Carolina Vigliar e Carolina de Mendonça
“Como pode um povo vivo viver nessa carestia? Como poderei viver dia e noite, noite e dia, com a barriga vazia?” – Palavra de ordem cantada pelas mulheres do Movimento Contra Carestia.
SÃO PAULO – As mulheres sempre estiveram presentes nas lutas importantes da nossa história. Na década de 1970, mulheres das periferias da Zona Sul de São Paulo iniciaram um grande movimento popular durante a ditadura no Brasil. O Movimento Contra o Custo de Vida, ou Movimento Contra Carestia foi um dos maiores movimentos populares do nosso país, organizado principalmente por mulheres pobres.
Esse movimento teve sua origem nos clubes de mães, criados em 1972 dentro das Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica. “As mães da periferia de São Paulo, que mais sentem a realidade da vida, vêm pedir aos senhores que tomem providência para baixar o custo de vida, porque o Brasil é uma terra tão rica e as mães choram na hora de pôr a panela no fogo pra fazer a comida pros filhos”. É assim que tem início o documento que deu origem ao movimento!
Começam sua atuação realizando uma pesquisa em mais de duas mil casas sobre o custo de vida. Na época, assim como hoje, os alimentos tiveram seus preços elevados. As mulheres então organizam um abaixo-assinado pedindo o congelamento do preço dos alimentos e artigos de primeira necessidade, além de mais creches e escolas. A essa altura, esse movimento extrapola a Zona Sul de São Paulo e ganha parte da periferia da cidade e região metropolitana.
No dia 27 de agosto de 1978, mais de 20 mulheres se reúnem na Praça da Sé para uma entrega simbólica desse abaixo-assinado contra a carestia, que coletou mais de 1 milhão e 300 mil assinaturas e contra a política econômica do governo dos militares. Muitas com crianças no braço, enfrentando o Exército, Polícia, cachorro, para denunciar a fome. O abaixo-assinado também foi entregue ao General Geisel, Ditador no período em questão. Nos anos seguintes, o movimento conseguiu articular com moradores de Diadema e São Bernardo o fornecimento de leite, que chegava todo mês em containers e era vendido a preços populares. No Grajaú as garrafas vinham até com o símbolo do movimento!
Uma das lideranças, a mãe e militante, Ana Dias (foi casada com Santo Dias – líder sindical morto a queima-roupa pela ditadura civil militar) relata que as mulheres foram aprendendo na luta, mulheres que deixavam o trabalho doméstico de lado, para poder estarem na luta, que levavam os maridos para as reuniões e iniciaram esse trabalho que trouxe diversas conquistas para as periferias de São Paulo.
Neste momento em que em nosso país, milhares de crianças passam fome e os preços dos alimentos não param de subir: “Em um ano, o quilo do arroz subiu 70%, o feijão preto, 51%; a batata 47%; a carne, 30% e o óleo de soja, 87%” (Só o poder popular acaba com a corrupção, página 3, Jornal a Verdade, julho de 2021), são as mães das periferias quem mais sentem o impacto da carestia e do custo de vida.
Quando olhamos para a situação de pobreza e extrema pobreza no Brasil, é nos lares chefiados por mulheres e com filhos menores de 14 anos, geralmente por mulheres negras, onde ela é preponderante, segundo dados apresentados em audiência pública da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados, no dia 21 de maio de 2021.
Não é à toa que hoje também nas Brigadas de Solidariedade organizadas pelo Movimento de Mulheres Olga Benario e pelo Movimento de Lutas nos Bairros, Vilas e Favelas, as maiores participantes são as mulheres! A luta pela melhoria da qualidade de vida, pelo saneamento básico, contra a fome, é uma luta feminista! No momento em que a fome avança sobre o nosso país, é fundamental resgatar a história daquelas corajosas mulheres que desafiaram a ditadura e hoje, travar essa luta mais uma vez, colocando nosso movimento a serviço da organização popular das mulheres!
[…] a década de 1970 foi organizado o “Movimento Contra a Carestia” (MCC), que aglutinou diferentes setores e entidades por todo o território. Com forte presença […]
Esta na hora de reinventar mais lutas #TudoCaroCulpaBolsonaro.