Foto: Ricardo Medeiros
Victoria Cruz
Produtora no Coletivo A baixada Grita Arte e ativista do Movimento Negro Perifa Zumbi – Rio de Janeiro
“Às quatro da manhã ele acordou, tomou café sem pão, e foi à rua, pôr o bloco pra desfilar” (4 da manhã, Criolo)
A realidade do povo brasileiro é diariamente colocar seu bloco na rua e entrar no seu interminável movimento pendular. Seu carro principal é o corpo e a força de trabalho, e a conquista da batalha é o alimento sobre a mesa.
Não é fácil vencer todos os dias; não é sempre que alguém contribui com o artista do vagão ou que ele não é retirado pelos seguranças. Não é todo dia que sua mercadoria não é apreendida ou que a bala do racismo não o encontra. Não é todo dia que uma pandemia o deixa sair de casa.
É compreensível para o mundo que certos serviços são a base para as nossas necessidades e precisam ser mantidos, mesmo que às vezes em estado de alerta como o que estamos vivendo hoje. Estes serviços são realizados em sua maioria por favelados e periféricos, ou seja, pelos pretos invisibilizados pela sociedade.
Estes só não são ignorados pelo governo e pelos patrões quando as empresas precisam de força de trabalho e mão de obra. Apesar de vários fatos estarem sendo reafirmados nessa matéria, um precisa ser destacado: as doenças ocupacionais.
Os supermercados, por exemplo, são alguns dos setores da economia que estão sendo mantidos em meio a essa pandemia. Não é preciso muito para visualizar diversas negligências e o total desamparo dos empregados nos seus ambientes de trabalho, colocando a saúde destes em risco.
De acordo com o Ministério da Saúde e s Secretária de Estado da Saúde do Rio de Janeiro, as empresas que trabalham com atendimento e mantém o funcionamento devem rever suas instalações, para proteger não só seus funcionários, mas também seus clientes, uma vez que evitar a propagação do vírus é uma responsabilidade de todos.
Tendo em vista que o novo coronavírus é propagado por meio de contatos físicos, gotículas respiratórias, na troca de objetos como o dinheiro, entre outros, existem precauções que são indispensáveis, como o distanciamento entre as pessoas, luvas para quem movimenta dinheiro, máscaras e higienização constante.
Tudo isso é ignorado pelos responsáveis de uma das filiais do supermercado Supermarket, na Pavuna, Zona Norte do Rio de Janeiro. Aglomerações são diárias e o terror escancarado nos rostos das atendentes de caixas também.
Uma cliente resolveu manifestar seu incômodo com a situação através do SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor). Depois de algumas tentativas frustradas, teve retorno do gerente, que prometeu tomar uma atitude em um futuro próximo e tentou justificar o cenário com a desculpa de “terem tido pouco tempo hábil para a adaptação do serviço em uma situação de pandemia”, mesmo com todos nós tendo ciência de que estamos há aproximadamente um mês nesta situação.
Fazer barulho baixo, médio ou grande assusta. Pode parecer que se tem pouco a fazer nesta quarentena. Mas, como informação e leitura, somos pessoas dispostas a conquistar o que é nosso.
Então, para vocês que se perguntam como ajudar e se organizar socialmente nesta quarentena todos os dias, conversem com os caixas, motoristas, trabalhadores em geral, caso tenham acesso a eles. Hoje, nós temos a oportunidade e o dever de despertar e compartilhar conhecimento e informações. Neste caso, uma ligação pode ter mudado um cenário. Questionem-se: quantas ligações ou denúncias podem e devem ser feitas por nós?