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sábado, 2 de novembro de 2024

O que Biritiba Mirim revela sobre a exploração do trabalho?

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EXPLORAÇÃO – Empresa Green Vegs Agropecuária, em Biritiba Mirim, explora trabalhadores desumanamente. (Foto: Reprodução)
Indústria alimentícia Green Vegs Agropecuária obriga trabalhadores e trabalhadoras a trabalhar por 14 horas diretas por apenas R$50,00 em meio a pandemia do coronavírus.
Thales Caramante

MOGI DAS CRUZES (SP) – Após a aprovação da Reforma Trabalhista em 2017, um fenômeno de exploração da força de trabalho da classe operária tomou nova forma em nosso país através da precarização de leis trabalhistas e consolidação irrestrito da exploração intermitente do trabalho.

Essa afirmação acima se consolida desde os grandes centros urbanos e nas capitais do país, como também em cidades interioranas e metropolitanas da capital paulista, na região do Alto Tietê.

Em Biritiba Mirim, a empresa alimentícia Green Vegs Agropecuária é responsável por aplicar um modelo de exploração do trabalho semelhante as que aos primeiros operários ingleses sofriam nas primeiras indústrias à vapor. Isto é, a empresa demanda e obriga seus – entre 40 ou 50 – trabalhadores a trabalhar por 14 horas diretas e os paga apenas R$50 por toda riqueza que produziram.

“Minhas mãos estão cheias de produtos químicos”

Mesmo trabalhando 14 horas, um trabalhador, que ainda estava em fase de experiência, preferiu não se identificar, relatou ao Jornal A Verdade sua condição de trabalho: “Hoje eu trabalhei 14 horas por R$50,00. Estou me sentindo um herói e um coitado ao mesmo tempo.”

Além das horas de trabalho, o operador de máquinas também relatou que exerceu funções além do que tinha sido combinado: “Eu fui fazer uma experiência em uma distribuidora de hortaliças [Green Vegs Agropecuária], fiquei operando as máquinas que higienizam as verduras, e depois ajudei a embalar, carregar caixa etc., muitas coisas além da que eu fui trabalhar.”

Junto a isso, há também uma relação de trabalho muito semelhante aos capatazes com escravos em engenhos de açúcar. “A empresa fica nos confins de Biritiba Mirim, os trabalhadores dependem exclusivamente do ônibus que só chega quando os patrões acionam. Dessa forma, são obrigados a cumprirem horas extras.”

Desgastado, o operário lamentou ainda as péssimas condições de segurança de trabalho que o colocaram em condições de exposição química: “meu corpo fez muito pela sociedade, minhas mãos estão cheias de produtos químicos.”

“A maioria lá são mulheres mães”

Explorando as diferenças de gênero, a classe burguesa paga, em média segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 20,5% a menos de salários para as mulheres em relação aos homens. Uma redução ascendente, a medida em que a precarização das condições de trabalho avança no Brasil e torna mais trabalhadoras em terceirizadas, sujeitas a baixos salários e a poucos direitos.

Na empresa Green Vegs Agropecuária, essa realidade se amplia de maneira evidente, já que “a maioria que trabalha lá são mulheres, mulheres mães que não tem escolha de emprego e precisam sustentar a casa, marido e filho. Eu falo isso com propriedade porque minha mãe trabalhou nisso a vida toda” – relatou o operário.

“A volta dos carrascos”

Mesmo trabalhando até a exaustão, o operador de máquinas ainda relatou que após uma pequena pausa para ir ao banheiro, seu patrão agiu de maneira ameaçadora e arbitrária com ele.

“Estava eu e um outro rapaz, eu pensei que iria voltar para a casa lá pelas 17h00, mas depois que passou das 18h00 eu comecei a trabalhar muito irritado. Eu estava trabalhando muito, sei que não é coisa da minha cabeça, eu aprendi a trabalhar até que bem rápido, o que me permitiu operar as máquinas com bastante organização, então eu trabalhei muito. Esse meu colega estava trabalhando no barracão, então o trabalho dele era bem mais pesado… ele arrastava caixa, cortava alface, lidava com as verduras ruins etc., nossa, o trabalho dele era um saco, era muito mais difícil que o meu. Chegando às 22h00, a gente estava inconformado com tudo que tinha acontecido.”

Exausto, o operário continua: “eu não queria mais trabalhar mesmo, já tinha passado das 20h00 e independente se eu trabalhasse mais ou menos eu iria continuar recebendo apenas R$50 pelo dia… por que eu iria continuar me matando por isso? Chegando no banheiro, o patrão foi atrás de mim, porque ele notou minha falta, perguntou irritado e ironicamente ‘já fecharam o dia?’ e bateu a porta muito forte na nossa cara.”

“Operário não tem sangue de barata”

Mesmo tendo um patrão que age como um carrasco com um chicote que obriga todos os trabalhadores a morrer na máquina, o operador saiu da empresa exigindo respeito com seus direitos.

“Ao escutar aquela batida de porta, eu me virei para meu colega e afirmei que ‘aquilo não vai ficar assim’, eu sou ruim, eu não tenho sangue de barata… tirei meu EPI, minha bota, coloquei meu tênis e fui lá fora atrás do [carrasco]. [Revoltado], perguntei a ele como que ‘tinha coragem de perguntar se eu fechei o dia sendo que você está me pagando R$50 e eu já trabalhei muito mais que 8h00 pra você? Como que você tem coragem de fazer isso comigo e com outros trabalhadores? Como que você tem coragem de continuar enriquecendo fazendo nada?”

Protestos individuais, espontâneos e políticos

Segundo Vladimir Lênin, revolucionário russo, o movimento espontâneo contra os patrões é uma decorrência direta da perda de fé dos trabalhadores na “inamovibilidade do regime que os oprimia. Assim, começavam… não direi a compreender, mas a sentir a necessidade de uma resistência coletiva e rompiam resolutamente com a submissão servil às autoridades. Mas isto, contudo, era mais uma manifestação de desespero e de vingança do que uma luta.”

O caso de Biritiba não pode ser olhado isoladamente do que acontece com a maioria da classe trabalhadora em nosso país. O que foi relatado se mostra como um preludio de uma ação espontânea à exploração ininterrupta, porém essa ação hoje se mostra somente no horizonte, o que relatou-se foi uma ação individual que tende ser coletiva a medida em que a classe trabalhadora passa a ver que sua realidade é insuportável.

Lênin ainda ressalta que esse é o movimento natural de um movimento jovem de trabalhadores, pois “a história de todos os países testemunha que a classe operária, exclusivamente com as suas próprias forças, só é capaz de desenvolver uma consciência sindicalista, quer dizer, a convicção de que é necessário agrupar-se em sindicatos, lutar contra os patrões, exigir do governo estas ou aquelas leis necessárias.”

Porém, segundo Lênin, o movimento político é superior em comparação com a ação individual e com a ação espontânea das massas, pois é o único protesto a acabar com a exploração real. Para que um movimento possa crescer e ter mais mobilidade e organicidade, é necessário, segundo o revolucionário, superar as demandas puramente econômicas e passar às reivindicações políticas, que ampliam o debate para desde questões do poder, modos de produção, relações de produção etc., quando a demanda real dos trabalhadores passa a ser o socialismo.

A Unidade Popular Pelo Socialismo (UP) em Mogi das Cruzes e na região do Alto Tietê endossa as orientações políticas de Lênin, clarificando ainda “a necessidade de fazer agitações na frente de empresas que exploram a classe trabalhadora de maneira tão violenta como essa. Devemos estar organizando mais protestos e manifestações exigindo redução das jornadas de trabalho, coisas que nos lembram do século passado… devemos exigir contratação de mais funcionários, dinamizar as funções, pagar mais a quem trabalha mais, essa é a política que o povo precisa.”

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