendo ansiedade e depressão. Agora, sendo forçados a trabalharem em meio a uma pandemia global, esse quadro se agrava, como exemplificam inúmeros relatos de trabalhadores que entraram em contato com o Jornal A Verdade e com a UP: 

“Eu já chorei de ansiedade, com medo de ir trabalhar e ficar doente. Mas eu não falo isso pra ninguém, eu tenho uma família pra sustentar e tenho medo de me demitirem”

“A nossa profissão já é difícil, as pessoas se irritam e a gente tem que ouvir um monte de desaforo. Agora sair de casa, correr risco de vida e ainda ouvir um monte de desaforo é demais! E tem clientes que eu ligo e eles perguntam o que é que a gente ta fazendo ali, que era pra gente tá em casa. E eu concordo, tem que dizer isso pra empresa”. 

“Eu trabalho na FLEX em São Paulo, e passei mal dentro da operação, porque estava trabalhando doente e acabei contaminando uma pessoa próxima a mim, e eles [empresa] não ligam, somos só números! Dizem que não queremos trabalhar, que somos preguiçosos. Que deveríamos sair de cabeça erguida pedindo as contas ao invés de “dar show”. [Para a empresa] nós não temos valor!”

“É lamentável vivenciar uma realidade dentro da empresa sendo que seus pronunciamentos não condizem com a prática. Estabelecer como limite que 4 pessoas utilizem o elevador por vez, sendo que mais de 50 pessoas transitam pelo mesmo meio até os outros andares, assim como utilizam os mesmos banheiros, escadas, refeitórios. As aglomerações ocorrem principalmente nesses momentos” . 

““Eles consideram call center serviço essencial, mas a maioria de nós faz um serviço “ativo”, a gente liga pra vender coisas! Isso não é serviço essencial! É uma ironia, vender seguro de saúde que nem cobre o coronavírus num momento como esse””

Considerando todos esses relatos que demonstram um pouco da realidade diária dos trabalhadores do telemarketing, o absurdo que é a situação em que se encontram, e também analisando o que vêm acontecendo de modo geral em nosso país, podemos ver claramente dois pólos de interesse, necessariamente contraditórios:

O primeiro, que alega priorizar “a economia”. Nesse primeiro polo, se encontram figuras como Jair Bolsonaro, diminuindo a gravidade da doença em rede nacional e o governador de SC, Carlos Moisés; Roberto Justus, um dos mais ricos milionários do Brasil, que está de quarentena, e alegou que o vírus “só” mata velhinhos e doentes, e que “na favela não vai acontecer p*rra nenhum se entrar o vírus, pelo contrário”; Luciano Hang, conhecido como “véio da Havan”, apoiador do Bolsonaro e que mobilizou carreatas vanguardeadas por Porsches e Audis pelo fim da quarentena em SC, ou seja, exigindo de dentro de carros protegidos que os trabalhadores voltem a aglomerar-se no transporte coletivo e na empresa; Junior Durski, dono da rede de restaurantes Madero e Jeronimo Burger, que alegou que “não podemos [parar] por conta de 5 ou 7 mil pessoas que vão morrer”, dentre outros donos de grandes empresas que não pensam a vida para além de suas taxas de lucro.

Luciano Hang grava vídeo menosprezando pandemia e defendendo exposição dos trabalhadores 

É mentira, porém, que esses senhores defendem a economia. O que defendem é unicamente o lucro dos grandes empresários. Se defendessem verdadeiramente a economia do nosso país estariam pautando a suspensão e auditoria da dívida pública, que desvia quase 40% de toda a riqueza de nosso país em juros e amortizações para o bolso de banqueiros, a implementação de impostos progressivos para reduzir as injustiças econômicas com a população mais pobre, e a revogação da Emenda Constitucional que congelou os investimentos em setores essenciais como saúde e educação. Para esse grupo de pessoas, os trabalhadores são apenas números: podem ser demitidos, podem ganhar apenas um salário mínimo ou menos, podem inclusive morrer por conta do COVID-19, caso isso seja necessário para garantir seus interesses. 

No outro pólo estão os milhões de trabalhadores brasileiros e seus filhos, pais e avós. Pessoas que trabalham no telemarketing, na construção civil, professores, profissionais da saúde, da limpeza urbana, enfim, nós, os que movemos de fato esse país. Para essas pessoas, fica claro que a economia do Brasil não depende do trabalho de Luciano Hang, Roberto Justus, Junior Durski, ou mesmo dos donos da FLEX: a economia do país depende do nosso trabalho! Logo, não somos descartáveis e não deixaremos nenhum dos nossos morrer pelo lucro de um punhado de parasitas. Exigimos condições dignas de trabalho, exigimos saúde e queremos viver! A UP se solidariza com os trabalhadores das telecomunicações e está lado a lado na luta por melhores condições de trabalho e pelo direito a quarentena! E é por isso nos unimos enquanto classe trabalhadora: para lutar por nossos direitos, pela nossa vida e para que nosso país não seja governado por nossos assassinos. Lutamos pelo povo no poder!

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