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sexta-feira, 26 de abril de 2024

Covid-19: Estado não controla número de infectados e mortos

Foto: Reprodução / Arquivo

Por Felipe Galisteo e Julia Batista

A gravidade da situação ocasionada pela pandemia do novo coronavírus não é novidade alguma para quem acompanha o noticiário. Essa matéria, portanto, não pretende colaborar com a disseminação de pânico promovida por boa parte da grande mídia tradicional e muito menos diminuir o problema de forma a reduzi-lo a uma ‘simples gripezinha’, como quis fazer acreditar a figura fascista e incompetente que neste momento ocupa o cargo de Presidente da República. Buscamos trazer aqui informações coletadas diretamente de profissionais da área da saúde que entrevistamos, tomando as necessárias medidas de distanciamento e higienização, de forma a estimular a racionalidade e a necessidade de organização popular para enfrentarmos o que virá pela frente. Também entrevistamos um jovem provavelmente infectado, mas que, como a maioria das pessoas no país, teve negado o direito ao teste. Importante frisar que os nomes dos profissionais entrevistados aqui foram alterados por pedido dos mesmos, a fim de mantê-los sobre anonimato, para não causar qualquer tipo de desconforto. Os locais de onde obtivemos os depoimentos foram as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) da Vila Assis e da Vila Magini, bem como o Hospital Nardini, em Mauá/SP, recorte esse que se dá por ser a cidade onde vivemos, mas que certamente espelha o que se passa em outras cidades do país.

A primeira coisa que percebemos, e isso nos surpreendeu, foi ver as UPAs com pouquíssimo movimento e uma tenda montada do lado de fora, igualmente esvaziada. Essa, nos garante a enfermeira Rosana, não era a situação até a semana retrasada. “As tendas foram montadas aqui do lado de fora há uns 10 dias porque no começo havia um acúmulo muito grande de gente dentro da unidade. Mas agora o movimento diminuiu. A maioria está respeitando o isolamento social.” Mas antes que façamos uma nova pergunta, ela emenda: “Parece que agora tudo é esse Corona, mas as pessoas têm outros problemas de saúde, que também são graves e estão sendo colocados de lado. Acho que todos estão com medo de vir aqui e pegar a doença”. A médica Carolina, diferente de sua colega enfermeira, não vestia luvas, colete e também não usava máscaras. “Não é necessário enquanto não estou em atendimento.” Indagamos se há material de segurança para todos e ela responde que “sim, por enquanto não falta nada, mas para garantir que não falte mesmo prefiro usar quando for realmente preciso”.

Perguntamos sobre a quantidade de casos, mas a resposta não é segura “Não temos como saber o número de casos. Não há testes”. Isso nos espanta e a médica continua “Seguimos a recomendação do Ministério da Saúde de testar só os casos graves. Pessoas jovens que chegam aqui com os sintomas pedimos que fiquem em casa se preservando, porque não há nenhum tipo de remédio para tratar dessa doença”. Perguntamos então, com base na informação que temos sobre a necessidade dos respiradores para manter vivos os pacientes mais graves, se eles existem em quantidade suficiente. “Sim, o respirador é essencial. Para o número de casos de agora sim, temos respiradores. Mas vai faltar se a doença crescer como se projeta”. Questionamos então o que podem ser considerados casos graves, ao que ela nos garante “Falta de oxigenação no sangue”. Queremos saber então quais são os protocolos médicos seguidos para identificar isso. “A pessoa chega aqui com síndrome gripal e vai para a triagem, onde faz o teste físico. Somente em caso de percepção de alteração respiratória é que pedimos raio X. Em caso de alguma alteração neste exame, pedimos a tomografia e, identificado um problema, testamos para COVID-19”, completa Carolina. “Nesses casos, a pessoa já é encaminhada para um Hospital maior, como o Nardini ou o Mário Covas. Às vezes as pessoas não acreditam que não estejam com a doença, querem um teste, mas não temos como fazer”. Nem o teste rápido, indagamos, ao que ela responde “Esse nunca tivemos aqui e ele também não é eficaz. No começo se testou todos os casos, mas depois isso se tornou impossível e a orientação que veio é de testar apenas os casos graves”, conclui. A enfermeira Rosana complementa: “Antes os resultados dos testes ficavam prontos em 1 dia… Hoje leva até 1 semana. Às vezes o paciente morre sem que tenhamos o resultado”. Perguntamos então se nesse caso é verdadeiro afirmar que é impossível saber o número de casos. “Sim, não tem como saber. O único jeito seria seguir a Organização Mundial de Saúde e testar todos os casos suspeitos. Os números de infectados e de mortes que são divulgados pelos governos não são reais”, finaliza a médica. Questionamos ainda se elas sabem dizer se nos hospitais particulares se passa a mesma situação. “Eu trabalho na rede particular também. Aqui sou terceirizada. É a mesma coisa lá. Não há testes.” Digo então que o governador de São Paulo, João Doria, havia anunciado nos jornais que SP faria até 2 mil testes por dia. “Eu vi que ele falou. Mas isso não chegou até agora para nós”, finaliza a médica.

A falta de aplicação do teste gera inseguranças e aumenta a possibilidade de transmissão pela falta de isolamento adequado. É o caso do Bruno Costa, de 23 anos, que teve dificuldades em ser atendido, mesmo apresentando todos os sintomas. Bruno tinha coriza, febre, sentia dores de cabeça e no corpo, além de inflamação na garganta e tosse seca, com início de dificuldade respiratória. Ao procurar ajuda, percebendo a lotação nas unidades públicos de atendimento, e sabendo da falta de aplicação de testes, se encaminhou ao atendimento privado, no Hospital América, em Mauá, onde recebeu resposta semelhante, quando na triagem seus sintomas foram considerados leves, não graves o suficiente para aplicação do teste ou mesmo realização de exames.

O mesmo recebeu a recomendação de permanecer em casa, apesar de ter contato direto com familiares. “Não dá pra garantir a segurança da sua família e próximos”, afirma Bruno. Ele é só mais um caso suspeito do COVID-19 que não foi identificado, assim como de milhares de brasileiros que não receberam o direito ao teste e seguem nessa dúvida, por vezes não realizando o isolamento com a seriedade necessária.

O isolamento é garantidamente a medida mais eficaz de evitar o contágio, mas o mesmo é dificultado por empresas e patrões irresponsáveis, que priorizam o benefício próprio em vista da saúde do funcionário, pela falta de instrução, ou por estímulo do próprio Presidente da República, que afirma que a economia não deve parar em razão de uma pandemia de caráter mundial. A banalização ou impossibilidade de isolamento faz com que os casos se multipliquem rapidamente, sem o controle eficaz dos governos, mesmo na cidade de Mauá, onde o prefeito Átila Jacomussi tem se mostrado totalmente inoperante durante essa crise, o que já se tornou comum em todo o seu mandato.

Segundo Silvia, enfermeira do Hospital Nardini, os casos graves em isolamento na UTI subiram de 80 para aproximadamente 400 em poucos dias, sendo os casos mais graves, onde a entubação é necessária, encaminhados ao Hospital Mário Covas. “O nosso problema maior são as pessoas assintomáticas”, afirma a enfermeira, pois as mesmas são mantidas fora do isolamento adequado e acabam infectando pacientes saudáveis. O Nardini vinha enfrentando uma fase constante de desabastecimento de materiais básicos, que foi suprida em meio à pandemia, mas a falta de instruções claras de procedimentos para o corpo de enfermeiros resultou em algumas contaminações entre eles, evidenciando o desmonte e má administração da instituição, e descaso com seus funcionários. “Os profissionais da saúde estão na linha de frente no combate à pandemia, e merecem e necessitam de amparo e boas condições de trabalho para continuar nessa guerra”, conclui a enfermeira.

Como se vê claramente nesses depoimentos, as palavras do governador do estado de SP, João Dória, não são confiáveis, tanto no que diz respeito ao controle da doença, que segundo ele estaria numa curva descendente (o que é impossível afirmar com exatidão), quanto nas promessas que faz em relação aos números de testes oferecidos à população. A verdade é que não há controle real sobre o número de casos, tanto de pessoas infectadas, quanto do número de mortos, não podendo se definir com precisão a letalidade da COVID-19 e nem mesmo sua velocidade de contágio. Nesse sentido, e isso não são palavras nossas, mas dos especialistas em saúde, o isolamento social é a única arma de controle da doença. Ou seja: as empresas de serviços não essenciais que mantém os trabalhadores realizando suas atividades normalmente são tão irresponsáveis quanto Bolsonaro ao afirmar que a COVID-19 não é grave e estão expondo as pessoas aos riscos incalculáveis dessa doença e acelerando a propagação da mesma. Do mesmo modo, o governo de SP, ao afirmar que o número de casos está em redução no estado parece apenas desejar acelerar a volta a uma rotina normal, demonstrando do mesmo modo que o governo federal, mais preocupação com a economia do que com a vida humana.

O que fica evidenciado na situação de pandemia do coronavírus é a incapacidade do sistema capitalista em gerir questões essenciais da vida humana, como o acesso à saúde de maneira universal e qualificada. Em nosso país, o Sistema Único de Saúde (SUS) sofre há anos com o corte de investimentos na área, com o governo Bolsonaro e o Congresso Nacional articulados claramente em manter abarrotados os cofres dos planos privados de saúde que tratam a vida como mercadoria, enquanto o sistema público é deteriorado dia após dia, expondo profissionais da saúde e pacientes ao sofrimento constante. Vale lembrar que em pouco mais de 1 ano de mandato, Bolsonaro retirou 9 bilhões de reais do SUS, demitiu 10,6 mil agentes comunitários de saúde, extinguiu outros 14 mil postos de trabalho na área da saúde, além de encerrar os contratos de 11 mil médicos cubanos que, com sua experiência elogiada no mundo inteiro, poderiam estar contribuindo enormemente para o combate à COVID-19.

Além disso, não podemos deixar de falar da incapacidade governamental em lidar com um problema que se aproximava do Brasil a passos largos e que não obteve como resposta nenhum plano emergencial para solucioná-lo, e sim o completo descaso com a população. Tivemos cerca de 2 meses para analisar o que se passou na China e pelo menos 1 mês para ver o desenvolvimento da doença na Itália, por exemplo, e nada foi feito de modo a antecipar a situação em que estamos. Todas as medidas tomadas desde então se detém primordialmente em resolver os problemas econômicos, mas não os da população mais pobre e vulnerável, e sim para beneficiar os grandes empresários e banqueiros, que organizam carreatas nas ruas para exigir que os trabalhadores se exponham à contaminação para que os patrões continuem lucrando, enquanto ameaçam o povo com o desemprego e a fome. Ou seja: não bastasse ter que enfrentar bravamente o medo da doença e da morte, os brasileiros precisam enfrentar outro adversário, que é esse desgoverno fascista de Bolsonaro, totalmente incompetente, inoperante e incapacitado para ocupar o cargo que ocupa.

Basta! Não podemos contar com as autoridades que comandam o país, pois seu único interesse é o interesse da burguesia. Não podemos acreditar nos números que são informados oficialmente pois eles mascaram a realidade, não condizem com a situação vivida dentro dos nossos hospitais por aqueles que estão no dia a dia lutando para salvar a vida do nosso povo. Somente a luta para paralisar completamente o trabalho em serviços não essenciais e a organização popular e solidária para ajudar os mais vulneráveis, além da consciência sobre a importância do isolamento nesse momento, podem preservar o povo brasileiro contra a pandemia do coronavírus.

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